07.06.18 - Quinta

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De: nico.rafa.belson@gmail.com
Para: isa.sk8.2010@hotmail.com
Assunto: A Jack tinha razão


Entendi porque você se mudou para cá. Seu pai é louco, Zak... Completamente louco...

Hoje teria sido um dia bom, se ele não estivesse lá.

Quando cheguei para a visitação (novamente em meu horário de almoço do mercado) estava somente ele na sala de espera. A Jack tinha entrado junto com sua mãe (eu soube por minha irmã que sua mãe foi conquistada por ela - pra variar - e estava abalada quando chegou). E quando seu pai me viu, deu uma encarada feia. Me perguntou, todo truculento, se eu estava lá também, quando aconteceu o incidente. Eu não acreditei em meus ouvidos quando ele quis confirmar, falando "É verdade que era um agrupamento de sodomitazinhos?".

Só aquilo já me ferveu o sangue, mas não era nem o começo... Eu só corrigi ele, respondi que NÃO. Que era uma Parada LGBT. Aí ele perguntou se eu era "uma bicha" também.

Eu não respondi aquilo... Pra tentar disfarçar a raiva, eu só perguntei se ele já tinha te visto, e isso foi pior. Ele explicou que ainda não, e que não viu nem sua cor quando você "fugiu" de casa, porque você fez isso "na surdina com a ajuda da sua mãe". Ele usou umas palavras bem ruins para se referir à ela. Inacreditável... E disse que tinha feito aquela viagem toda só porque queria olhar pra sua cara de... Bem, ele usou uns xingamentos que quase me fizeram voar na goela dele. Como eu ia dizendo, ele disse que queria olhar bem pra sua cara e ouvir de você que estava naquele lugar. Naquele tipo evento. E que lamentava que...

Ah, Zak... Não consigo escrever isso. Falar aquilo, que prefere um filho morto a ter um que seja gay (ele usou uma outra palavra). E ainda teve a cara de pau de falar que veio para pegar "uma grana" que era para ser dele. O que aquele cara tem na cabeça?

Eu não tenho ideia de como era para você ter que conviver dia após dia com um ser assim. Aquilo não é pai de verdade.

Quando a Jack e sua mãe voltaram, sua mãe estava chorando. A Jack parecia um pouco incomodada. Ela segurava os ombros de sua mãe, tentando explicar que "aquilo não era algo ruim". Eu pensei que estavam falando do choque de ter ver daquele jeito (corte no rosto, olheiras, pálido, fraco, magro, recebendo soro, etc), mas aí ela falou algo sobre você ter tomado o rumo do demônio (alguma coisa sobre você ter sido influenciado por sua tia). Eu não entendi direito a coisa sobre a sua tia, mas eu tenho uma leve desconfiança que sei o que ela queria dizer com o caminho do demônio.

E não gostei nada disso.

Com a saída das duas, eu entrei com seu pai no quarto. De início, ele ficou só de longe, olhando pra nós dois... E por um momento eu esqueci da existência dele. Mesmo agora, te escrevendo isso, sinto o peito apertar de lembrar como você ficou ao me ver... Eu nunca te vi chorar, e aquilo foi doloroso. Sentir suas mãos geladas no meu rosto, e ver seus olhos no meio de tantas lágrimas foi difícil. E você mal conseguia pronunciar meu nome, com sua voz fraca e rouca do jeito que está. Eu não tinha ideia de como um corte seguido de cirurgia e coma induzido deixavam uma pessoa debilitada.

E quando você viu que ele estava no quarto, você pareceu ter visto um fantasma. Eu quase não ouvi você sussurrar pra mim, perguntando "Por que ele está aqui, Nick? Por que?".

Agora eu me culpo tanto por isso, Zak...

Nós não deveríamos ter ligado para eles, e avisado. Mas como é que eu ia saber? No domingo você realmente corria risco de morrer, e não podíamos simplesmente deixar de avisar sua família.

O Monotono Diario de Isaac [BETA]Where stories live. Discover now