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–  Luke

  

    Ter um coração frágil num mundo cruel é coragem, não fraqueza, e agora eu entendia isso. Pensava antes que para ser aceite neste Mundo teria que ser forte, frio, rude, e tentar não me importar com nada. Pois, se não nos importarmos, não sofremos, certo...? Eu estava errado. Se nós temos uma vida, se estamos aqui neste Mundo, é com um propósito: para ensinar ou ser ensinados. Temos que ver a beleza em todo o lado. Num dia de sol, nas flores, paisagens, no cheiro depois da chuva... Temos que nos agarrar às pequenas coisas que nos fazem querer viver. E eu finalmente começava a perceber isso.

    Esta poderá soar a coisa mais lamechas de sempre, mas, uma das pequenas coisas que me faziam querer viver era Nina. Ela não era uma coisa, era um ser humano, e não era pequena, (a não ser que estivéssemos a falar de altura), mas, ela fazia-me querer viver e experienciar o que o Mundo tinha para me oferecer. Eu adorava o som do seu riso e a maneira de como ela colocava o cabelo por trás da orelha quando tinha vergonha de algo. Adorava quando ela ficava com um ligeiro brilho nos olhos por estar a falar de algo que amava imenso. Adorava os seus longos cabelos castanhos claros que cheiravam a amêndoas e rosas; e adorava os seus olhos esverdeados. Agora pergunto-me. Se adoro tudo o que lhe pertence, significa também que a adoro? Não conseguia responder a isto, pois nunca tinha adorado alguém... Um ser que se mexe, que tem sentimentos. Adorava café da manhã, adorava a sensação de não ter frio no inverno, adorava quando não tinha que acordar cedo, mas... Adorar alguém? Nunca me tinha acontecido. Não sabia o significado das sensações que circulavam pelo meu corpo e algo teria que fazer para o saber. Talvez o meu problema fosse pensar demais e agir pouco.

    Porém, eu tinha medo. Medo de sentir algo que tivesse a capacidade de me arruinar, de me destruir.

    "Queres ir dar uma volta?" – a voz de Nina fez-se ouvir e a minha cabeça de imediato se virou na sua direcção.

    "Mas eu estou doente" – afirmei, dando de ombros.

    "Por isso mesmo, Luke" – ela sorriu de canto – "Vais apanhar ar fresco. Isso faz bem"

    "Se quiseres..." – o meu olhar focou-se nos seus belos olhos.

    "Se não quisesse não te tinha perguntado, tonto" – Nina levantou-se subitamente e pegou na minha mão, levantando-me da cama – "Vai-te vestir"

    "Eu posso ir assim, não tenho paciência para me ir vestir" – ela soltou um riso após ouvir a minha frase e abanou ligeiramente a cabeça.

    "Combinado, mas tens que levar casaco" – fez uma pequena pausa – "Não quero que fiques mais doente"

    "Certo" – falei para mim mesmo, dirigindo-me ao armário. Retirei de lá um casaco não muito quente e não muito frio. O suficiente para me manter confortável. Nina chegou até mim e colocou-o sobre os meus ombros. Conseguia ver a sua figura pelo espelho oposto. Ela parecia pacífica e feliz. E ao vê-la assim, todos os meus problemas pareciam desvanecer. Eu tinha que encarar um facto. Nina estava aqui por mim. Ela tinha vindo ao meu socorro, e preocupava-se comigo. Alguém se preocupava comigo. Nina não era apenas um alguém. Nina era algo grande, muito grande, com a capacidade de fazer 'milagres'.

    "Nina..." – comecei por falar – "Já pensaste que se calhar és... O meu anjo da guarda?" – finalizei e rodei os meus calcanhares, de modo a poder encará-la. A sua testa franziu-se e os seus lábios entreabriram-se.

    "Achas isso possível?" – a sua voz meiga sussurrou.

    "Sim..." – constatei – "Tu és tão diferente, num bom sentido. Fazes com que eu seja capaz de sentir algo, e eu não sinto algo há tanto tempo, Nina..."

    "Vou-te contar uma coisa" – ela entrelaçou os nossos dedos e senti uma espécie de electricidade a nascer entre as nossas peles. Encaminhou-nos para fora de casa e começámos a andar os dois, de mãos dadas.

    "Tudo o que eu queria era encontrar-me a mim mesma, tentar saber quem é que eu queria ser" – os seus olhos reluzentes cruzaram-se com os meus, pela milésima vez hoje – "Em vez disso, encontrei-te a ti, e não poderia estar mais feliz" – quebrou o contacto visual, olhando para o chão. O meu batimento cardíaco pareceu acelerar num instante. Estava a sentir aqueles arrepios anormais e a minha respiração saía trémula, assim como a minha voz. Seria esta a vulnerabilidade perante alguém? Era incontrolável.

    "N-Nina" – preparei-me para dizer a frase que me tinha torturado durante estes dois últimos dias.

    "Sim?" – ela respondeu-me com a sua voz habitualmente meiga.

    "Achas que há possibilidade de... Almoçarmos juntos algum dia?" – inquiri, passando as mãos pelos fios dos meus cabelos loiros escuros enquanto olhava fixamente os meus ténis para não ter que encarar a rapariga que me estava a fazer sentir nervoso neste momento. Nina Stevens.

    "Claro" – esboçou um sorriso – "Sim, claro. Porque não?"

    "Pode ser sexta-feira?" – não evitei sorrir desta vez. Porque sim, eu sentia-me feliz. E nem sabia que isso alguma vez seria possível.

    Nina assentiu lentamente, piscando os olhos algumas vezes seguidas enquanto tentava não sorrir demasiado. Mas eu sabia que ela também estava feliz. Eu conhecia-la. Sabia que ela gostava que eu lhe desenhasse pequenas figuras imaginárias nas costas com as pontas dos meus dedos; sabia que ela gostava de azul e que a sua comida preferida era pizza. Sabia que ela odiava matemática – talvez por ser o seu tutor; sabia que ela gostava de ler mitologia grega, tal como eu; e sabia que ela apreciava a minha companhia, o que me deixava completamente contente. Até estava impressionado comigo mesmo por saber estas coisas todas sobre Nina.

    Sentei-me num pequeno banco quando ela foi buscar algo para comer. Brincava com as minhas mãos em completo silêncio, até que um idoso senhor se sentou ao meu lado. Olhou-me como se estivesse a tentar descobrir os meus pensamentos, e depois declarou:

    "Vocês fazem um bonito casal"

    Soube logo que se estava a referir a mim e a Nina, o que causou um pequeno riso escapar por entre os meus lábios.

    "Não somos um casal, apenas amigos" – disse educadamente.

    "Olhe que já experienciei o amor" – ele meio que se riu – "E estive a observar-vos durante algum tempo. Posso dizer-te, meu caro jovem, que amigos não agem assim. Vi-te todo nervoso e com as mãos no cabelo quando lhe perguntaste algo" – fez uma breve pausa – "Posso-te dizer que olhaste para aquela rapariga como se ela fosse a única coisa que existisse no teu Mundo"

    "Eu perguntei-lhe se queria almoçar comigo e ela respondeu que sim" – eu disse com um enorme sorriso aflorado nos lábios. Nem sequer me apercebi de que estava a desabafar com um idoso desconhecido.

    "Havias de ter visto a tua figura! Estavas todo sorridente e com um brilho nos olhos" – soltou roucas gargalhadas – "Eu era assim também..." – o seu sorriso desvaneceu – "Apenas te peço algo... Se ela te faz feliz, não a deixes ir, não a percas"

    "Como sabe disso tudo?"

    "Oh... Eu já fui um idiota que caiu na tentação do amor... E cometi o pior erro da minha vida. Deixei uma rapariga, assim, única e inesquecível ir" – suspirou – "E ainda me arrependo disso. Garanto-te que são difíceis de encontrar" 

    "Mas o senhor não sabe se ela sente algo por mim. Nem eu sei o que sinto. Não sei definir estes sentimentos" – declarei.

    "Jovem, isso terás que descobrir sozinho" – deu uma pequena palmadinha nas minhas costas.

    "Como?" – olhei para a frente, e uma figura feminina a caminhar ao longe captou a minha atenção. Nina.

    "Arranjarás uma forma"


Treehouse ➤ Luke Hemmings [Completed]Where stories live. Discover now