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–  Luke

   

    Sentia-me uma lástima por dentro, ultimamente. Sentia-me uma lástima por não conseguir controlar a minha vulnerabilidade e as minhas acções perante Nina. A minha vida antes era como um livro perdido, pois dizem que se eles não receberem a sua devida atenção, perdem o seu significado. Agora o livro perdido tinha sido encontrado por uma pessoa, uma rapariga, que se chama Nina Stevens. Essa mesma rapariga tem feito todos os possíveis para me fazer sorrir, para fazer com que eu perceba que tenho significado. Eu não conseguia simplesmente afastá-la de mim. Estaria a magoar-me a mim mesmo se o fizesse, pois considerava-a como uma amiga. Mas o meu medo era começar a sentir algo mais por ela.

    Eu insistia em deixar que a minha mente continuasse a girar e a girar, fazendo-me então pensar nas coisas mais absurdas. Mas este era simplesmente eu. Eu pensava em coisas absurdas, que podiam não fazer o mínimo sentido para alguém, mas para mim tinham sentido.

    Eu fascinava, por exemplo um chão feito de azulejos. Fascinava o quão frio ele era. Se alguém me ouvisse a dizer isto, possivelmente diria que eu sou doido. Mas, para mim, é algo normal. Mesmo que esteja um dia de sol e uma temperatura elevada dentro de uma casa, o chão feito de azulejo estará sempre frio. Às vezes comparava-me ao tal material, pois eu era sempre frio e rude para as pessoas, fosse quem quer que fosse. Mas com a Nina era tudo diferente. Ela parecia conseguir mudar a temperatura do azulejo, que não conseguia ser mudada. Mas Nina tinha alguma coisa consigo, que era especial, por isso o que quer que ela fizesse funcionava comigo. Ela fazia questão de me falar e de tentar saber mais coisas sobre mim. Parecia fascinada com o que eu escondia ou pensava, embora eu não achasse isso minimamente interessante. Mas ela tinha um "poder", que tinha efeito em mim, e eu não o podia negar.

    Eu estava agora sentado no tal chão que admirava. A minha cabeça estava entre as mãos e os meus olhos completamente fechados. Não sentia que estava neste lugar agora mesmo, mas sim noutro muito mais distante, longínquo. Mas, eu teria que sair daqui, eventualmente. Não poderia ficar para sempre trancado numa casa-de-banho apenas a pensar. Infelizmente, eu tinha uma vida, e por muito que me custasse, teria que usufruir dela.

    "Luke Hemmings, chega já cá a baixo!" – a voz esganiçada da minha mãe fez-se ouvir no meio deste silêncio. Soltei um longo suspiro, e, com alguma dificuldade, levantei-me do chão frio, observando depois a minha figura ao espelho. Passei os dedos pelos meus loiros e finos cabelos e lembrei-me do dia de ontem. Podia ainda sentir as mãos suaves e pequenas de Nina a passar pelos fios dos meus cabelos e podia ainda relembrar-me do sorriso involuntário que estava curvado nos seus lábios enquanto ela me encarava. Esta memória fez-me sorrir, talvez pelo facto de Nina estar presente na mesma.

    "Luke Hemmings, não volto a chamar-te mais nenhuma vez, chega cá a baixo!" – um grito ecoou nesta casa. Respirei fundo mais uma vez, e comecei por descer as escadas que iriam dar à sala.

    "O que se passa mãe?" – falei num tom baixo e arrogante.

    "Eu vou para uma viagem de trabalho durante dois dias por isso o George vai ficar aqui, a tomar conta de ti e da casa. Espero que te portes bem" – ela esfregou de seguida o seu rosto duas vezes seguidas, pegando depois numa maçã que estava ao seu lado, pousada numa fruteira.

    "Mãe, eu tenho 17 anos, sei muito bem cuidar de mim mesmo" – revirei os olhos, dirigindo-me até à porta de entrada.

    "Espero que tenhas boas notas no final do ano lectivo" – ela respondeu, ignorando completamente o meu comentário – "Não te tenho visto a estudar ultimamente"

    "Não te preocupes com isso" – olhei para trás, de relance – "Vou sair, adeus" – abri a porta, saí de casa, e fechei-a seguidamente, não dando tempo à minha mãe de me responder.

    Tinha acabado de deixar a casa para trás e nem me tinha lembrado de trazer o MP3 comigo. Mas não iria lá voltar. Só se quisesse levar com o mau-humor da minha mãe – sim, porque nem isso o namorado lhe consegue tirar. Os objectos que tinha comigo eram apenas duas chaves – uma de casa e outra provavelmente do cacifo; dois lenços de papel; uma barra de cereais e uma moeda de cinquenta cêntimos. Decidi tentar encontrar uma pastelaria para comprar algo, nem que fosse um pequeno bolo. Não comia nada desde a madrugada. A minha mãe insistia em dizer-me que eu estava demasiado magro e que as roupas pretas não iam facilitar o meu aspecto – na opinião da minha mãe, tudo o que é preto emagrece. Eu, claramente que não ouvia nada do que ela dizia. Não me importava com a opinião das pessoas, apenas com a minha. Se eu achasse algo de inconveniente em mim, tentaria mudá-lo, mas não era este o caso. Sentia-me perfeitamente bem como estava, (mas era óbvio que por dentro eu estava uma desgraça descomunal).

    Neste preciso momento, cansaço percorria pelas minhas veias, falando metaforicamente. A minha respiração não estava de todo regularizada e eu precisava de fazer uma pausa, pois tinha estado a caminhar durante muito tempo. Não tinha encontrado a pastelaria, o que tornava as coisas piores.

    Algo me chamou à atenção no meio desta rua banal. Uns cabelos castanhos claros brilhavam com a luz do sol e uns olhos meio verdes conseguiam ver-se ao longe. Reconheci logo esta pessoa, mais precisamente rapariga, como Nina Stevens. Não sabia se deveria ir ter com ela ou ficar aqui, imóvel, à espera que ela notasse na minha presença. Às vezes era bom saber que alguém reparava em mim, mas com certeza que eu também tinha que tomar alguma atitude. 

    "Porque é que me estou a preocupar com isto?" – perguntei-me a mim mesmo, enquanto as minhas pernas se mexiam, involuntariamente, em direcção à figura feminina a uns metros de mim.

    "Olá Nina" – falei num murmúrio, com esperança que ela tivesse ouvido. A sua cabeça virou-se na minha direcção e um sorriso largo aflorou-se nos seus lábios, fazendo-me olhar para baixo.

    "Olá Luke" – ela respondeu, dando-me depois um abraço. O meu corpo pareceu ficar preso ao chão. Não sabia o que fazer. Deveria retribuir ao abraço ou rejeitá-la? Já fui rejeitado, não é um sentimento bom.

    Os meus braços lentamente desprenderam-se do meu tronco e aproximei-me de Nina, envolvendo-a depois nos mesmos. Esfreguei as suas costas com uma das minhas mãos, com pouca certeza do que estava a fazer, e pousei o meu queixo no seu ombro. As minhas costas encontravam-se um pouco curvadas, devido à nossa diferença de alturas, mas, mesmo assim, o abraço soube-me bem. A partir deste pequeno momento, percebi que, afinal, até apreciava abraços.

    "Tive saudades tuas, Luke" – Nina declarou, assim que os nossos corpos se separaram.

    "Viste-me ontem, Nina" – respondi, cruzando o meu olhar com o seu.

    "Eu sei, mas hoje não vieste à escola, e eu tive saudades tuas" – ela falou inocentemente. Tão inocentemente que me apeteceu envolvê-la noutro abraço, mas contive-me, pois eu não era assim habitualmente.

    "Posso dizer que também tive um pouco de saudades" – fiz um gesto com os meus dedos, enquanto uma gargalhada baixinha escapava dos meus lábios.

    "Tonto" – ela sorriu e afastou os cabelos intrusos do seu esbelto rosto, dando-me mais acesso ao mesmo.

    "Foi bom ver-te" – acabei por dizer, ficando com alguma incerteza em como me despedir dela, pois não o queria fazer embora fosse o melhor. Formei um amigável mas curto sorriso à medida que a fitava, e a minha mão acenou-lhe. Nina retribuiu o gesto e rodou os seus calcanhares, mudando de direcção. Começou a caminhar, sendo a primeira a fazê-lo, enquanto eu ficava especado no mesmo sítio a observar cada detalhe dela até que ela estivesse fora do meu alcance.



Treehouse ➤ Luke Hemmings [Completed]Onde histórias criam vida. Descubra agora