Capítulo 19

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Me deito na cama e fico pensando em tudo que minha mãe me contou, a história era parecida com a de Denise. Não consigo imaginar como pode existir pessoas tão frias como meu pai, ele me decepciona a cada dia mais. Eu definitivamente não o reconheço.

A porta se abre em um ato bruto e meu pai entra, mas deixa a porta aberta. Poderia tentar fugir, mas sei que ele me pegaria.

- Conhece isso? - ele pergunta me mostrando um belíssimo relógio de ouro.

- Não - respondo seca e sem interesse.

- É do seu marginalzinho, foi a única coisa que sobrou dele.

Olho melhor para aquele relógio e era idêntico ao que Otávio usava, torço para que realmente não seja dele.

- Do que você está falando? - tento controlar meu desespero.

- Que agora temos um problema a menos, ele está morto.

- É mentira - grito e as lagrimas rolam pelo meu rosto.

- Eu não ia mentir pra você, ele morreu e se continuar rebelde vai ter outras vítimas.

- Nada do que você me falar vai fazer com que eu mude de ideia, eu não vou me casar com o Gabriel e nem vou continuar a faculdade de direito.

- Você vai sim, não me desafie.

- Você já tirou o Otávio de mim, mas eu não vou deixar que tire a minha liberdade, você não tem esse direito e sabe muito bem disso.

- Você vai fazer o que eu mandar - ele se aproxima irritado.

- Eu não vou - grito - Você pode me manter aqui por quanto tempo quiser, mas uma hora eu vou ter que sair e nesse dia eu vou embora e nunca mais vou querer te ver e quando eu puder, vou voltar, mas pra levar minha mãe pra bem longe de você.

- Você vai fazer o que eu quero nem que seja na marra - ele grita de volta.

- Não vou mesmo, eu vou ser o que você tanto despreza, vou fazer tudo aquilo que você abomina, eu vou ser a sua vergonha familiar - digo cuspindo raiva.

- Já chega - ele da um forte tapa em meu rosto.

- Você é um covarde - grito.

- Eu deveria ter deixado você morrer, você só me da desgosto, eu odeio você sua vagabunda - ele grita e me enche de tapas descontando sua raiva - Maldita! Era pra você morrer, você tinha que morrer - ele continua me batendo.

- Chega Ivan - minha mãe surge no quarto e acaba levando uns tapas também.

- Eu odeio vocês duas, são duas perdidas e malditas. Era pra ela estar morta - ele grita e arrasta minha mãe pra fora do quarto puxando ela pelos cabelos.

Aquelas palavras que ouvi do meu pai, doeu bem mais do que os tapas que levei. Ele deseja minha morte desde que nasci, isso é cruel, é horrível ter que ouvir isso do seu próprio pai.
Agora eu chorava ainda mais, por dois motivos; pela morte de Otávio e pelas coisas que ouvi. Foi cruel.

Mais tarde meu pai volta ao meu quarto.

- Eu vou ser breve. Você vai se casar com o Gabriel e ser uma filha obediente? - ele pergunta.

- Não - digo sem olhar pra ele.

- Então vamos dar um passeio.

Ele se aproxima e amarra meus braços para trás.

- Pra onde vai me levar?

- Surpresa - ele ri sarcástico.

- Vai me matar também?

- Deveria quando você nasceu, na verdade eu devia ter feito sua mãe te abortar, saiba que você sempre foi indesejada, eu não gosto de você e sua mãe só sente pena.

- E por que me odeia antes mesmo que eu tivesse nascido?

- Porque você não deveria ter vindo ao mundo. Eu bati tanto na sua mãe pra ela te perder, mas mesmo assim você veio ao mundo e eu odeio você por isso, só me deu dor de cabeça desde que soube que sua mãe estava grávida de você.

Não respondo mais nada, fiquei pasma, naquele momento eu tive a certeza de que eu era aquele bebê, eu não era filha dele, por isso ele sempre me tratou com indiferença, ele apenas me suporta, mas não me ama, me seguro para não chorar, não quero que ele saiba que eu sei que não sou filha dele. Era horrível isso, era assustador.

- Vamos - ele me puxa até a garagem e me joga dentro do carro.

Ele se sentou ao meu lado e um homem que eu desconhecia dirigia o carro.

Rodamos bastante a cidade e eles estacionam próximo ao serviço de Lívia. Vejo que ela está saindo caminhando lentamente na calçada.

- Sua ultima chance, vai se casar?

- Já disse que não - digo.

Ele pega o celular, liga pra alguém e diz:

- Pode matar - ele diz frio.

De repente dois homens surgem atrás de Lívia com uma arma.

- Não! - grito - Eu me caso, eu faço o que você quiser, mas não faça nada, por favor - choro desesperada.

- Podem parar - meu pai diz e finaliza a ligação.

Ele me olha e sorri vitorioso.

Saímos dali e não digo mais nada, encosto minha cabeça na janela do carro e choro baixinho.

Paramos em um semáforo e eu fico observando as pessoas, alguns estavam felizes, outros com pressa e até mesmo os que andavam tristes, eles tinham algo que eu invejava; sua liberdade, liberdade pra ir onde quiser, escolher seu futuro sem que ninguém se intrometa, escolher o próprio namorado, fazer tudo do seu jeito, mesmo que a gente quebre a cara, mas pelo menos vivemos e aprendemos.

Uma moto para ao lado do carro tampando minha visão. A moto era igual a que Otávio tinha, lembrar dele fez eu chorar ainda mais, olho para o rapaz que pilotava a moto e percebo que era Otávio, aquela tatuagem no pescoço era inconfundível, era ele, eu tinha certeza que era, ele estava vivo. Meus olhos quase saltam para fora com tamanha alegria que senti.

O semáforo abre e ele some no meio dos carros pilotando daquele jeito louco dele.

Eu não posso colocar mais ninguém em risco, por minha culpa Lívia quase foi morta, eu jamais me perdoaria se algo acontecesse com ela. Saber que Otávio está vivo conforta meu coração e eu já não tenho mais dúvidas de que o amo, nunca senti nada parecido com isso, por isso sei que é amor. E é por esse amor que eu vou me sacrificar, vou fazer tudo o que meu pai mandar, pelo menos assim eu sei que ninguém vai sair ferido, a não ser eu que já estou completamente destruída por dentro, mas vou ser forte e viver esse meu destino.

Coração BandidoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora