U.S.A. 3 - PRIORIDADE MÁXIMA

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-Sabe quando eu vou ver esse cheque? No dia de São Nunca.

Uma semana depois. Mí abuelita me chama pelo sistema de auto-falante:

-Enriquiño, venga hasta mi oficina por favor.

Quando chego ao escritório ela me entrega uma carta da BellSouth, a companhia de telefone. Ao abrir a carta encontro um cheque nominal a mim, no valor de um dólar e setenta e cinco centavos. Jamais acreditaria naquilo se eu não tivesse sido a testemunha principal. Para um brasileiro, acostumado a ser tratado como um consumidor de segunda categoria durante toda a sua vida, aquele cheque tinha um valor muito maior do que o valor nele expresso.

Vi a importância, da palavra, da credibilidade, da cidadania, e preferi guardá-lo a descontá-lo. Aquele cheque ficaria comigo como recordação e como prova de que existem sistemas, e sistemas.

O tempo foi passando e aquele primeiro semestre, especialmente abalado pela explosão do ônibus espacial Challenger, com a anunciada passagem apocalíptica do Cometa de Halley e com o vazamento da usina nuclear de Chernobyl estava acabando. A minha atenção e a atenção do mundo do futebol, foram se voltando para a Copa do Mundo no México. Acostumado ao blá-blá-blá, ao oba-oba que a imprensa brasileira faz, antes, durante e depois desses eventos, eu estava ilhado em Miami.

Na terra do beisebol e do basquete, não havia programação voltada exclusivamente ao futebol e as raras notícias sobre a Copa do Mundo, apareciam discretamente nos noticiários da TV e das rádios. Como nós brasileiros fazemos uma Copa do Mundo virar uma festa, usei umas folhas coloridas e montei várias bandeiras simbolizando as cores do Brasil e enfeitei a sala do segundo andar.

Aquela Copa prometia. O Brasil era um dos favoritos e ali na Casa eu era o embaixador da torcida brasileira, que ainda contava com Angélica, Maítha, Vanda e Adriana. Os demais eram latinos que torciam pelo Brasil por simpatia e por admirarem o futebol brasileiro.

Passamos em primeiro na fase de grupo com três vitórias. Depois eliminamos a Polônia nas oitavas de final. Com o México e o Uruguai já eliminados, aumentou a torcida pelo Brasil e a maioria achava que o Brasil seria campeão. No dia do jogo com a França, por ser à tarde, não tinha quase ninguém na Casa e lá estava eu com a camisa da seleção e as bandeiras colocadas nas paredes, atrás e em cima da TV.

O Brasil começou bem, dominando o jogo e fazendo o primeiro gol. Depois o jogo se equilibrou e a França empatou. O Brasil foi levemente superior e teve algumas chances para fazer o segundo gol, inclusive com um pênalti perdido pelo Zico. Na hora da prorrogação começaram a chegar algumas pessoas e elas foram testemunhas do meu nervosismo. O jogo terminou empatado e foi para a decisão por pênaltis. Fiquei sentado quase dentro da TV. No final, derrotado, ali fiquei sentado, paralisado, incrédulo.

Pela terceira vez vi uma Copa ser perdida nos detalhes. Aquela bola que bateu na trave e depois bateu nas costas do goleiro Carlos e entrou, era a bola do jogo. O azar, e a falta de competência nos eliminaram e meio sem graça, fui desmontando a decoração e me refugiei no meu quarto.

Mas o pior ainda estava por vir. Uma das regras da Casa era a proibição da posse e do consumo de bebidas alcoólicas, inclusive cerveja. Naquela semana, eu, Julio Cabrera, e Ché, contrabandeamos para dentro da Casa, uma caixa de cerveja Brahma, que estava entrando no mercado norte-americano.

Como o Brasil estava a caminho da final e eu estava igualmente confiante, falei para eles que a cerveja naquelas quartas de final seria por minha conta. Fomos ao supermercado e comprei uma caixa e a ofertei para a comemoração após as partidas daquela fase.

Fidel com a dele e eu com a minha.Where stories live. Discover now