VOLTANDO PRA CASA

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          Foi um vôo fantástico, super confortável. A Varig era conhecida mundialmente pela qualidade do serviço de bordo e não deixava dúvidas quanto a isso. Pela primeira vez na vida eu comi faisão e adorei. Vinhos importados e champanhe francês eram servidos sem restrições; num tratamento ímpar, sofisticado, cinco estrelas.

Fiquei acordado durante todo o vôo. Fiz uma retrospectiva de todos aqueles momentos vividos nos últimos quatro meses. Não era um filme, não era uma novela, e nem uma obra de ficção, era a vida real. A minha vida. Naqueles três meses, ela havia sido condensada em todos os seus sentimentos, os bons e os ruins. Por que eu? Por que tudo aquilo? Eram perguntas para as quais eu jamais consegui encontrar respostas.

O vôo era suave e constante. Aquela nave rumava para o sul e se afastava mais e mais de Miami e da Cuba de Fidel e de sua revolução. Ele ficava lá com a dele e eu ali levando a minha. Eu era um contra-revolucionário de minha própria revolução e ainda não sabia como e quando ela acabaria. O piloto avisou para colocarmos os cintos.

-Aterrizaremos em, aproximadamente, quinze minutos. Completou ele.

Quando a porta se abriu, lá estava a Beth novamente para nos receber. Com um enorme sorriso ela perguntou:

-Gostaram da surpresa?

-Melhor impossível Beth. Respondemos.

Depois dos abraços e beijos, ela pegou a maleta de mão da minha mãe, e pediu que a seguíssemos. Fomos para a sala V.I.P., que parecia até melhor do que a do aeroporto de Miami. Sofisticação e conforto com o padrão Varig de qualidade. Nossa conexão seria dali a quarenta minutos, disse Beth, perguntando se queríamos comer alguma coisa ou tomar um café.

-Um cafezinho brasileiro é bom, né? Estou com saudades desse café. O de lá é muito diferente. Respondi.

Beth contou que o pessoal do Guarujá estava a caminho para nos encontrar em Congonhas, e que ela já havia passado um rádio solicitando ajuda para nós no desembarque. Ela ficou conosco durante todo o tempo e nos acompanhou até nos acomodar em nossos lugares. Despedimo-nos e pedimos que ela fosse ao Guarujá na primeira oportunidade.

-Mês que vem tem o feriado de 7 de setembro. Aí eu vou. Respondeu.

Faltavam apenas cinquenta minutos para nos reunirmos com toda a família. Fui à janela, queria ver se poderia ver alguma coisa durante a decolagem e a aterrissagem, mas o mau tempo do Rio não me permitiu ver quase nada. Já era dia, a névoa estava forte, e as nuvens da chuva que caía bloquearam qualquer visão que eu pudesse ter da cidade maravilhosa.

Enquanto isso, minha mãe e minha irmã cochilavam a meu lado; minhas guerreiras mereciam descansar. O teto em São Paulo também estava fechado, mas quando o avião fez a aproximação para descer, pude ver o traçado das ruas e avenidas, os prédios e os carros. Era um visual inédito para mim e me deu mostras do alcance da visão que eu tinha recuperado.

Demoramos um pouco para pegar as malas e aproveitei para compor meu traje de desembarque. Eu já estava de calças brancas e camisa florida, coloquei um chapéu típico de turista gringo e uns óculos escuros que iam por cima dos óculos de grau. Felizmente não tivemos que abrir as malas na alfândega, seria uma demora que só aumentaria a nossa ansiedade pelo reencontro familiar. Mal embicamos os carrinhos no corredor que saía no saguão de desembarque e começamos a escutar;

-Enrique! Enrique! Enrique!

Eram quase trinta pessoas aglomeradas, aplaudindo, gritando e havia até uma faixa que dizia: "Seja bem-vindo Enrique. Você conseguiu!"

Fidel com a dele e eu com a minha.Where stories live. Discover now