Minha mãe contou que ela e a Angélica iriam até o hotel que o Dr. Blumenkranz havia indicado para ver como era, pois faltava apenas um dia para ter que renovar as diárias de onde estávamos. Mais uma vez recomendei a ela que tivesse cuidado. Elas saíram para almoçar e de lá iriam até o tal hotel. Fiquei na cama entre cochilos e sons de TV e rádio. Quando eu estava me preparando para o lanche da tarde, elas chegaram com a novidade.
-Já fizemos a reserva no novo hotel. Você vai adorar, disse Angélica.
-Como assim? Vocês têm certeza? Como que é lá? Perguntei.
Elas foram me explicando como era o lugar, e que seria muito melhor que o outro hotel, pois tinha até uma cozinha para os hóspedes fazerem sua própria comida; além de custar um terço do valor que estávamos pagando. Elas disseram que na manhã seguinte já poderiam se transferir, e quando eu saísse do hospital, já iria direto para lá.
Fiquei animado com as boas novas e falei que estava tudo bem por minha parte. Ali ao lado, Anselmo continuava puxando conversa conosco e perguntamos se ele não tinha família. Ele disse que tinha dois filhos e que era separado. Dissemos que se fosse ao Brasil, estaria todo mundo junto com ele no hospital e que achávamos estranho que ele estivesse sozinho desde a hora que chegou.
Ele falou que nos Estados Unidos era assim mesmo, e que só num caso muito grave é que a família e amigos visitam os doentes. No caso dele, ele nos disse que era uma operação simples e não precisava de ninguém para ajudá-lo; no dia seguinte, logo cedo ele teria alta e iria sozinho para casa.
Já era hora do jantar e minha mãe e irmã foram embora, pois teriam que fazer as malas para a mudança de hotel. Dormi melhor naquela noite e quase não acordei, exceto quando a enfermeira vinha colocar os colírios.
Sábado.
Pela manhã, antes do café, o Dr. Blumenkranz apareceu, tirou o curativo e olhou com a sua lente e a luz especial presa na testa. Senti a entrada de muita luz e falei para ele que estava enxergando a fonte de luz. Ele ficou radiante e me disse que estava tudo indo muito bem. Passou os dedos em frente o meu olho e perguntou se eu estava vendo alguma coisa.
Respondi que via algo passando, mas que não dava para ver direito. Então ele mudou o movimento e perguntou o que eu via, e eu disse que achava que eram um ou dois dedos.
-Great! Exclamou ele entusiasmado.
Nesse exato momento minha mãe e minha irmã chegam, e ele conta para elas que eu já estava começando a enxergar. Foi uma mistura de risos e choros. Ele disse que levaria alguns dias até a visão se estabilizar e sabermos, de fato, qual seria o resultado final. Recolocou o curativo e se despediu.
Quando ele saiu, as duas não se agüentavam de tanta felicidade. Estávamos cada vez mais confiantes. Eu contei o que eu tinha visto, e minha mãe disse que eu voltaria a enxergar, sim!
Pouco depois do café, chegou a hora da alta do Anselmo e ele gentilmente nos deu o seu endereço e telefone, e ofereceu para em caso de qualquer necessidade, que nós o procurássemos.
Antes de ele sair do quarto ele falou:
-Tengan mucho cuidado con los cubanos. La ciudad está llena dellos y son gente un poco peligroza.
Agradecemos a ele pela gentileza e pelo conselho, e ele partiu. Assim que ele saiu, começamos a rir do que ele havia nos dito. Lembramos do Ramon que era cubano e que tinha dito para termos cuidado com os porto-riquenhos; e Anselmo, que era porto-riquenho, falou para termos cuidado com os cubanos. Isso foi o máximo da coincidência antagônica.
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Fidel com a dele e eu com a minha.
Non-FictionUma Historia Real, passada nos anos 1980. Imagine, perder a visão aos 22 anos e ficar condenado a cegueira eterna. O que você faria? No cenário, as lindas praias de Guarujá e Miami, apimentadas com um pouquinho de Guerra Fria. Um jovem estudante de...
THE THIRD SURGERY
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