-Yeah. Respondi.
Nisso, colocaram um protetor em volta do meu olho direito que imaginei ser como algo com um buraco onde o olho ficasse à mostra. Usaram bastante esparadrapo para fixar essa máscara, que de certa forma imobilizava os movimentos faciais.
Então veio a surpresa maior. Com a ajuda de outra enfermeira, que se posicionou atrás da minha cabeça o Dr. Blumenkranz me avisou que a cirurgia seria feita com anestesia local. Naquela fração de segundo pensei:
"-Cacete!!! Injeção no olho???Puta que pariu!!! Isso deve doer pra caraca!!!"
Meus pensamentos foram interrompidos por uma pergunta:
-Todo bien? El doctor quiere que mire bien para trás y que no muevas el ojo. Ok?
Respondi com um quase grunhido e balancei a cabeça afirmativamente.
Christine segurava minha mão esquerda carinhosamente com as duas mãos. Respirei fundo e olhei para cima e para trás conforme a outra enfermeira havia pedido.
Mais uma vez me perguntaram se eu estava pronto; que não mexesse o olho e que sentiria uma fina dor que passaria logo. Foram segundos de intensa aflição, receio e tensão. A respiração estava presa e a agulha entrou pelo canto do olho. Instintivamente, meu corpo retesou e Christine percebendo, acariciou minha mão numa tentativa de me dizer que estava tudo bem.
Passados uns dez segundos, a voz do Dr. Blumenkranz quebrou o silêncio:
-Very good Enrique.
Uma movimentação aconteceu, cerca de dois minutos depois, ele mandou que eu olhasse para a esquerda e para a direita. Eu olhava, mas o olho, por estar anestesiado, não obedecia. A enfermeira me avisou que eu tomaria mais uma anestesia, mas que desta vez nem sentiria a agulhada. Realmente não senti nada naquela segunda vez. A partir daquele momento, fui relaxando e ficando absolutamente imóvel e concentrado. Meu futuro estava literalmente nas mãos daquele médico que o destino havia colocado em meu caminho.
Os minutos se passavam, e eu me mantinha na mesma posição. Christine media minha pressão e permanecia segurando a minha mão, ternamente. Eu sentia uma coceirinha no local onde o Dr. Blumenkranz me operava. Não era dor, em absoluto. Era uma pontadinha, uma coceirinha, uma sensibilidade apenas.
Eu me sentia forte, energizado e não esquecia que naquele mesmo instante, centenas de pessoas estavam pensando em mim. Eu acreditava com muita segurança que toda aquela energia positiva vinha para mim, ali, naquela sala. Eu sentia essa força e me sentia protegido, blindado.
Antes de sair do quarto, minha mãe colocou um alfinete de pressão que continha um pequeno pedaço de tecido, na minha bata. Aquela porção de tecido era do hábito de Madre Maria Teodora Voiron. A essa Madre eram atribuídos alguns milagres na região de Itu e aquele pedacinho em especial, foi ofertado por dona Therezinha e seu Abdala, amigos do meu tio Victor. Toda aquela proteção me deixava calmo e confiante. Os médicos conversavam, pediam instrumentos e a cirurgia continuava e continuava. Às vezes o Dr. Blumenkranz pedia um minuto e se alongava, emitindo aqueles sons típicos, depois andava um pouco pela sala e conversava com todos. A todo o momento, me dizia:
-Enrique! Are you okay?
-Yeah. I'm okay!, eu respondia.
Tirando esses breves momentos de descontração eu continuava absolutamente imóvel e concentrado. Imaginava a ação das minhas células da retina se regenerando e formando uma retina nova. As mãos de Christine ali, todo o tempo, me transmitiam uma paz e uma ternura imensas.
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Fidel com a dele e eu com a minha.
Non-FictionUma Historia Real, passada nos anos 1980. Imagine, perder a visão aos 22 anos e ficar condenado a cegueira eterna. O que você faria? No cenário, as lindas praias de Guarujá e Miami, apimentadas com um pouquinho de Guerra Fria. Um jovem estudante de...
THE THIRD SURGERY
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