— Lucy, acorde. — Kloe falou soltando as amarras e a balançando — Acorde querida.
A menina levantou devagar, grogue, seu corpo doía, sua mente girava e seus ossos pareciam pó dentro de seu corpo mole, fazendo seu coração tossir. Dank se sentou na cama, cansada, passando as mãos pelos antebraços desamarrados. Tudo doía.
— Dói? — a enfermeira perguntou se referindo as amarras.
A menina estranhou, ninguém antes nunca se preocupara com isso.
— Tudo dói. — elevou o rosto e viu a expressão sofredora de Flyn franzindo os lábios para dentro da boca.
— Você dormiu muito hoje, mas que o habitual, já está de tarde. — ela queria mesmo que aquilo se passasse como uma justificativa?
Algo estava muito errado por ali.
A enfermeira estava escondendo algo...
— Vá escovar os dentes e tomar um banho, vou pegar seu almoço. — e saiu.
Definitivamente ela estava escondendo algo.
Depois que Lucy saiu do banheiro vestida com uma regata e um short, Kloe estava sentada no sofá, e quando viu a menina levantou-se rapidamente e foi verificar o corpo da mesma.
— Seu almoço está na cama, quando terminar você tem que ir ver a doutora Jennifer. — ia sair, mas Dank segurou-a pelo pulso.
— Você está escondendo algo de mim, Kloe. — não foi uma pergunta.
Flyn gemeu em frustração por ser tão transparente.
— Coma, querida. — já ia sair novamente, mas a menina apertou a mão que a enlaçava.
— Pare de mudar de assunto. Conte-me. — apertou.
A enfermeira chocou-se, olhou para seu pulso amarrado na mão da garota e então para a mesma. Lucy estava apertando muito.
— Lucy, você está me machucando. — arregalou os olhos para a menina, chocada.
Ela está regredindo...
— Conte-me. — rugiu, forçando mais o aperto, os nós de seus dedos ficando brancos.
Merda!
— Você está me machucando, Lucy! — elevou a voz, e como se estivesse acordado a menina de um transe Dank abriu a mão e liberou o pulso, para logo depois se encolher e dar passos para trás até bater com as costas na parede, deslizando até o chão de repente como uma garotinha incapaz de machucar uma mosca.
— Merda. Foi sem querer, querida. — esbravejou, deslizando de joelhos em frente à menina. — Eu sei que foi.
A garota de cabelos negros se contraiu.
— Desculpe. — Dank sussurrou.
Foi à vez de Kloe se contorcer. Não era para a menor sentir-se culpada, a mesma não fez por mal.
Lucy se contorceu novamente pela culpa, a mesma a corroía!
''Com Kloe não, com Kloe não...'', era o que a garota pedia para a doença que a observava escorada em uma das paredes de seu mundinho, os braços cruzados, um sorriso no canto dos lábios.
— Desculpe. — repetiu, a voz falha, cobrindo o rosto com as mãos.
— Desculpe. — sua voz saiu abafada entre os dedos, as letras tentando se segurar neles antes que Kloe os capturasse.
— Tudo bem. Eu estou bem, querida, eu estou bem. — a menina não deixava ser tocada, e nesse momento a enfermeira sabia que não devia insistir em contato. — Eu sei que você não fez por mal, ok? Não se sinta culpada. — rogou. — Não foi você, eu sei. Foi à doença, querida. Não se sinta culpada.
Os olhos da menina varreram a alma da mulher, derramando larva quente por onde passavam. Subitamente o rosto da maior ficou em chamas, totalmente corada, despida.
— Mas a doença é minha! — a voz precipitando um grito.
— Shiu! Não grite, vão lhe ouvir. — a mulher interviu com o polegar nos próprios lábios, e a menina se calou, seus olhos vigilantes na porta.
Por mais que Dank esteja com raiva, não queria ser amarrada e colocada para dormir novamente. Seu corpo ainda doía e sua cabeça ainda dilatava... Ou era seu coração?
Depois de minutos sentadas no chã, uma em frente à outra sem nada dizer apenas se entreolhando, Lucy pendeu a cabeça para o lado e perguntou:
— Por que está aqui?
A enfermeira congelou. Seu rosto antes vermelho, agora pálido.
De novo não... A mesma pergunta de antes, mas agora, não tinha como escapar. Aliás, tinha, mas ou era Kloe a escapar ou Dank, e a enfermeira não deixaria a menina ir.
Soltando a ar em desistência, respondeu:
— Por que eu me achei.
Ao olhar para Lucy esperando ver uma cara satisfeita pela resposta, encontrou uma expressão de confusão, então resolveu explicar tudo logo de uma vez.
— Quando meus pais morreram, eu e minha irmã brigávamos muito. Ela tentava colocar a culpa toda em mim pela morte dos nossos pais, mas eu sabia que era só para tentar aliviar a dor que ela sentia. Todos nós sentimos culpa por alguma coisa querida, e muitas vezes por tudo que acontece, mas não é necessariamente nossa culpa. Nós só queremos ter algo para se apoiar enquanto caímos. — sorriu compreensiva para a menina, e continuou: — Então teve um dia que eu não aguentei mais. Sai de casa e aceitei o trabalho de enfermeira aqui. Esse lugar também é meu centro de reabilitação, Lucy.
— E por que ainda está aqui?
— Eu já falei. Por que eu me encontrei. Eu me achei em você, querida.
— Se encontrou em uma menina esquizofrênica?
— Também, mas você não é só isso. Eu me encontrei na garota maravilhosa que você é, na garota que me cativou com seus problemas, na garota que não precisa sorrir ou chorar para eu saber o que está sentindo. Eu me encontrei em mim. — e finalmente conseguiu tocar no rosto da menina sem a mesma se contrair. Ela conseguiu.
Quando o silêncio se alongou, a enfermeira se apoiou nos joelhos da menor e se levantou. Não querendo forçar mais nada deu as costas e rumou para a porta.
— Então essa é você, Kloe Flyn? — sua voz desafiou a mulher a parar e suas costas respirar. — Você sou eu?
A enfermeira soltou um meio riso nasalado e sorriu antes mesmo de olhar para o rosto da garota ainda sentada no chão.
— E você é mais que isso. — sorrindo genuinamente respondeu, e soube que Lucy também sorria mesmo que seu rosto não revelasse nenhuma expressão.
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A Esquizofrênica
RandomLucy, uma adolescente de dezesseis anos que vive em uma clínica de reabilitação desde os seis anos de idade. Dez anos de sua vida vegetando em uma maca, amordaçada e presa, rotulada como louca, tendo que se contentar apenas com passeios diários pelo...