Então, como já estava tarde e além da hora que ela costumava voltar para a casa dos pais onde morava, mudamos os planos e combinamos de nos encontrar no outro dia.
Trocamos os nossos telefones e combinamos de sair mais cedo no domingo, assim teríamos mais tempo para nos curtirmos.
Deixei-a em casa e antes de voltar para o Guarujá, mas antes passei no local combinado para pegar o Fredão, mas nada. Ele não estava lá... Dei um tempo e nada. Dei duas voltas na Praça da Independencia, voltei para praia e nada. Pensei comigo: -"O Fred se deu bem!"
Na volta, aquele misto de frustração e esperança. Afinal não rolou hoje, mas amanhã promete! Uma certeza me dominava, de agora em diante novas oportunidades com as garotas seriam mais constantes. Isso era sustentado pelo aumento da autoconfiança trazida pela nova situação econômica e social e que começara com a aquisição daquele carro.
O domingo prometia. O dia amanhecera lindo. É claro que não vi o amanhecer, pois acordei por volta das onze horas da manhã. Fui até a cozinha, onde estava a minha avó, já retirando as coisas da mesa. Como sempre, ela controlava os horários de todo mundo.
- "A que horas você chegou Enrique?"
Respondi que não sabia. Mas, ela num tom de bronca disse:
- "Até as três você não chegou. Fui no seu quarto e você não estava."
Dei um agarrão nela e despentiei seu cabelo, coisa que ela odiava. Enquanto ela se recompunha e me chingava, eu adorava isso, peguei uma xícara e tomei um café, fui até a frente do apartamento que tinha enormes janelas de vidro, do chão (quase) até o teto. Dali, podia-se ver quase toda a Praia das Pitangueiras. Fiquei uns minutos vendo se passava alguém conhecido andando na beira d'água. Como não passou ninguém, Bati um papo com meu pai que assistia a um jogo de futebol do Campeonato Italiano que passava aos domingos pela manhã na TV Bandeirantes. Fui comer algumas frutas. Coloquei a sunga e desci para a praia para bater o ponto no point da moçada. Na verdade, não teria muito tempo para ficar por ali, já que era dia de jogo do meu time de futebol de praia. Nesse time eu já jogava há uns quatro anos e sempre jogávamos ali mesmo nas areias da praia das Pitangueiras em frente à Rua Santo Amaro. A famosa Turma da Barra, que marcou época nas praias guarujaenses devido a certas características bem peculiares dos jogadores, e também por sermos mais organizados estruturalmente do que os adversários locais.
Bati um papo rápido com alguns amigos e acabei voltando mais cedo para almoçar e dar uma descansada antes do jogo. Além disso, nesse dia eu não fazia parte da equipe responsável por limpar a área de jogo e montar as traves. Naquele domingo eu estava na equipe de desmontar e guardar as traves.
Depois de almoçar e descansar, peguei a minha moto e fui para o calçadão em frente à praia. Cheguei por volta das três horas e fiquei por ali conversando e vendo a galera montar as traves e marcar o campo. Pontualmente às quatro horas estávamos na areia já com o uniforme azul e branco. Estava tudo perfeito, meu time ganhou e fiz um gol de falta. Essa era a minha especialidade, a bola parada. Faltas, penaltes e escanteios todos já sabiam, quem bate é o Enrique. E aquele gol de falta, foi o último gol da minha vida e nunca mais saiu da minha memória. Acabado o jogo, fiz rapidamente a minha parte nas tarefas para desmontar as traves e guardá-las na casa dos Ventura, que também estavam na Turma da Barra. Fui rapidinho para casa, pois tinha aquele importante compromisso para resolver. Antes, porém, desmarquei a já tradicional pizza com o Krikri, meu amigo e um dos diretores da Barra. O Krikri era o único cara que dividia a pizza comigo já que eu não como nenhum tipo de queijo, nem mussarela. Ele era um dos poucos que encarava a famosa meio atum & meio aliche, que os garçons quando nos viam até já sabiam o pedido. Era o programa de todos os domingos e aproveitávamos para conversar sobre o jogo, os lances, as táticas, os próximos adversários e tudo o que envolvia a organização do time.
Saí de casa antes das oito da noite e rumei para Santos. Quase tive um ataque quando vi que a fila da balsa que faz a travessia para Santos estava enorme e que, no mínimo, eu teria que ficar ali por duas horas. Pensei em um Plano B e saí da fila, fiz o retorno e voltei para casa. Liguei para a Magda, lhe contei da fila e sugeri uma saída: eu iria buscá-la de moto, já que as motos não ficavam na fila e voltaríamos para o Guarujá para dar uma volta até a Praia do Perequê, um lugar de barzinhos e música ao vivo. E assim, tudo combinado, fui outra vez para Santos. Por sorte, a Magda morava relativamente perto da balsa e não perdemos tanto tempo assim. Voltei para casa pegamos o carro e fomos para o Perequê.
Parecíamos velhos conhecidos, já não havia constrangimentos e nem timidez e acabamos nem ficando muito tempo assim no barzinho. O desejo de ambos era alguma coisa mais quente, mais íntima. Por sorte, a cinco minutos do Perequê havia um pequeno hotel que nas emergências funcionava como motel, já que naquela época os motéis eram proibidos no Guarujá. Sem perda de tempo, fomos direto para lá. Mal entramos na suíte e começamos a nos atacar, dispensando as preliminares. Queríamos matar o desejo nascido na noite anterior. A química tinha rolado desde a primeira troca de olhares e ali, naquele momento, tudo foi forte, tudo foi intenso.
Era perto da meia-noite, fui levar a Magda para Santos e por sorte já não havia fila para a travessia da balsa. Deixei-a em casa, marcamos de nos encontrar no próximo final de semana e voltei para o Guarujá. Enquanto esperava pela travessia de volta para casa, eu definitivamente acreditava que minha vida estava mudando, e mudando para melhor, até quase nem me lembrava dos flashes que vez por outra apareciam na minha visão. Às vezes eu até acreditava que podia ser algo menos grave e que tudo daria certo...
Havia sido um final de semana perfeito, daqueles que eu sempre pensei como ideais para uma pessoa viver. Pensava naquele momento como o primeiro de muitos, mas não, não seria! Seria o último, o primeiro e único.
O destino havia me concedido um "último desejo" e eu sem saber e sem pedi-lo, o vivi.
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Fidel com a dele e eu com a minha.
Não FicçãoUma Historia Real, passada nos anos 1980. Imagine, perder a visão aos 22 anos e ficar condenado a cegueira eterna. O que você faria? No cenário, as lindas praias de Guarujá e Miami, apimentadas com um pouquinho de Guerra Fria. Um jovem estudante de...
A DESPEDIDA
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