A ligação

63 2 0
                                    

Já estava escurecendo. Sento na velha cadeira de balanço que minha avó odiava,mas se recusava a jogar fora. A cadeira ia serenamente para frente e para trás. Deito minha cabeça e olho para o céu,como eu deixei as coisas chegarem a esse ponto?
Rafa abre a porta de vidro e se senta no chão a minha frente. O olho de um jeito sério. Eu não estava brava,só confusa.
-Anne,a gente precisa conversar.
Reviro os olhos com desdém.
-Quero explicações,todas.
-Tudo bem,só quero que tudo volte ao normal.
Ele não fazia ideia,mas essa era a minha maior vontade.
-Não vão voltar.
-Talvez voltem - ele pega um cigarro do bolso - Vai querer?
-É seguro?
Ele sorri. Aquele sorriso que fazia parecer que nevava no meu estômago.
-Claro que é.
Ele acende e me dá,depois faz o mesmo pra ele.
Nos olhamos e ele volta a falar:
-O que quer saber primeiro?
-Quero que me explique aquele papo de "me fazer mais forte".
-Okay,sua avó disse que você era frágil e que com a perda da sua mãe você vinha piorando. - ele para e olha para baixo - Disse que como seus amigos não poderíamos deixar você continuar vivendo daquele jeito.
-Frágil -falo devagar como se degustasse a palavra - Me deram um susto,me fizeram sentir medo  e sozinha,para me forçar a ser mais forte?
-É. - ele faz uma cara de desânimo.
O pior é que fazia um pouco de sentido, mas não era justificável ou era? 
-E o acidente?
-Depois que você fugiu,eles foram te procurar e você estava em uma caverna,lembra disso?
-Lembro. Ai minha avó apareceu com uma faca.
-Não Anne. - ele me olha cético - Quando chegaram você já estava desmaiada.
-Desmaiada? - respiro fundo - E depois?
-Bom,colocaram você no carro e te levaram pra casa.A Sara ficou um pouco com você,mas você teve um surto,começou a gritar com ela,se cortou,pegou uma garrafa das bebidas do seu pai e saiu com o carro.
-E o resto eu já sei.
-É Anne,não te machucamos. Era pra ser só um susto, por favor me perdoa.
-E o tapa que minha avó deu na Sara?
-Sua avó nunca encostou um dedo na Sara. - seus olhos grudaram em mim - Me perdoa?
Trago o cigarro pela última vez.
-Você sabe que não é tão simples,né? Eu confiava muito em você.
-Entendo - ele se levanta e anda em direção a porta de vidro.
-Espera.
Ele se vira pra mim e sorri levemente.
-Fala Anne.
-An,as lembranças que eu tenho estão bem confusas,mas eu escutava vozes que não eram as deles,acha que estou louca?
-Louca você sempre foi - o olho feio - Mas nesse caso,pode ter sido as coisas que você ouviu no hospital.
-Como assim?
-Sabe quando você está com a tv ligada e dorme?
-Sei - falo com um leve sorriso
-Ai,você começa a sonhar com algo e do nada as vozes do filme invadem seu sonho. Pode ter sido algo assim. -ele abre a porta e entra na casa - Qualquer coisa,estamos aqui.
Me ajeito na cadeira e volto a balançar. Tudo vai escurecendo, não só o lugar,minha visão também. O mundo encantador dos sonhos estava me chamando.
Sinto meu celular vibrar,mas que droga. O pego rápido e olho o número na tela. Eu devia estar sonhando, passo a mão no rosto e olho novamente. Respiro afoita e atendo.
-Mãe?

Uma SantaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora