Simplório Ivhan - parte 7

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          Esse olhar sério, eu poderia não ter percebido antes, mas por acaso... Ivhan realmente odiava sua irmã?

          — Claro que sim. A desgraçada arrancou cada braço, cada perna que eu tinha, e os comeu na minha frente... cada membro, ela o destroçou como se eu fosse feito de borracha, elas os engoliu pouco a pouco enquanto eu me afundava em minha poça de sangue, mas, não posso deixar que mais alguém a trate mal, não posso permitir, apenas eu, e somente eu tenho o direito.

          Por acaso... sua irmã...

          — Quando nasci, por ser o mais novo, tive um pouco mais de atenção dos meus pais. Eu não sabia que aquilo a deixaria irritada, eu era muito novo.

          — Ela sentia ciúmes com relação a você?

          — Eu diria que era mais a inveja, eu era visivelmente mais cuidadoso que ela, mesmo jamais desejando por isso, eu a amava, eu só notei isso na adolescência, quando a vi roubando meus sapatos e jogando-os no fogo. Mas, tudo foi diferente quando ela teve aquele namorado esquisito, um cara com o tipo de mente que só gente que já foi presa tem.

          Ivhan continuou a me contar.

          Gaizess, a irmã de Ivhan, se envolveu com um cara fora da linha, passava a maior parte do tempo fora de casa e até mesmo dias sem dormir lá. Embora os pais de ambos demonstrassem preocupação no início desse comportamento rebelde, logo foram esquecendo que Gaizess era parte da família, a forma como ela mesma escolheu se afastar não só proporcionou uma saída, mas um esquecimento completo de seus próprios familiares.

          Considerando que o motivo que levou ela a fazer isso seja Ivhan, ou melhor, seu pensamento de que Ivhan era o culpado, Gaizess se manteve cada vez mais no limite, e ao longo de sua irresponsável aventura, um desastre ocorreu.

          Ela morreu.

          O acidente provocado pelo giro indevido da moto de seu namorado deixou duas sequelas, a ausência da sensibilidade das pernas no namorado, uma ruptura em sua espinha; e a morte de uma irmã mais velha rebelde, que só estava ali por odiar seu irmão mais novo mais do que qualquer outra coisa.

          Trágico.

          Todos choraram.

          Um velório cheio de pessoas.

          Mil rosas encima do caixão.

          Os céus choravam junto.

          Claro que não, é uma mentira, nada disso aconteceu.

          Ninguém foi até seu enterro, nenhum parente se apresentou no hospital para confirmar que a jovem morta possuía família, nenhuma amiga ou pessoa próxima soube ou sequer lembrou que ela existia, nem mesmo Ivhan soube disso, ela simplesmente morreu no esquecimento. Pode-se dizer que ela morreu assim que perdeu seu laço com os familiares, mas isso seria presunção demais, seria idealizar que ela dependia deles, e isso não é verdade.

          Então, a ira, não só de ser esquecida, como a de invejar o amor dado a seu irmão, a forçou a que retornasse com aquilo, como aquela, como sua mesma forma, como sua mesma essência, uma representação viva de toda a inveja que sentia e o desejo de usurpar tudo que achava ter sido retirado por Ivhan, pois é isso que esse sentimento é.

          Uma ladra. Melhor pensar mais no que dizer a partir de agora.

          — Eu estive pensando em muitas coisas depois que recuperei meu corpo.

Zokugatari: ExodusOnde histórias criam vida. Descubra agora