Capítulo 49: Onde ela está?

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Se em algum momento da minha adolescência eu pensava que ia chegar nesse ponto da minha vida, eu diria que não. Nunca tive uma família perfeita, porque meus pais viviam brigando, mas eles ainda se esforçavam pra ficar juntos. Claro que isso nunca foi real. Pelo menos não pro meu pai, já que ele estava traindo a minha mãe enquanto fingia se importar com a família. Acho que ele teria continuado fingindo se ela não tivesse o descoberto.

Mas aí é que está a questão. Se ela nunca tivesse descoberto, talvez ainda estivéssemos no mesmo limbo de uma família quase perfeita, que ignora os problemas e fingi ser feliz pra quem vê de fora. Eu achava que meus pais nunca iam se separar. Eu imaginava que iria me formar tendo os dois juntos, enquanto eu e Érika nos matávamos no restante do tempo.

E, definitivamente, eu não esperava ter Camila de volta na minha vida. Mas as vezes um simples ato poder mudar o futuro inteiro. Meus pais estão separados. Quero ficar com a guarda da minha irmã, que na maior parte das vezes eu fingia não suportar a presença, porque é isso que os irmãos fazem. E Camila está aqui. Passei tanto tempo magoado com ela, que agora me sinto um idiota por não ter ido atrás dela quando ela foi embora.

Abri um sorriso quando a porta do apartamento se abriu e as garotas entraram. Camila estava entre elas, rindo enquanto carregava algumas sacolas de compras. Vê-la feliz era uma sensação desconcertante. Eu tinha muitos planos pra minha vida depois da formatura. E todos eles envolviam ela, porque não tinha como alguém separar a gente.

—Ja estávamos achando que teríamos que ligar pra polícia, porque vocês não voltavam nunca. —Bernardo afirmou, enquanto as três atravessavam a sala até nós. Camila sorriu pra mim, enquanto Léo abria espaço para ela se sentar ao meu lado.

—Tudo bem? —Indaguei, vendo-a balançar a cabeça que sim e se inclinar para me dar um beijo.

—Comprei um presente pra você. —Afirmou, me fazendo erguer as sobrancelhas em um ato de surpresa, porque Camila não costumava me dar presentes. Pelo menos não aleatoriamente. —Mais tarde eu te entrego. Pensei que a gente podia sair pra fazer alguma coisa juntos hoje, antes do meu trabalho.

—Se distrair com as garotas foi bom, né? —Constatei, sabendo que Camila só queria evitar pensar demais no pai, porque aquilo deveria fazê-la mal. Posso não gostar do meu pai, mas não posso deixar de pensar que ele ainda é um pouquinho melhor que o pai de Camila. Mas só um pouquinho. —Vou pensar em um lugar legal que a gente possa ir pra passar um tempo juntos. Tem alguma coisa que você gostaria de fazer?

—Não sei. —Camila se inclinou para perto de mim, escorando a bochecha no meu ombro, visivelmente desanimada. Entrelacei meus dedos nos dela, me perguntando o que eu poderia fazer pra que ela se sentisse melhor. Toda aquela situação com o pai dela era péssima.

—Antes do Léo ir embora, eu queria fazer um passeio de barco. A gente podia ir até aquela ilha onde tem a fortaleza. —Júlia exclamou, chamando a nossa atenção. Ela estava falando com Felipe, mas era óbvio que o "a gente" se referia a todos nós. —Edu fala com o pai dele e pede pra Érika poder ir junto. Aposto que ela vai gostar.

—Ela vai é vomitar no barco. —Afirmei, porque minha irmã vomitava com qualquer coisa que balançasse demais. Até em viagens longas de carro. —Mas se todo mundo quiser ir. Só não sei se vou conseguir convencer meu pai igual a vez do acampamento. Ele não anda muito animado com a minha presença na casa dele.

—Cretino. —Camila sussurrou ao meu lado, o que me fez soltar uma risada e negar com a cabeça. Ela não parecia não só não ir com a cara dele, mas ter uma aversão completa. —Eu gosto da ideia. Eu nunca andei de barco antes.

Camila se afastou quando meu celular começou a tocar. Fiz uma careta quando vi que era o meu pai, me perguntando que milagre havia acontecido pra ele me ligar, já que ele nunca fazia isso. Tinha a sensação que o velho preferia morrer a me pedir qualquer coisa. Não que eu o julgasse por isso, e tinha esse mesmo pensamento.

Pai — Onde você está?

Fiz uma careta com a pergunta repentina e grosseira, mesmo que já estivesse acostumado a não receber qualquer coisa carinhosa vindo dele.

Eduardo — Em casa, por quê? O que você quer?

Pai — Estou aqui na frente. Por que você não atende a merda da porta?

Afastei meu celular do ouvido quando ele desligou, vendo-a expressão confusa no rosto de Camila, deixando claro que ela havia escutado. Até porque meu pai não sabia falar baixo. Ele praticamente gritava. Fiquei de pé e caminhei até a porta, abrindo-a apenas para encontrá-lo esperando na frente da porta do apartamento que eu dividia com Camila.

Ele se virou, fazendo uma careta quando me viu em outro apartamento, antes de olhar para a porta em que estava, como se pensasse que tinha errado o número. Com uma expressão furiosa, ele veio pra cima de mim. Me preparei para o que eu imaginava que seria uma conversa nada amigável.

—O que você quer?

—Onde ela está?

—Ela quem, pai? —Indaguei, fazendo uma careta pra ele, sem entender sua pergunta aleatória.

—A sua irmã, Eduardo. Eu sei que ela está aqui. Não quero saber de gracinha pra cima de mim. —Meu pai apontou o dedo pro meu rosto. —E eu vou fazer questão de adicionar isso no processo da guarda dela. Você não pode tirá-la de casa sem a minha autorização.

—Eu não tirei ela de casa. Ela não está aqui. —Afirmei, vendo-o soltar uma risada e negar com a cabeça. —Ela não está com você?

—É claro que não, Eduardo! —Exclamou, explodindo de frustração. —Eu sei que você trouxe ela pra cá ontem a noite. Eu estava esperando você criar algum juízo e levá-la de volta pra casa. Mas pelo visto você só quer me irritar mesmo. Cadê a sua irmã?

—Ela não tá aqui! Eu não fui buscar ela ontem a noite. Estava no bar tocando com os meus amigos. Pode perguntar pra eles se quiser. —Afirmei, odiando a desconfiança dele, porque eu não seria burro a esse ponto, quanto estava tentando fazer tudo certo pra conseguir a guarda dela.

—E onde ela está então? —Indagou, rangendo os dentes como se fosse me bater, pela forma que estava me olhando. —Se você estiver mentindo pra mim...

—Se eu estiver mentindo? A Érika está sobre a sua proteção. Se ela sumiu, a culpa é sua. E se ela sumiu ontem a noite, você deveria ter vindo atrás de mim antes ou ligado pra polícia! —Exclamei, finalmente me dando conta de que minha irmã realmente tinha sumido, porque eu não tinha a visto ontem a noite. —Puta merda!


Continua...

Todas as lembranças perdidas / Vol. 3Donde viven las historias. Descúbrelo ahora