Capítulo 38: Nossa casa na árvore.

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A caminhada pela trilha levou alguns minutos, até acharmos um enorme poço no rio, onde passamos as próximas horas nos divertindo na água. Mesmo mantendo alguma distância de Eduardo, eu estava sempre o sentindo olhar pra mim e quando olhava na direção dele, ele piscava e sorria, como se quisesse me provocar.

Quando o dia se tornou quente demais, voltamos para o acampamento, onde passamos as horas seguintes só conversando e rindo. A sensação que eu tinha era que havia entrado em um mundo paralelo, porque nós últimos cinco anos, nunca tinha estado com amigos, apenas aproveitando a presença uns dos outros. Era uma realidade que eu ainda não estava acostumada.

Quando anoiteceu, nos sentamos ao redor da fogueira. Depois de passar o dia todo mantendo certa distância de mim, como se quisesse me dar algum espaço, Eduardo finalmente se sentou ao meu lado e me abraçou, deixando um beijo carinhoso no meu ombro. Talvez eu estivesse apenas sonhando com aquilo. Se fosse, eu esperava realmente nunca acordar.

—Alguém se habilita em contar uma história de terror? —Júlia indagou, e Bernardo rapidamente ergueu a mão pra cima, como se estivesse esperando o dia todo por isso.

—Ah, não. Nem pensar. —Manu exclamou, puxando a mão do namorado pra baixo, o que arrancou várias risadas de todos nós. —Não quero ir dormir com uma história de terror na cabeça.

—Mas eu te protejo. —Bernardo se inclinou para dar um beijo nela, enquanto Manu ria ao tentar se esquivar.

—Gosto de histórias de terror, mas não quando eu vou dormir sozinha. —Érika afirmou, e eu lancei um olhar furtivo na direção de Léo, que estava silencioso sentado em um dos troncos, encarando a fogueira entre nós.

—Eu fico segurando a sua mão até você dormir, pirralha. —Érika mostrou o dedo do meio a Eduardo assim que ele terminou de falar. —Por que não conta a eles a sua ideia genial de colocar tinta verde no shampoo do nosso pai.

—Mentira! —Júlia exclamou, enquanto Felipe caia na risada ao lado dela, como se aquilo fosse bem a cara de Érika. —Bem que eu estava estranhando que você estava muito quietinha. Demorou pra você aprontar alguma coisa.

—É, tenho uma listinha de coisas que sei que vai fazer meu pai se descabelar. —Érika murmurou, com um tom de voz que quase a fazia parecia um anjinho. —Eu avisei pra ele que ia inferniza-lo. Ninguém mandou ele duvidar de mim.

—Só, por favor, não faça nada que possa acabar causando uma merda grande. —Eduardo pediu, usando um tom de voz cauteloso, deixando claro que conhecia muito bem a irmã que tinha. —Tenho uma reunião com o advogado marcada, para depois de amanhã. Vou saber o que posso ou não fazer nessa situação.

—Se precisar de qualquer ajuda com isso, conta com a gente, cara. —Felipe afirmou, enquanto os outros concordavam com a cabeça. —Convivemos com vocês dois todos os dias por meses. Sabemos como você era protetor com a Érika. Ela estar no bar aquela noite não significa nada sobre você.

—Isso só aconteceu porque tranquei vocês dois naquele depósito. Talvez, se você tivesse ido embora com a Érika aquela noite, as coisas seriam diferentes. —Léo murmurou, tão baixo que quase não consegui ouvir. Todo mundo olhou na direção dele, vendo-o ainda encarar o fogo com uma expressão pensativa.

—A culpa não foi sua, Léo. Nada disso teria acontecido se meu pai não tivesse colocado alguém pra nos vigiar. E acredite quando eu digo, não faria diferença nenhuma eu estar junto com a Érika quando foram embora. —Eduardo não hesitou em retrucar, balançando a cabeça negativamente enquanto comprimia os lábios. —Meu pai só queria encontrar uma forma de ganhar a guarda dela, jogando limpo ou não. E ele conseguiu.

—Odeio o quanto ele acha que está certo sobre tudo e o restante do mundo está errado. —Érika bufou ao dizer isso, como se estivesse frustrada com a situação.

Encarei o fogo também, lembrando do meu próprio pai e de como ele também agia como se ele estivesse certo sobre tudo e o restante do mundo errado. Não sentia falta dele. E todas as lembranças que eu tinha eram completamente ruins. O pai de Eduardo poderia não ser agressivo, mas ele era tão narcisista quanto o meu. Isso explica porque eles eram amigos quando vizinhos.

[...]

Me ajeitei em um cantinho na barraca, escutando a conversa baixa entre Eduardo e Érika na barraca do lado. Foram só alguns minutos, antes de a noite se tornar silenciosa. O brilho da fogueira iluminava à frente da barraca, enquanto Eduardo entrava e a fechava, sendo completamente silencioso, como se achasse que eu já estava dormindo.

—Sua irmã está bem? —Indaguei, fazendo-o perceber que eu ainda não tinha dormido.

—Sim. Acho que ela só está frustrada com o fato de que amanhã precisa voltar pra casa do nosso pai. —Eduardo afirmou, vindo se deitar ao meu lado. Fechei meus olhos quando ele me abraçou, me puxando contra o corpo dele, até seu calor me envolver de forma aconchegante. —Vou resolver isso, Cami. Juro pra você que vou.

—Eu sei. —Sussurrei, tocando a mão dele que estava espalmada na minha barriga. Sentia a necessidade de Eduardo de me convencer sobre aquilo, porque era óbvio que ele sentia um peso enorme com toda essa história. Uma vontade de não decepcionar a irmã. —A Érika também sabe. Ela confia em você. Não iria querer ficar com você se não confiasse.

—Quero levar você em um lugar depois que voltarmos pra cidade. —Os lábios dele estava perto demais da minha orelha, me causando um arrepio por toda pele. Eduardo apertou os braços ao redor de mim, como se soubesse o que tinha feito. —Nossa casa na árvore. Estive lá alguns dias atrás. Ela continua do mesmo jeitinho que deixamos.

—Uma pena que a gente precise olhar pra cara do seu pai pra poder ir até lá. —Falei brincando, arrancando uma risada de Eduardo. Também estava rindo, mas meu coração estava acelerado, porque aquela casa na árvore tinha sido importante pra nós dois. E pensar em voltar nela ao lado de Eduardo quase me deixava sem fôlego.

—Quem sabe, quando tivermos nossa própria casa, não podemos ter nossa casa da árvore. —Eduardo sugeriu, enquanto eu absorvia aquelas palavras, sentindo algo dançar na boca do meu estômago quando percebi o que Eduardo queria dizer com elas.



Continua...

Todas as lembranças perdidas / Vol. 3Kde žijí příběhy. Začni objevovat