Capítulo 16: Vou guardar seu segredo.

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Sai tropeçando de dentro do bar, porque estava ocupada demais tentando não surtar, em vez de prestar atenção no caminho. Queria muito olhar pra trás e ver a cara de Eduardo, mas tinha medo de olhar e me decepcionar. Uma pontinha de esperança ainda persistia dentro de mim, imaginando que ele não tinha me esquecido. Mas eu também sabia que ele estava magoado e isso não seria fácil de superar.

—Tudo culpa sua, pai. —Resmunguei, caminhando até onde estavam as coisas do pessoal. —Agora eu tô na merda e você vivendo sua vida como bem entende. Espero que pelo menos esteja feliz. Não, mentira, espero que o carma venha tão forte que você...

—Falando sozinha? —Soltei um gritinho de susto quando Érika apareceu atrás de mim, erguendo as sobrancelhas com uma careta no rosto quando me virei para encara-la.

—Ah, pensando alto, sabe como é. —Falei, dando de ombros, vendo ela soltar uma risada e negar com a cabeça. —Onde estão os outros?

—Ainda no mar. Onde você trabalha? —A olhei, enquanto me sentava em uma das cadeiras de praia que eles tinham trazido ali, sentindo o sol quente na minha pele. Érika se sentou ao meu lado, franzindo a testa por conta do sol. —Você disse que pega as 18:00.

—Em um bar perto da universidade. —Falei, umedecendo os lábios com a língua, vendo-a olhar pra mim por um instante, como se estivesse pensando em algo. —É no mesmo bar que seu irmão toca.

—Sério? —Érika abriu um sorriso enorme, como se aquela fosse a melhor notícia de todas. —Desde quando você trabalha lá? Eu nunca vi você lá.

—Faz poucas semanas. E eu costumo ter folga na sexta. —Afirmei, porque imaginava que era o dia que Eduardo ia até lá tocar com seus amigos, já que foi o dia que eu os vi entrando no bar.

—Ah, isso é ótimo, Camila. Sempre vamos lá na sexta. Aí você pode ir com a gente, se divertir, em vez de ficar trabalhando. —Érika exclamou, super animada, enquanto eu abria um sorriso nervoso, imaginando a animação que o irmão dela iria sentir quando ficasse sabendo disso.

Como se sentisse que eu estava pensando nele, Eduardo apareceu ali, desviando das coisas para ir até sua prancha, fincada na areia bem ao meu lado. Tentei não olhar pra ele, mas de relance vi sua expressão super séria, enquanto seus movimentos eram quase rígidos demais, como se ele estivesse se segurando para não explodir.

—Ei, sabia que a Camila... —Eduardo ignorou Érika, pegando a prancha do meu lado, sem olhar pra qualquer uma de nós duas, antes de seguir em direção ao mar. —Ei, seu babaca, eu estava falando com você! Qual a droga do problema dele?

Deu de ombros, pegando meu óculos escuro, enquanto tentava disfarçar, porque conseguia imaginar muito bem qual era o problema dele. Aquilo fez uma risada borbulhar na minha garganta, porque tinha certeza que dividindo o mesmo teto, seria impossível evitar que voltássemos as lembranças de anos atrás. Eu estava preparada pra isso, mas achava que Eduardo não.

[...]

Não havia nada melhor do que dormir em um apartamento onde você sabia que estaria segura. Não me lembro de ter dormido tão bem nas últimas semanas como essa noite. O fato de ter ido pra praia e aproveitado o dia com eles, antes de ir trabalhar me deixou animada demais, a ponto do meu chefe até estragar. Mas quando cheguei em casa, simplesmente me joguei na cama e dormi em segundos.

—Bom dia. —Falei, desviando os olhos quando entrei na cozinha e dei de cara com Eduardo usando apenas uma calça de moletom cinza.

Meu rosto esquentou, porque na praia eu já tinha notado que ele havia passado de um garoto magro na adolescência, pra músculos que chamavam a atenção. Era demais pro meu cérebro processar logo depois de acordar. E era o suficiente para minha pulsação disparar, como se fogos de artifício estivessem explodindo dentro de mim.

Mas foi algo momentâneo, porque Eduardo pegou seu café e seu sanduíche e saiu da cozinha, sem olhar na minha cara ou responder meu bom dia. Aquilo me fez soltar uma risada, porque era óbvio que ele ia fingir que eu não estava ali. Era tão maduro da parte dele fazer isso. Eu deveria recorrer a esses métodos quando não conseguir controlar meus próprios sentimentos.

Arrumei meu café, seguindo para o meu quarto, vendo que Eduardo estava sentado no sofá assistindo tv. Quando passei em frente a porta do quarto de Érika, ela estava aberta, revelando uma estante na parede, cheia de livros. Isso me fez soltar um gritinho de animação, que a assustou completamente, porque ela apareceu na porta no segundo seguinte, com os olhos arregalados.

—O que foi? —Questionou, olhando para os lados, como se esperasse ver algo muito ruim ali.

—Você tem tantos livros. —Falei, seguindo pra dentro do quarto de Érika quando ela se virou na direção da estante. —Léo comentou comigo que você lia, mas eu não pensei que tivesse tantos assim. Precisa me emprestar algum pra ler. Sério, faz tanto tempo que não pego em um livro assim.

—Só se você me prometer que vai cuidar deles como se fosse a sua vida. —Érika afirmou, antes de parar na frente da estante, espiando por cima do meu ombro, antes de olhar pra mim e ficar ligeiramente vermelha. —E alguns deles tem alguns conteúdos... é... um tanto... românticos demais.

Ergui as sobrancelhas, porque Érika estava gaguejando tanto e ficando ainda mais vermelha, enquanto eu tentava entender do que ela estava falando. Olhei para os livros atrás dela, passando os olhos em alguns nomes, antes de entender que tipos de conteúdos românticos demais os livros possuíam.

—Ah... —Soltei uma risadinha, vendo Érika revirar os olhos, completamente constrangida. —Não se preocupe. De uma leitora pra outra leitora, vou guardar seu segredo. Mas você precisa me emprestar esses livros, ou vou morrer só de ficar olhando pra eles.

Érika riu, saindo de frente da estante e esticando as mãos como se deixasse todos eles disponíveis pra mim. Caminhei até ali, observando os livros que Érika tinha, enquanto ela me observava atentamente. Quando escolhi um deles, ela soltou uma risada nervosa, mas ela nem fazia ideia de que eu já lia livros assim muito antes dela.

—Muito obrigada. —Falei, me inclinando e dando um beijo na bochecha dela. —Prometo te devolver ele ainda essa semana, inteirinho.

Érika me lançou um olhar que deixava claro que iria me matar se eu não cumprisse essa promessa. Segui para fora do quarto dela, sentindo uma sensação quentinha no meu peito, porque ia amar passar um pouco do meu tempo lendo alguma coisa. Antigamente eu era uma pessoa que não ficava um dia sem pegar um livro na mão pra ler pelo menos uma página.

—Desculpa. —Murmurei, ficando sem graça quando trombei com Eduardo na saída do quarto de Érika, dando bem de cara com aquela parede de músculos perfeita que ele tinha.

Devo ter babado um pouco nele, porque meu rosto esquentou como se eu fosse queimar de dentro pra fora quando ergui os olhos e o vi me observando, com uma expressão que não era nem de raiva, nem de mágoa. Era como se ele estivesse perdido no meu rosto. Aquilo me fez soltar o ar com força, enquanto abraçava o livro contra o meu peito, porque tinha medo de me desmanchar na frente dele.


Continua...

Todas as lembranças perdidas / Vol. 3Where stories live. Discover now