Capítulo 12: Ele não me deixou avisá-lo.

518 115 15
                                    

Eu estava terminando de ajeitar minhas roupas no guarda-roupa quando escutei um coro de vozes femininas discutindo com Eduardo. Encarei a porta fechada do meu quarto, comprimindo os lábios ao perceber que as vozes estavam ficando mais próximas. Quando percebi, alguém já estava entrando no meu quarto.

—Caralho, Érika, pelo menos bate na porta antes de entrar! —Eduardo resmungou do lado de fora, enquanto sua irmã entrava no meu quarto e olhava ao redor até me encontrar, abrindo um sorriso enorme. Atrás dela estava Manu e uma outra garota de cabelos brancos e muito curtos.

—Olá! —Soltei uma risada nervosa com a invasão, mesmo que não tivesse incomodada de fato com isso. Era bem melhor ter o quarto invadido por ter garotas do que por um maluco.

—Desculpa invadir seu quarto, mas o meu irmão estava querendo nos impedir de vir até aqui falar com você. —Érika revirou os olhos, enquanto eu via Eduardo na porta, olhando pra ela com a expressão mais mortal de todas. —Você conhece a Manu, mas aquela é a Júlia. Você se lembra de mim?

—Bom ver você de novo, Manu. —Falei, abrindo um sorriso pra ela, antes de acenar para Júlia e voltar a olhar para Érika. —É claro que eu me lembro. Você era super pequenininha quando nossos pais eram vizinhos. Está enorme agora e muito bonita.

—Ah, muito obrigada. Você também está linda. Até entendo meu irmão por ficar com essa cara de bunda desde que te reencontrou. —Érika se aproximou de mim, enquanto eu via Manu e Júlia tentando esconder os sorrisos. —Sinto muito por ontem. O quarto é seu e você não precisa ir embora.

—Obrigada, Érika. Eu estava mesmo precisando desse quarto. —Falei, soltando uma risada nervosa, porque ela estava no carro ontem e sabia muito bem minha situação.

—A gente não estava lá, mas se tivesse tinha quebrado a cara daquele idiota. —Júlia afirmou, me fazendo encolher no lugar, porque pelo visto todas elas já estavam sabendo sobre minha moradia precária. —Mas pelo menos o meu irmão fez isso.

—Seu irmão? —Franzi a testa, processando aquela informação, antes de me dar conta de quem ela estava falando. —Ah, Léo é seu irmão?

—Mais novo. —Júlia deixou claro, como se aquilo fosse algo questionado constantemente. Acabei rindo, observando a expressão fechada de Eduardo, quando ele virou as costas e sumiu da porta, parecendo uma criança emburrada. —O que diabos há com ele, hein? Vocês dois se desentenderam por acaso? Pensei que se conheciam a bastante tempo.

—A gente se conhece, mas... —Olhei para Érika, vendo-a morder o lábio para não sorrir, enquanto eu sentia minhas bochechas ficando quentes. —A gente não se falava há muito tempo. Só isso.

Júlia me lançou um sorriso cético, como se pudesse imaginar que havia bem mais ali do que só isso. Sorri pra ela, tentando não demonstrar o quanto qualquer coisa relacionada a Eduardo me afetava mais do que eu gostaria. Tinha passado os últimos cinco anos vendo minha vida declinar, com momentos dignos de uma peça de teatro cheia de muito drama.

—Bom, estamos indo pra praia depois do almoço. Queríamos convida-la pra vir com a gente. —Manu se aproximou, me ajudando a colocar as roupas no guarda-roupa. —Estamos de férias, então temos que aproveitar antes que as aulas comecem de novo.

—É muita gentileza de vocês, mas não sei se posso ir. —Falei, um pouco sem graça, porque Eduardo tinha deixado bem claro que eu não podia me meter na vida dele. Bem, aquele grupo de amigos era dele. Tinha a sensação que se eu fizesse amizade com eles, isso só deixaria Eduardo mais incomodado comigo.

—Por que não? Por causa do meu irmão? —Érika indagou, balançando a cabeça negativamente antes que eu respondesse. —Ele é chato 24 horas por dia, Camila, isso não tem nada a ver com você. E hoje é sábado, duvido que você tenha alguma coisa pra fazer.

—Eu pego no trabalho as 18:00. —Dei de ombros, vendo Érika tombar a cabeça de lado e revirar os olhos, o que me fez rir. — Que praia vocês vão? Eu apareço lá...

—Nem vem com essa, você vai com a gente. Moramos literalmente na porta da frente. —Júlia me cortou, antes que eu conseguisse terminar de falar. —Meu namorado tem uma kombi. Tem espaço pra todo mundo.

—Se o Eduardo quiser me matar, vocês vão ser obrigadas a ir no meu enterro. —Deixei claro, arrancando uma risada delas e gritinhos de comemoração, que fez eu me sentir muito bem, porque fazia tempo demais que eu não sabia o que era ter amigas e sair com alguém.

Manu e Júlia saíram do quarto, me deixando sozinha com Érika. A irmã de Eduardo se sentou na minha cama, me observando terminar de arrumar minhas coisas. Eram poucas, então logo minha mala vazia já tinha sido descartada em um canto, assim como a caixa de papelão. Érika me observou grudar as duas fotos que tinha na parte de dentro da porta do guarda-roupa, onde Eduardo não poderia vê-las, apesar de eu ter certeza de que ele ficaria bem longe do meu quarto.

—Por que você foi embora? —Érika indagou, me deixando tensa, porque ela tinha apenas 12 anos quando tudo aconteceu. Eu quase não a via, mesmo que eu e Eduardo não nos desgrudássemos naquela época. —Lembro que o Edu ficou muito abalado quando descobriu, porque você não tinha avisado ele e nem se despedido. —Segurei a porta do guarda-roupa com força, sentindo meu coração se apertar ao ouvir aquilo de Érika. —Mas ninguém nunca me disse nada sobre você. Minha mãe me proibiu de ficar falando sobre isso.

Soltei o ar com força, me sentindo sem folego com a sensação do meu coração sendo esmagado. Fechei meus olhos com força, antes de erguer a mão e limpar as lágrimas que caíram dos meus olhos rapidamente, porque não queria que ela as visse. Quando me virei para Érika e a encontrei me observando, tentei abrir o sorriso mais tranquilo possível, mesmo que por dentro alguém estivesse enfiando uma faca bem funda no meu peito.

—Eu não sabia que ia embora, Érika. Pode achar que estou mentindo, mas eu não fazia ideia. Seu irmão era meu melhor amigo. Se eu tivesse ficado sabendo, teria saído correndo pra contar a ele sem pensar duas vezes. —Afirmei, vendo-a assentir com a cabeça, como se acreditasse em mim. E eu só queria que Eduardo estivesse disposto a me ouvir como ela estava. —Só fiquei sabendo na mesma noite, quando voltei pra casa. Não sei se alguma vez você ficou sabendo disso, mas meu pai não gostava muito do seu irmão.

Abracei meu próprio corpo, tentando espantar as lembranças daquela noite. Mesmo depois de cinco anos, ainda lembrava da sensação que foi quando descobri que ia embora. Quando entrei em casa depois de me despedir de Eduardo e encontrar meus pais na sala discutindo. De ver a expressão furiosa no rosto do meu pai quando olhou pra mim, de uma forma que eu soube no mesmo instante que ele sabia. Que ele tinha visto o que não deveria.

—Ele não me deixou avisá-lo. —Falei, ignorando o arrepio desagradável que percorreu meu corpo. —Nem naquele dia e muito menos depois. E quanto ele foi embora, acho que já era tarde demais e... —Abaixei a cabeça, porque não queria ficar vendo a expressão séria no rosto dela. —Minha mãe ficou doente e eu precisei cuidar dela.



Continua...

Todas as lembranças perdidas / Vol. 3Dove le storie prendono vita. Scoprilo ora