CAPÍTULO 15

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   Ainda não faço ideia de onde Victor está, e olha que já observei cada canto desse acampamento. Agora estou nadando para longe da pequena multidão de pessoas que estou nadam perto da margem.

      Assim que chego numa distância considerável, mergulho até quase o fundo, antes que um simples pensamento faça a cauda azul aparecer, como uma camada de magia colocada sobre as minhas pernas. Eu era praticamente viciado em "siren" uns tempos atrás e não perdia um episódio sequer, mas a transformação, por mais estranha que seja, não é dolorosa ou horrível de ver como a das sereias da série.

      Bolhas de ar escapam pelo meu nariz enquanto os meus pulmões se enchem de água. Eu toco as guelras de forma distraída, sentindo a pele ondular sob meus dedos. Essa sem dúvidas é a parte mais estranha de todas.

     A dor na minha coluna parece ter sumido num passe de mágica, mesmo após eu experimentar nadar em círculos imaginários. A diversão e a sensação de liberdade quase mascaram o fato de que a noite passada foi uma merda, e que se eu não voltar ao normal logo, provavelmente vou enlouquecer.

      Eu nado até a superfície apenas para ver em que direção fica a ilha mesmo, tomando cuidado para não colocar o nariz para fora da água e respirar o ar, o que provavelmente faria o meu corpo expulsar a água e me fazer tossir e espirrar pra caramba.

      Assim que volto a ter noção de para onde fica o acampamento e a ilha, mergulho novamente e começo a nadar até lá, em movimentos meio ondulantes para ir mais rápido. As pequenas e estreitas nadadeiras dos meus antebraços me ajudam a impulsionar o corpo para a frente enquanto nado, embora a grande maioria dos impulsos venham da enorme barbatana na ponta da minha cauda.

     Não demora muito para que eu chegue até a ilha, desviando com cuidado das pedras enormes e meio que rastejando para fora da areia, porque é mais fácil voltar a minha forma humana quando não estou em contato com a água. Aquela vontade incontrolável de tossir cruza o meu corpo assim que respiro fundo, fazendo os meus pulmões expulsarem a água pelas guelras.

      A areia pinica um pouco, então fecho os olhos e tento voltar ao normal o mais rápido possível. Um pensamento frenético invade a minha mente, junto com lembranças de mim mesmo na minha forma humana.

     ... Minhas pernas... Eu quero minhas pernas de volta... Minhas pernas minhas pernas minhas pernas minhas pernas...

    A força dos pensamentos repetitivos e o desejo contido neles faz aquele calor começar a fluir pelo meu corpo, e quando abro os olhos novamente, a cauda azul desapareceu, deixando as minhas pernas pálidas repletas de grãos de areia no lugar. O meu calção fino também retornou, e pela sensação lá embaixo, está tudo em ordem com as minhas partes íntimas.

      Olho para as árvores enormes a minha frente, tentando descobrir onde procurar por Wyatt. A gente ficou de nos encontrarmos aqui, mas não nos atentemos em escolher o local.

     — WYATT?! — Chamo-o, enquanto levanto do chão e bato as mãos no meu calção, para me livrar pelo menos da metade da areia.

     — Oi. — O Garoto loiro surge da trilha poucos segundos depois, vestindo uma sunga amarela, dessa vez. Ela complementa perfeitamente o tom da sua pele, deixando-o ainda mais gostoso, e ao perceber que estou encarando descaradamente, desvio o olhar de forma rápida, sentindo as minhas bochechas esquentarem.

     — Vamos? Eu estava esperando por você. — Ele explica, caminhando na minha direção, até parar de frente para mim, com apenas meio metro nos separando. Eu não sei explicar direito, mas Wyatt tem uma força invisível que me atrai para ele. Será que é algum dom do povo do mar, igual nas histórias? Atrair as pessoas com a sua beleza? A sua voz? O calor que emana da sua pele? Se for, com certeza está funcionando.

     — D-desculpa por te deixar esperando. A minha noite foi péssima e eu dormi até tarde. — Explico, esfregando uma mão na outra, com um pouco de nervosismo. Seria um pouco estranho pedir para ele me beijar agora? Parte de mim quer isso, mas a outra parte quer que todo esse lance de tritões e sereias acabem de uma vez por toda e eu volte ao normal.

     — Dores de cabeça? — Ele pergunta, então eu confirmo com a cabeça e abro a boca para perguntar como ele sabe disso, mas sou interrompido antes que algum som saia da minha boca: — Vamos cair na água, Luther!

     — O-okay... — Começo, um pouco nervoso porque ele acabou de pegar minha mão e entrelaçou nossos dedos, para então começar a me puxar em direção a água. O contato envia uma série de arrepios pelo meu braço, como se fosse uma eletricidade estática.

      Wyatt começa a pular por cima de umas pedras enorme e circulares, mas eu faço isso lentamente, tomando o maior cuidado do mundo, porque caso caia, eu posso rachar a cabeça numa pedra lá embaixo.

      O garoto loiro para em cima da última pedra, que fica a uns quase três metros de distância até a água.

     — Quer ver uma coisa legal? — ele pergunta, me lançando um sorriso angelical por cima dos ombros, e sem esperar uma resposta minha, ele simplesmente pula como um profissional, se transformando em pleno ar. Os raios de sol refletem nas escamas alaranjadas, deixando-o tão brilhante que é como se ele tivesse luz própria. Eu não tinha visto isso antes porque o pequeno lago lá dentro da floresta era cercado por enormes árvores, e os poucos raios de sol que atravessavam a copa não eram o suficiente.

      Eu olho para a praia onde fica o acampamento, mas ela fica tão longe é praticamente impossível que alguém nos veja aqui.

     — Não é justo! Você fez isso a vida toda! — Explico, enquanto tiro o meu calção e o deixo em cima da enorme pedra.

     — Vai ter que apelar pra essa desculpinha? —  Ele provoca, me fazendo revirar os olhos e soltar um grunhido de desgosto. Olho para baixo e tento tomar coragem de pular, porque olhando daqui de cima, parece mais alto do que realmente é.

      Contando até três silenciosamente, pulo da pedra, sentindo o meu coração praticamente sair pela minha boca.


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O BEIJO DO OCEANO (COMPLETO)Where stories live. Discover now