chapter 51

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O meu coração estava fragilizado, os meus sentimentos confusos. É óbvio que a gente nunca imagina que vai ser traído pelas pessoas que mais nos amam, mas é o que mais acontece. Às vezes, desejava que eu nunca tivesse descoberto isso. Assim, continuávamos vivendo numa mentira, mas felizes, compartilhando pias ao lavar os dentes, vendo filmes no sereno da madrugada, contando experiências engraçadas no ouvido um do outro, sentindo o calor dos suspiros dele no meu pescoço, a sensibilidade das suas cicatrizes.

Era óbvio que ele iria querer outra, eu pensei. Eu já não estava podre de magra, nem tinha um peito simétrico, nem uma cintura fina, ou a energia que tinha antes. Uma modelo de 19 anos com tudo no sítio seria uma escolha melhor, certo? Uma mulher que gosta de se divertir à noite, beber, fumar, consumir, como eu era quando a fama me afetou. Me sentia insuficiente, por ter descartado ele muitas vezes, por não ser tão amorosa como eu deveria ser.

Duas semanas se passaram, e de quase 37 semanas, a mala de maternidade já estava pronta, o quarto estava organizado. Essa era a única coisa que me deixava feliz, saber que dentro de semanas teria a minha filha nos meus braços. Porém quanto mais isso se aproximava, mais eu ficava assustada. No meio disso tudo, Dam não ligou, não apareceu.

O casamento estava ficando próximo, fazendo com que uma pressão não intencional feita pelos meus colegas de trabalho me levasse a rios de esquemas mentais confusos, que acabavam geralmente em desabafos em carvão. Muitos não entendem o significado de peças de alta costura por isso, por só olharem para as cores que combinam, e não para os contrastes de tecidos e volumes, que nas minhas peças, têm significado.

A única parte que não me deixou ao pé de ter um ataque de nervos sobre a cerimônia eram os testes de comida. Eu fui aquele tipo de gestante que amava doces, especialmente bolos, e tudo o que deixasse a minha glicemia estável, por isso, Laura me convidava para ir com ela a ateliers culinários o tempo todo. E dessa vez não foi diferente, e fizemos uma prova de bolos em uma das ruas mais abastadas da cidade. O uniforme era claro: um par de joggers cinzenta com uma camisa branca, uma das únicas roupas onde ainda me sentia confortável, o cabelo amarrado em um coque desarrumado, e olheiras bem visíveis. O bolo era uma escolha de Laura, red velvet. Estava ótimo, é daquelas coisas que ninguém consegue negar comer.

De barriga satisfeita e com uma caixa com alguns donuts, cheguei à entrada do hotel quase embatendo em outro táxi, o que levou a algumas trocas de palavras entre os motoristas. E do outro lado do veículo a porta se abre, e vejo uma figura vestida de terno à minha frente. O Ethan sempre foi o meu querido parceiro para tantas coisas, me salvou a vida diversas vezes, e sempre me recebe em qualquer lugar de braços abertos e palavras sábias, e foi determinante para as minhas decisões futuras, e eu nunca iria conseguir retribuir isso tudo. 

Uns bons minutos de conversa depois, estava de volta ao meu quarto de hotel, um espaço grande, com almofadas azul-oceano, mesas de vidro e um sofá confortável, que poderia acomodar até 3 pessoas. Sentia um vazio tão grande por dentro quando estava sozinha, já não reconhecia a Victoria que nunca precisava de nada nem ninguém para ser feliz, que nunca existiu de verdade, mas vivia eternamente na minha cabeça. Doía aceitar que eu estava sofrendo mas que as minhas lágrimas eram forçadas a passarem despercebidas. 

Tinha entrado no banheiro vestindo o roupão do hotel, que nem completava um nó decente. Estava esperando a água aquecer, até que senti os meus pés molhados. A minha bolsa tinha estourado. Não faça pânico, pensei. Foi apenas uma questão de tempo até essas dores se tornarem tão egulares que eu tinha medo de sair da cama, e liguei a Laura, que ligou ao número de emergência. Em um abrir e fechar de olhos, eu estava em uma maca saindo do estacionamento até a uma ambulância, e tantas imagens cruzaram os meus olhos. Em uma delas, Damiano estava lá, agarrando a minha mão. Eu pedi para eles ligarem, mas ele não atendia.

Laura me acompanhou durante o processo todo, e Ethan estava impedido de entrar no horário da tarde. Naquele dia ela foi o apoio que eu estava mesmo precisando, de mulher para mulher. Ela limpou todas as lágrimas que saíam dos meus olhos, me ajudou a cronometrar as contrações e foi uma ótima companheira de conversa. Em Facetime com o Ethan, ele lhe disse para fazer o Slow Dancing, como ele costumava fazer comigo. E de repente, fechava os olhos e parecia que estava no hospital em Paris de novo, sentindo as mãos dele no meu dorso, a minha cabeça no seu ombro. Era tudo tão igual, eu estava passando isso de novo.

A minha adrenalina subiu, o meu diabetes tava baixo. Esses sintomas têm a ver um com o outro, porque quando a glicose baixa, mais adrenalina é lançada. E as preocupações voltaram de novo: se a bebê estava bem, se eu estava bem, se iriam me cortar de novo.

As horas se passaram. Eram 11 da noite e eu estava em trabalho de parto ativo gritando de dor, e apenas 5 centímetros dilatada. Uma pressão no meu cérvix e abdômen estavam a dar cabo de mim. Minuto por minuto se passava e eu esperava que Dam entrasse pela porta, mas ele não entrou.

Às 3:45 da manhã de uma madrugada fria, o meu bebê arco-íris nasceu com 3 quilos certinhos. Harper Aria de Angelis. Depois de quase 12 horas em trabalho de parto, ela estava ali, nos meus braços. Ela era tão pequena, tão branca, com mãos pequeninas.
Senti que tinha sido mãe pela primeira vez. Que agora sim, tinham me dado a oportunidade de ser feliz. 

Depois de a levarem para um pequeno check-up, as enfermeiras me ajudaram a conseguir meter outra roupa. Vesti um pijama cor de menta de linho, aberto à frente. Harper tinha um igual.
Na manhã seguinte, me ensinaram como dar banho, como amamentar. Não é que eu não soubesse nada disso antes, mas ver isso acontecer não parecia real. Observar a ligação que tínhamos, o seu conforto quando ficava deitada em mim, a minha felicidade a todo o momento era algo inexplicável.
Desde aquele momento que eu soube, que iria ser só eu e ela. E ela e eu. Para sempre.

{Aria (no fundo): Não chore mamma, a gente não tem mais tempo.}

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oi gente!! esse capítulo teve durante meses segurado na minha asa, e confesso que acho que nunca vai ficar perfeito, mas espero que tenham gostado! digam as vossas opiniões.

muito amor, 

mel.

GOLDWINGWhere stories live. Discover now