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Fabrício

Os estampidos da sequência de tiros ressoam em meus ouvidos abafando todos os outros som, enquanto olho vidrado o sangue espalhando pelo chão, não consigo olhar pra mãe, meu coração se recusa a ver ela ferida e não poder fazer nadar

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Os estampidos da sequência de tiros ressoam em meus ouvidos abafando todos os outros som, enquanto olho vidrado o sangue espalhando pelo chão, não consigo olhar pra mãe, meu coração se recusa a ver ela ferida e não poder fazer nadar. Engulo o nó que se formou na goela e não deixa o grito estrangulado sair. O tremor no meu corpo começa nas minhas mãos, trazendo elas da dormência que a posição prolongada impôs, vai se espalhando e quando percebo meu corpo inteiro se transformou em uma massa tremula e inútil.

— Ma-ma-MÃEEEEEEEEEEEE! — O grito finalmente me sai pela boca, alto o suficiente pra romper as camadas que tampavam meus ouvidos.

Forço meus olhos a saírem do sangue no chão e se erguerem para a mulher que meu deu a vida. A cena parece desconexa, mãe ainda olha para tudo confusa, sem saber o que se passa a sua volta, sua camisa de seda rosa manchada por respingos de sangue por tudo que é parte me assusta, porém a fonte do sangramento não é seu peito. Corro os olhos pela sala e por um segundo acredito que minha mente se perdeu, o trauma de ver minha mãe ser assassinada foi tão forte que o juízo parou de funcionar, até que sinto mão tocando meus antebraços e a voz de Romena ressoando entre o caos que meus olhos não conseguem tomar como verdade.

— Fique quieto, menino! — Ela pede.

Olho pra trás por um segundo antes de olhar outra vez pra mãe e depois pra Marcelo caído perto dela, um dos seguranças que veio conosco sobre ele, enquanto espera que Romena me livre das algemas para que possa usar nele. Percebo agora que o sangue vem do infeliz, não de mãe e é o rompimento pro meu caos emocional. Meu corpo inteiro convulsiona e as lágrimas que não deixei rolarem mais cedo se desprendem e não me importo, espero só o momento que estou com as pernas livres das amarras, pra correr até ela, minha cabeça tombando em seu colo, como há muito tempo não me permito, agarro suas pernas e choro todo o medo que sentir de perder ela.

— Prenda esse monte bosta! — Romena diz, entregando as algemas pro segurança que mantem Marcelo preso ao chão, os ferimentos dele foram em pontos estratégicos: próximo ao pulso, que fez ele soltar a arma antes que atirasse, no ombro e na perna, nenhum fatal pelo jeito. — Pronto, Grazi, vamo levar tu pro hospital.

Os braços de mãe caem livres ao lado da cadeira, fico em pé e puxo ela pra um abraço apertado, mas não tenho nenhuma reação da parte dela, a droga que lhe foi injetada ainda está fazendo efeito. Meus olhos vão pra Romena, que tenta segurar a emoção, mas o brilho nos olhos marejados.

— Ela precisa ser levada ao hospital, não sabemos o que eles lhe injetaram, a equipe de emergência deve chegar a qualquer momento — Romena informa.

Balanço a cabeça concordando, sento mãe outra vez na cadeira. Conforme a adrenalina vai se esvaindo do meu peito, minha mente começa a funcionar novamente e lembro dos capangas de Marcelo.

— Onde eles estão? — pergunto, correndo meus olhos pela sala e em direção a cozinha.

— Os marginais desse aí? — Romena aponta Marcelo com um geste de cabeça.

Fabrício- O arrependido (Homens do Sertão- Livro 4)Where stories live. Discover now