Após a despedida de Martin, Zack se permitiu cair na cama novamente, respirando tão profundamente quanto foi capaz. Lúcifer o acompanhou e saltou sobre seu estômago, dando uma volta em torno de si mesmo antes de decidir que era um lugar bastante razoável para dormir. Tentou se irritar com a ousadia, porém acabou sorrindo, e o carinho iluminou parcialmente o semblante cansado de Zack enquanto o observava.
Tinha-o encontrado, ou talvez fosse mais honesto dizer que tinha sido encontrado por ele durante uma de suas escavações, há alguns meses. A pequena criatura apareceu no meio de suas ferramentas numa manhã, enquanto montava acampamento com seus colegas, e ninguém parecia saber de onde havia saído. Zack tentou encontrar sua mãe, mas não havia sinal dela, e, como o gatinho não deixava de correr entre suas pernas, não viu alternativa senão levá-lo consigo. E ali estavam eles.
O nome havia sido uma cortesia de Marilyn, sua amiga mais próxima. Segundo ela, Lúcifer poderia ser considerado um anjo e um demônio ao mesmo tempo, uma criatura cativante que caiu do céu por causa de sua rebeldia. Não era necessário ser adepto de nenhuma prática religiosa para conhecer a história, mas a despeito do quanto pudesse soar controverso, gostava de seu significado: estrela da manhã.
— Você sempre consegue o que quer, não é? — murmurou, aceitando a posição mais ou menos confortável, que lhe dava um acesso fácil ao topo da cabeça peluda.
Acariciá-lo com os dedos nunca falhava em ser extremamente satisfatório. De certa forma, ajudava a amenizar o desconforto causado pelo súbito silêncio em seu quarto. Sozinho, pôde finalmente suspirar e esfregar o lugar dolorido em seu peito. Não podia se lembrar tão claramente do sonho que havia tido antes, mas o sentimento da perda continuou ali por um tempo, acompanhado de uma antiga frustração.
Era como se nunca fosse longe o bastante, por mais próximo que estivesse de seus objetivos. Fosse alcançar seu pai em seus sonhos, fosse provar que suas teorias estavam corretas. Não podia culpar Martin por não compreendê-lo, mas uma parte de si desejava ardentemente que ele o fizesse. O que o levava a perguntar: Gostava tanto assim dele, ou estava apenas procurando por aprovação? A resposta não parecia tão clara quanto deveria ser.
Se pelo menos Marilyn estivesse ali, poderia ter uma segunda opinião sobre o assunto, mas agora...
― Parece que somos apenas eu e você, amigo. ― Murmurou, voltando sua atenção para o bolo sob suas mãos. ― O que esteve aprontando enquanto eu estava fora?
Lúcifer possuía o péssimo hábito de caçar qualquer coisa viva que tivesse a metade de seu tamanho, somente para abandonar seus corpos nos lugares mais inusitados, como um sinal de que estava feliz. Naquele momento, a resposta foi um indiferente lamber de patas. Em seguida ele saltou para longe, cansando-se rapidamente daquela demonstração de afeto.
― Se não o conhecesse tão bem diria que você ficou ressentido.
Sem demonstrar um mínimo interesse, Lúcifer saltou sobre a única cadeira do quarto, fazendo um bolo ao redor de si mesmo, e não lhe dedicou maiores atenções.
ČTEŠ
O Príncipe Bastardo
FantasyLIVRO VENCEDOR DO WATTYS 2016, NA CATEGORIA DE INOVAÇÃO Criado sob a lei da espada e da pureza do sangue, o bastardo Desmond jamais soube o que era pertencer a um lugar, muito menos a uma família. Condenado a um sono sem sonhos, o meio vampiro não e...