Conocerás tus sueños

By vic_timism

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Depois de tudo que enfrentaram para ficar juntas, Juliana e Valentina tentam levar a vida navegando por águas... More

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Dois
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Quatro - Parte I
Quatro - Parte II
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Catorze - Parte I
Catorze - Parte II
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Dezoito - Parte I
Dezoito - Parte II
Dezenove
Vinte
Vinte e um
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Vinte e três - Parte I
Vinte e três - Parte II (+18)
Vinte e três - Parte III
Vinte e quatro
Vinte e cinco - Parte I
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Vinte e seis

Dezessete

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By vic_timism


O céu que emoldurava o fim de tarde tinha um tom de laranja incandescente e explosivo. Coincidentemente, aquela cor transmitia as mesmas sensações inflamadas que tomavam conta da torre do sino da capela de Santa Helena, na propriedade dos Vega.

Como faziam todos os dias desde seu primeiro beijo, Isabel e Daniela ultrapassavam novos limites, guiadas pelas vontades de seus instintos. No chão da parte mais alta da igreja, Bel estava sentada sobre o colo de Dani, com as pernas abertas enlaçando a cintura da garota por quem estava apaixonada. A posição fazia com que seus corpos ficassem colados, próximos demais, a apenas suas roupas de distância. A morena, por sua vez, permitia que suas mãos escorregassem por baixo do vestido da mulher que estava à sua frente e deslizassem por toda a extensão de suas coxas, distribuindo apertões sem sobreaviso vez ou outra e deixando uma trilha de arrepios.

As duas se beijavam avidamente, como se suas vidas dependessem disso. Suas línguas colidiam e exploravam todos os espaços que podiam. Quando os pulmões pediam por ar, seus lábios se afastavam e escorregavam pelas curvas de seus pescoços e lóbulos das orelhas, apenas para se reencontrarem novamente ao fim do trajeto.

Sem quebrar o contato entre suas bocas, Isabel começou a rebolar devagar, obedecendo à cada parte de seu corpo que implorava para sentir mais. Daniela a segurou com firmeza pela cintura, ditando o ritmo e a intensidade dos movimentos. Era evidente que cada centímetro delas implorava e suplicava uma pela outra. Queriam ser tocadas e reviradas do avesso com uma proximidade que crescesse até se tornar infinita, como se pudessem se fundir e explodir na sensação entorpecente do ápice pela qual tanto ansiavam. O desespero que sentiam para chegar ao ponto mais alto de tudo aquilo que atravessava seus corpos parecia ser capaz de enlouquecê-las, parar o tempo e implodir o mundo.

No entanto, como sempre, antes que pudessem concretizar o que tanto queriam, o peito de Isabel foi tomado por uma ansiedade nebulosa e pesada como chumbo. Era o desconforto da culpa, mas também do medo. Sabia que quando finalmente se entregasse para Daniela de todas as formas possíveis, a vida seria alterada de forma irreparável. Não haveria retorno — jamais conseguiria voltar para a trivialidade vazia que preencheu seus dias desde o início de sua existência. Quando se permitisse a ousadia da liberdade, não poderia mais ser apenas a esposa e a filha de alguém. Nesse momento, ressuscitaria como o ser humano que toda a mulher nasceu para ser.

Para além da importância simbólica de jogar a razão para o alto e fazer com Daniela tudo aquilo que sua imaginação sussurrava em seus ouvidos, é claro que também havia o fator insegurança.

Seu interesse por medicina e anatomia fez com que sempre fosse mais consciente sobre sexo do que outras garotas da sua idade — até mesmo Sofía, que sempre teve uma visão mais curiosa e progressista sobre o assunto. O conhecimento fez com que entendesse o contato entre um homem e uma mulher como algo puramente biológico, e as convenções sociais a ensinaram que qualquer interação sexual era apenas sua obrigação enquanto esposa. Por isso, transar se tornou um ato mecânico e desinteressante, um mero inconveniente a que tinha que se submeter em prol de seu casamento. Nunca sentiu qualquer desejo por Pedro, e sobrevivia aos longos minutos em que ele a procurava usando uma espécie de dissociação automática. Ela apenas olhava para o teto, existindo sem existir, esperando até que ele terminasse. Era assim para Sofía, quando seu marido estava vivo. Provavelmente foi assim para suas mães, e também para suas avós, e para cada uma das que vieram antes delas. E, ela sabia, era pior ainda para mulheres com outras cores de pele, etnias e classes sociais, que tinham ainda menos poder de escolha sobre seus próprios corpos. Pensava que a vida só era assim e não havia nada a fazer.

Nada no mundo a preparou para a força irrefreável da atração física e o poder de estar no comando de suas próprias vontades. E, principalmente, nada no mundo a preparou para vivenciar tudo isso com outra mulher.

A verdade é que embora suas mãos tivessem palpites instintivos sobre o que fazer, ainda não entendia muito bem como. Nunca tinha ouvido falar sobre duas mulheres transando, e estava apavorada com a ideia de fazer algo terrivelmente errado. Sabia, sem muitos detalhes, que Daniela já tinha se relacionado com outras garotas, o que explicava sua segurança e tranquilidade em cada investida. Isso só aumentava a insegurança de Isabel. Afinal, Dani tinha experiências com as quais poderia fazer comparações. Seria fácil para ela perceber se fosse horrível.

Em meio a todos aqueles questionamentos, Bel levou as duas mãos ao rosto de Daniela e diminuiu o ritmo do beijo, transformando o contato em algo calmo e carinhoso. A soldadera entendeu o recado e tirou suas mãos dos quadris de Isabel, passando a acariciar suas costas delicadamente.

Aquilo só fazia com que a herdeira de Francisco Carvajal se encantasse mais por sua revolucionária. Dani sabia que bastava um pouco de insistência e algumas palavras sussurradas ao pé do ouvido para que Isabel cedesse. Mesmo assim, nunca seguia por esse caminho. Sempre respeitava o limite atingido, sem nenhum tipo de cobrança ou reclamação.

Quando se vive num mundo em que ninguém escuta sua voz, qualquer traço mínimo de respeito é um milagre.

Assim que as duas afastaram seus rostos e se encararam, Daniela sentiu algo dentro dela desabafar. Isabel estava particularmente linda, com os lábios inchados e os cabelos bagunçados caindo sobre um lado do rosto. A luz do pôr-do-sol casava perfeitamente com seus olhos, que estavam escuros e desafiadores naquela tarde. A iluminação externa e a felicidade interna reluziam em sua pele de uma maneira sem precedentes.

Por um minuto, Daniela quis beijá-la, protegê-la e pedi-la em casamento, tudo ao mesmo tempo. Foi ali, naquele fragmento de tempo e espaço, que soube que a amaria para sempre, enquanto sua alma existisse.

— Está chegando a hora do meu toque de recolher. — informou Isabel, encostando sua testa na testa de Dani. Como sempre, precisava estar em casa antes que Pedro chegasse.

— Essa é a pior hora do meu dia. — disse Daniela, acariciando o rosto da garota que continuava em seu colo.

— Às vezes é difícil de acreditar que eu odeio a hora de ir embora de uma igreja velha, abandonada e supostamente assombrada. — comentou Isabel, sorrindo e aninhando sua cabeça no pescoço de Daniela ao fim da frase.

A morena acariciou os cabelos dourados com paciência e cuidado.

— Bel, falando em ir embora... — ensaiou Daniela — Precisamos conversar.

Isabel sentiu seu coração errar a batida por um instante. Então, afastou sua cabeça para fitar os olhos castanhos que tanto adorava.

— Você salvou minha vida, e eu sou muito grata por todo esse período em que você cuidou de mim. — começou Daniela — Mas essa sempre foi uma situação provisória, e eu... bem, eu estou melhorando.

Era verdade. A recuperação do local atingido pelo tiro foi impressionante. Apesar da jovem ainda sentir muitas dores na região, o ferimento em si estava praticamente cicatrizado. Ela também conseguia se alimentar e andar por conta própria.

E beijar, é claro.

— Não posso ficar para sempre no território do inimigo, e a Revolução precisa de mim. — prosseguiu Daniela — É tempo de partir.

Isabel a encarou por alguns segundos, sem conseguir formular nenhuma palavra. Estava digerindo o inevitável. Sabia que esse momento chegaria, mas evitava pensar nele.

— Mas você disse que é praticamente impossível encontrar o acampamento dos guerrilheiros. — argumentou a loira — Você ainda não está totalmente recuperada. Como vai ficar vagando por aí, sem rumo, procurando o restante do seu grupo?

— Vai dar trabalho. Terei que perguntar para algumas pessoas, seguir pistas, investigar o rastro do meu pessoal...— enumerou Daniela, dando de ombros em seguida — Mas é algo que precisa ser feito. Não posso ficar aqui para sempre, e a luta pelos direitos do nosso povo é minha vida.

Isabel sentiu o ar faltar e seu corpo perder o referencial do chão. Antes que pudesse se dar conta, seus olhos já estavam marejados.

— Você está se despedindo de mim? — perguntou, sem disfarçar o quão machucada estava.

— Não, Bel. — disse Daniela, segurando o rosto de Isabel com as duas mãos e enxugando suas lágrimas com os polegares — É o contrário disso. Quero que você venha comigo.

— Ir com você? — questionou Isabel, sentindo todos os órgãos do seu corpo darem um solavanco simultâneo — Como assim?

— Vivi o suficiente para saber que o que temos é único, Bel. Único. Nós fomos presenteadas com o tipo de sentimento pelo qual as pessoas matam, morrem, enlouquecem e buscam a vida inteira. — disse Daniela, com a voz embargada — É por conta de forças como essa que existe entre nós que as pessoas continuam acordando todas as manhãs, mesmo quando as coisas estão difíceis. É por isso que milagres acontecem e soldados sobrevivem às guerras. O mundo gira por causa de nós, Isabel. Por conta de histórias como a nossa. E eu não estou disposta a deixar isso para trás. Pago o preço que tiver que pagar.

À essa altura, Isabel estava chorando incontrolavelmente. Ela agarrou uma das mãos de Daniela e distribuiu beijos em toda sua extensão.

— Fuja comigo. Vamos embora daqui. — propôs Daniela, fazendo um grande esforço para segurar as lágrimas — Eu amo você.

— Eu amo você. — respondeu Isabel, atirando seus braços em torno do pescoço da soldadera, que a envolveu em um abraço.

As duas permaneceram assim, imersas num mundo particular em profundo silêncio. Como um eclipse, se sobrepunham uma à outra a ponto de parecerem uma só, formando o fenômeno mais bonito e improvável que tinham presenciado até então.

— Tenho muito medo do que pode acontecer se nós fugirmos. — sussurrou Isabel, de repente.

— Eu sei. E é normal que tenha. — assegurou Daniela — Não precisa me responder agora, está bem? Vá para casa e pense. Conversaremos quando você estiver pronta para decidir.

Isabel a encarou como quem observa uma obra de arte. Então, a puxou para um beijo apaixonado.

Em seu coração, soube que a decisão estava tomada muito antes da proposta ser feita.

-

Naquela noite, Isabel não conseguiu dormir. Ficou sentada em seu lado da cama, observando a escuridão da madrugada. A ansiedade e a empolgação tomavam conta de seu coração em proporções idênticas. Sabia o que queria, mas não como reuniria coragem para seguir naquela direção.

Quando a manhã chegou, foi tomada por enjoos terríveis e vomitou várias vezes. Podia sentir a azia comprimindo seu esôfago e escalando sua garganta em um desconforto horrível. A situação se agravou quando Pedro saiu para cuidar de seus afazeres, e a solidão fez com que a aflição de suas dúvidas tomasse conta do quarto inteiro, até se tornar insuportável.

Sem aguentar mais um único segundo sem compartilhar sua angústia com alguém, Isabel saiu em disparada pelos corredores do casarão e foi até o quarto de Sofía. Distraída com seus próprios dramas, sequer bateu na porta, apenas a empurrou. Era a primeira vez no último mês que estava destrancada.

Então, parou repentinamente no batente da porta, estarrecida.

Marena estava em pé ao lado da cama, se vestindo. Seus cabelos escuros ainda estavam bagunçados. Tinha acabado de começar a abotoar um belo vestido azul marinho de mangas compridas, que a cobria até o pescoço. Deitada em meio aos lençóis, Sofía dormia, alheia à movimentação e completamente nua.

Isabel permaneceu congelada, completamente em choque. É claro que já tinha estranhado a dinâmica entre sua irmã mais velha e sua melhor amiga, mas nunca imaginou que estivessem juntas daquela forma.

Marena, por sua vez, parecia inabalada. A primogênita da família Carvajal apenas se limitou a colocar o indicador sobre os lábios, pedindo silêncio, e inclinou a cabeça na direção de Sofía. Não queria acordá-la. Em seguida, se aproximou da caçula em passos lentos.

— Preciso terminar de me arrumar. Me encontre na biblioteca em dez minutos e conversamos. É o único lugar em que os empregados não irão ouvir. — sussurrou Marena, um segundo antes de empurrar Isabel gentilmente para fora do cômodo e fechar a porta.

-

Quando Marena entrou na biblioteca e fechou a pesada porta de madeira atrás de si, encontrou uma Isabel inerte, afundada em uma das poltronas de camurça azul que contrastavam com o papel de parede vermelho escuro. Olhava para o nada, tentando processar tudo o que tinha acontecido nas últimas 13 horas.

— Desde quando? — perguntou Isabel, sem rodeios, levantando os olhos na direção de sua irmã. Não estava brava, apenas chocada e um pouco aliviada por não ser a única.

— Desde quando Sofía ou desde quando mulheres? — devolveu Marena.

— Os dois. — respondeu Isabel — Eu quero saber tudo.

Marena assentiu. Era justo. Tranquilamente, sentou em uma poltrona em frente à Isabel.

— Você se lembra do meu casamento, Isabel? De como eu conheci James? — perguntou Marena.

Isabel pensou brevemente antes de responder.

— Eu era criança. Lembro de poucos detalhes. — confessou — Me recordo da festa em si, e que vocês se conheceram na quinceañera da filha de uns amigos do papai. Mas só isso.

— Você está correta. Eu e James nos conhecemos num baile de debutante. A aniversariante era filha de um maldito general que era um porre. Família chata, festa horrível. — relembrou Marena — James era primo da garota que estava completando quinze anos. Filho de mãe mexicana, mas nasceu e foi criado nos Estados Unidos. Também estava achando os parentes dele insuportáveis. Começamos a conversar, nos demos bem, e logo parecia que nos conhecíamos desde sempre. Foi uma conexão instantânea.

Marena sorriu, como se a memória a inspirasse sentimentos bons.

— O que ninguém sabe, Isabel, é que nossa afinidade só floresceu porque enxergamos o segredo um do outro. — prosseguiu ela — James sabia que gostava de garotos desde os 13 anos. E eu... bem, eu tinha passado a minha vida inteira até ali me ajoelhando todas as noites e pedindo para que Deus matasse todas as borboletas que levantavam voo no meu estômago sempre que eu via uma menina bonita. Eu pedia a todos os santos que me mudassem, punissem ou matassem de uma vez. Foi muito sofrido. Apesar de tudo isso, eu só me interessava mais por mulheres a cada dia.

Os olhares de ambas se encontraram, e Isabel desviou rapidamente. Tinha medo que seus olhos transbordassem tudo o que escondia.

— Todos acharam que eu e James estávamos nos apaixonando. A verdade é que apenas nos tornamos melhores amigos e confidentes um do outro. Finalmente encontramos alguém que nos entendia. — seguiu Marena, deixando um sorriso escapar — Então, algumas semanas antes de voltar aos Estados Unidos, ele propôs que nos casássemos. A família dele estava desconfiada porque ele nunca demonstrava interesse por garotas, e a nossa me enchia a paciência diariamente para encontrar um marido. Ninguém suspeitaria de nossas verdadeiras sexualidades se estivéssemos juntos. O casamento era nosso passaporte para a liberdade.

— Então vocês nunca tiveram nada um com o outro? — questionou Isabel, genuinamente surpresa.

— A única vez que nos beijamos em dez anos foi quando o padre mandou, em nossa festa de casamento. — informou Marena, soltando uma gargalhada em seguida — Passamos nossa noite de núpcias jogando baralho e bebendo vinho argentino.

— Mamãe sempre dizia que era bonito ver vocês juntos, porque pareciam feitos um para o outro. — insistiu Isabel.

— E nós fomos. Amigos também podem ser almas gêmeas, e não tenho dúvidas de que James foi a minha. — respondeu Marena — Ele era meu melhor amigo, bastava que trocássemos um olhar para que ele entendesse tudo que eu queria dizer e não podia.

— Por que fala como se ele não fosse mais seu melhor amigo? — perguntou a irmã mais nova.

Marena suspirou.

— Nos mudamos para Nova Orleans, e nossa vida era perfeita. — continuou ela — Íamos a festas quase todos os dias da semana. Recebíamos amigos para jantar, amanhecíamos bebendo com escritores, artistas e pessoas fantásticas. Tivemos incontáveis relacionamentos e amantes, protegidos pela segurança de nosso casamento de fachada. E o melhor é que, ao fim de cada aventura, sabíamos que podíamos voltar para os braços e para a amizade incondicional um do outro.

— Mas você voltou para casa dizendo que ele tinha te trocado por outra mulher. — lembrou Isabel, se inclinando e agarrando a mão de sua irmã em um gesto de apoio — O que realmente aconteceu?

— Um jovem poeta de Nova York aconteceu. Mais novo que você, praticamente um menino. — respondeu Marena, com um tom de escárnio e rancor inconfundível — James ficou maluco por ele, e disse que queria viver aquele romance plenamente, sem mais mentiras. Então, pediu para acabar com nosso casamento de fachada.

Os olhos de Marena se encheram de lágrimas, e Isabel se assustou. Nunca tinha visto sua irmã chorando.

— Eu não entendia por que ele estava fazendo isso comigo. James sabia que o fim do casamento seria o fim da minha liberdade. Eu sou mulher, mexicana e gosto de outras mulheres. Quanto tempo acha que eu sobreviveria nos Estados Unidos sem um homem americano para acobertar a vida que eu realmente queria viver? — continuou Marena — Sempre tivemos relacionamentos, e o casamento nunca foi um empecilho. Eu estava disposta a mudar para Nova York, a permitir que o maldito poeta morasse conosco... qualquer coisa. Implorei que ele não me obrigasse a voltar para uma existência de clandestinidade. Supliquei pela nossa amizade. No fim, James só disse que eu entenderia e o perdoaria quando vivesse uma paixão avassaladora.

Isabel sentiu o coração encolher, sobretudo porque, enquanto mulher avassaladoramente apaixonada, entendia o que James queria dizer.

— Não sei se ele estava certo, porque... estou apaixonada por Sofía, Isabel, e mesmo assim, tenho certeza que jamais abandonaria meu melhor amigo por ela. — disse Marena, com a voz embargada.

— Como isso... você e Sofía... como isso aconteceu? — perguntou Isabel, por fim.

Pensando com mais calma, não podia dizer que estava exatamente surpresa. Sua amiga e cunhada sempre teceu comentários sobre como seria incrível se apaixonar por outras mulheres, enquanto ressaltava que achava homens enfadonhos. Por Deus, Sofía já tinha até sinalizado que achava Marena interessante. Não era difícil presumir como aconteceu, no fim das contas.

— Ela estava intrigada, e eu também. Foi rápido e intenso. — respondeu Marena, abrindo um sorriso gigantesco.

— Você não tem medo? — perguntou Isabel, de repente, permitindo que suas dúvidas se misturassem ao momento que viviam.

Marena ponderou antes de responder.

— O amor é assustador como todas as coisas absurdas são, Isabel. Principalmente quando o mundo está contra você. Mas a vida é pequena e veloz, e eu jamais permitiria que ela passasse correndo por mim sem ao menos experimentar o que sei que me fará feliz. As coisas se transformam, e sei que um dia seremos livres para nos relacionar com quem bem entendermos. Porém, tenho certeza que não estarei mais aqui quando isso acontecer, e quero ser parte da trajetória para chegarmos até lá. Gosto de política porque ela não é apenas o que homens brancos fazem em salas de reunião. A política é o que vivemos, o que somos, como nos expressamos, como sobrevivemos, e, principalmente, como tudo isso contribui para construir a sociedade em que acreditamos. E a minha contribuição é essa: viver o que sinto por Sofía sem amarras.

Pela segunda vez em poucas horas, Isabel estava chorando copiosamente. Marena, então, protegeu a mão de sua irmã entre as suas.

— Pela intensidade dessas lágrimas, posso ver que você não está chorando só por mim. Sei que você também tem seus segredos, Isabel, embora não saiba quais. Meu conselho para você é que os escute. Geralmente, nossas dúvidas já são uma resposta.

-

Na cozinha da casa dos Vega, Isabel bebia o que talvez fosse sua décima xícara de chá do dia. Marena tinha pedido para conversar com Sofía e comunicar que Bel já sabia de tudo antes das duas amigas falarem sobre a situação. Quase uma hora tinha se passado desde então, e a jovem dona da casa já estava pensando que iria sucumbir e morrer de ansiedade.

E teve certeza disso quando Marena entrou no cômodo.

— Ela quer conversar com você agora. — comunicou simplesmente.

-

Isabel nunca saberia explicar o que aconteceu dentro dela naquela manhã. Sentia-se ansiosa e anestesiada simultaneamente. Queria falar tudo, e ao mesmo tempo, seu cérebro parecia incapaz de formular qualquer palavra.

No entanto, no momento em que entrou como um furacão no quarto de Sofía, soube exatamente o que precisava dizer.

— Isabel, eu... — começou uma Sofía visivelmente constrangida, assim que olhou para sua melhor amiga.

— Ela é uma mulher! — exclamou Isabel, em franco desespero.

— Sim... eu sei. — respondeu Sofía, confusa — Pode ser um pouco chocante eu ter me interessado por uma garota, mas...

— Não, Sofía. — interrompeu Isabel — Daniela. Daniel. Daniela.

Sofía precisou de cinco segundos para compreender e abrir a boca, em uma expressão chocada.

— Estou apaixonada por Daniela, e ela quer que eu vá embora com ela. — despejou Isabel — Não sei o que fazer. Preciso da sua ajuda.

-

Nota da autora:

Oi, pessoal! Estamos no último fim de semana do #PrideMonth, ontem foi Dia Internacional do Orgulho LGBTI+ e hoje tem Barbarena na Parada do México! Por isso, decidi dar uma pausa no sofrimento e criar um capítulo "especial" focado em nossos amores, vivências e anseios.

Que tenhamos cada vez mais segurança, liberdade e suporte para sermos quem somos. Tenho muito orgulho da minha sexualidade e de cada uma e cada um de vocês, que enfrentam o mundo diariamente para construírem uma sociedade mais colorida, igualitária e acolhedora com suas respectivas identidades (sim, mesmo se estiverem no armário).

Nossa existência é revolucionária, e espero que vocês não esqueçam disso, mesmo nos dias mais difíceis.

Obrigada por lerem mais um capítulo , por existirem e por resistirem!

Beijos,

Vic.


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