Doze

2K 140 141
                                    

Sentada no chão enlameado da gruta, Isabel abraçou os próprios joelhos e observou Daniela à distância. Mesmo pálida por conta da perda de sangue, sua paciente dormia como um anjo. Seu peito subia e descia devagar, em uma paz profunda e contagiante que nada remetia às últimas horas de horror e angústia que ambas compartilharam.

Enquanto estudava cada centímetro do rosto da soldadera, Isabel ouvia sua própria voz ecoar e ricochetear dentro de sua cabeça, gritando a conclusão que custava a processar.

Uma mulher.

Uma mulher.

Uma mulher.

A verdade era espantosa e fascinante na mesma medida. Desde o início da Revolução, ouvia falar em Daniel Hernández e seu comprometimento com a construção de um México mais igualitário, que se desdobrava em discursos políticos enfáticos e no tratamento impiedoso que destinava a quem explorava e subjugava os trabalhadores.

A possibilidade de que uma garota pudesse inflamar tanta paixão e raiva entre os dois lados do conflito armado nunca tinha passado pela cabeça de Isabel. Sua irmã, Marena, tinha dificuldade para concluir frases sem ser interrompida quando tentava discutir assuntos sérios, que dirá para pegar em armas e tentar transformar a realidade do mundo em que viviam.

Tinha perguntas infinitas, que poderiam durar o resto da vida. Mas para obter respostas, precisaria esperar Daniela acordar.

-

Isabel estava mergulhada em uma larga tina oval de madeira clara em um dos banheiros de sua casa, com água quente e espuma cobrindo seus ombros. Sofía esfregava as costas de sua melhor amiga com uma força que oscilava entre a raiva e a dedicação.

— Você não precisava me ajudar com o banho se está brava. — comentou Isabel, com a voz baixa e resignada.

— Claro que precisava. Qualquer uma das empregadas teria corrido para contar ao Pedro que você estava toda machucada, ensanguentada e cheia de lama. — resmungou Sofía — E não estou brava com você, estou brava com o seu silêncio.

— Se eu te contar algum detalhe dessa história, estou te colocando em risco. — sussurrou Isabel, com o olhar fixo na parede. — É mais seguro se você não souber nada. 

— Você não está me protegendo, está protegendo o seu namorado. — objetou Sofía.

Isabel virou para Sofía em um movimento brusco e fez uma concha com as mãos, lançando água no rosto de sua amiga e cunhada.

— Não fale isso nem brincando! — ralhou Isabel, embora disfarçasse um sorriso.

Sofía colocou as mãos na cintura, como se estivesse ofendida com as gotas de água lançadas contra ela. A expressão divertida em seu rosto, no entanto, não daria conta de enganar ninguém.

— Admita que você está adorando viver em um daqueles romances europeus água com açúcar que sempre criticou, Isabel.

— Não estou vivendo romance nenhum. — retrucou Isabel — Eu mal a... o... conheço.

— Sim, e olhe em quanta encrenca já se meteu por causa dele nas últimas vinte horas. — provocou Sofía.

— Pare com Isso. Eu sou casada com seu irmão.

Sofía deu de ombros.

— E daí? Seus pais escolheram o Pedro, não você. Isso não significa nada.

— Você está projetando em mim a sua vontade de viver um romance insano e proibido como se estivéssemos em uma maldita peça de Shakespeare. — acusou Isabel, afundando na tina até o queixo e deslizando o corpo até lançar suas pernas para fora da água.

Conocerás tus sueñosOnde as histórias ganham vida. Descobre agora