Quinze

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As portas duplas que separavam a rua e a portaria do prédio eram pesadas, com suas vidraças grossas e grades ornamentadas de ferro. Juliana estava tão imersa em sua preocupação com Valentina que sequer sentiu a dor do esforço em seus braços quando as empurrou com as duas mãos.

O edifício em que viviam foi construído em um estilo clássico e refinado, que estava impresso em suas paredes de granito amarelo e colunas grossas de mármore, bem como nas janelas largas e nas portas arredondadas.

A portaria era precedida por um luxuoso hall de entrada circular, com piso de concreto polido, um lustre quadrado de cristal e poltronas de linho sintético. A porteira do turno da madrugada estava sentada atrás de uma bancada de madeira clara, devidamente uniformizada com uma camisa de botão e jaqueta cinza. A mulher, que não aparentava mais de quarenta anos, estava debruçada sobre uma revista de palavras cruzadas. Seu cabelo cacheado caía sobre seu rosto comprido.

— Boa noite. — cumprimentou Juliana, lançando um olhar para o enorme relógio de ponteiros da portaria. Era quase uma da manhã. Ainda precisava preparar uma mochila, comer alguma coisa e voltar para o hospital, onde Valentina estava internada.

A estilista apertou o botão prateado do elevador, que se iluminou em um tom berrante de vermelho. Enquanto esperava, lembrou das palavras que Camilo tinha lançado sobre ela cerca de 40 minutos antes. "As visões começaram quando vocês se mudaram para o apartamento. Você já pensou que pode ter alguma relação?".

Juliana espiou a porteira por cima do ombro. A mulher rabiscava sua revista de palavras cruzadas com uma concentração frágil, como se estivesse absorta no passatempo e no mundo ao seu redor ao mesmo tempo.

— Com licença. — chamou Juliana, se aproximando com passos receosos — Oi. Desculpe atrapalhar. Mudei para o prédio há pouco tempo e acho que ainda não fomos apresentadas. Eu sou...

— Juliana Valdés. — completou a mulher, largando as palavras cruzadas e abrindo um sorriso divertido — Prazer. Me chamo Dolores.

— Bem... uau. Você já sabe meu nome. — constatou Juliana, surpresa e sem graça.

— Você é famosa na minha casa, garota. — informou Dolores — Minha filha, Catalina, é sua fã número 1. Ela termina a escola no fim do ano e quer estudar Design de Moda, sabe? É um curso caro, vivo lembrando que não teremos como pagar, mas a menina enche a boca para dizer que sua história dá esperança para ela. O que posso fazer? Sonhar ainda é de graça.

— Puxa, eu... acho que fico feliz em ser uma inspiração. — respondeu Juliana, envergonhada — Posso me sentar aqui?

— Claro. — disse Dolores, empurrando uma cadeira preta com rodinhas que estava vazia ao seu lado, idêntica a que estava sentada — Quer chá? Camomila.

— Obrigada. — respondeu Juliana, balançando a cabeça afirmativamente — Então, faz tempo que você trabalha aqui?

— Quase vinte anos. — disse Dolores, enchendo um copo plástico com chá e estendendo para Juliana — Era mais nova que você quando comecei.

— Você deve ter muita história para contar. — lançou Juliana, soprando seu chá — O prédio é antigo, deve ter um passado incrível.

— Pelo que sei, a construção passou anos inacabada e caindo aos pedaços até ser comprada e concluída por uma mulher na década de 50. — contou Dolores — Depois que ela faleceu, o único filho dela herdou o edifício. Então, sim, é bem antigo. Por isso os apartamentos são tão grandes. Nos prédios mais novos, tudo parece uma lata de sardinha!

Conocerás tus sueñosWhere stories live. Discover now