Vinte

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O Nissan Versa preto de Mateo estava parado na longa fila do drive-thru, no fast food preferido de Clara. Apesar dos protestos de Valentina — e de Chivis, é claro — a garotinha era obcecada pelas batatas fritas compridas e molengas, que sempre ganhava após os longos e exaustivos dias em que via sua mãe através de vidraças duplas no presídio de segurança máxima.

Naquela tarde, contudo, Val não estava preocupada com os hábitos alimentares de sua sobrinha. Sua cabeça estava em vários lugares ao mesmo tempo, e nenhum deles se localizava no presente.

— Tem certeza que a Clara pode dormir na casa de vocês hoje? — perguntou Mateo, cautelosamente.

O ex-marido de Eva era educado e empático demais para perguntar qualquer coisa sobre o clima no apartamento de Juliana e Valentina diretamente. No entanto, era presidente de um grupo de comunicação e não vivia embaixo de uma pedra. É claro que tinha visto as fofocas sobre Fernanda Franco que fervilhavam na internet.

Assim como todo o resto do país.

— Claro, eu é que estou insistindo para que ela vá. — respondeu Valentina, no banco do carona — Fique tranquilo e vá ver sua namorada.

Mateo sorriu, envergonhado e levemente radiante com a lembrança de seu novo relacionamento. Alejandra era a apresentadora de um programa matinal de gastronomia com quem o diretor do Grupo Carvajal estava saindo há algumas semanas. Finalmente tinham oficializado a relação e Clara adorava a madrasta — em parte porque associava os cabelos ruivos com a Hera Venenosa, sua anti heroína preferida, mas ainda assim adorava.

— Certo. Obrigado. — disse ele, sem conseguir conter o sorriso, enquanto movia o carro dois centímetros a frente acompanhando o fluxo da fila — Me liguem se precisarem de algo, ok?

Valentina brincou com as pontas dos fios do próprio cabelo, ensaiando o que diria a seguir.

— Na verdade, estou precisando de algo agora. — respondeu ela — Você é jornalista, então é a melhor pessoa que conheço para me tirar uma dúvida.

— Você também é um pouco jornalista. — lembrou Mateo.

— Ter feito metade de uma faculdade não me dá o talento para a coisa. — retrucou Valentina, sorrindo amigavelmente — Como faço para descobrir quem foi o primeiro dono de um edifício? Do prédio em que eu e Juliana moramos, especificamente. Sei que o dono atual herdou a propriedade, e precisamos saber de quem.

— Vocês não podem apenas perguntar para ele? — estranhou Mateo, emparelhando o carro à janela por onde os atendentes da lanchonete entregavam os pedidos.

— Fora de cogitação. — respondeu Valentina, lançando um beijo para a sobrinha pelo espelho retrovisor. Presa a uma cadeirinha cor-de-rosa no banco de trás, a menina sorriu timidamente com o gesto de atenção.

— Nesse caso, fica um pouco complicado. Vocês precisariam ao menos do número de matrícula da escritura do imóvel. — avaliou Mateo, pensativo — Eu tenho algumas fontes em cartórios e na secretaria de desarrollo urbano y vivienda. Posso tentar descobrir algo. Por que vocês precisam dessa informação?

— Problemas com a empresa que administra o prédio. — mentiu Valentina. Não pretendia envolver ninguém de sua família na investigação sobre Jorge García. A ideia de compartilhar sua experiência com as regressões não a deixava exatamente animada. Iria descobrir de uma vez por todas qual era a relação entre seu apartamento e Isabel.

— Pedido 43! — chamou a atendente, estendendo uma sacola de papel pardo pela janela do fast food.

— É o nosso! Obrigada! — agradeceu Valentina, colocando as mãos para fora do carro e apanhando o pacote — Quanto tempo acha que demoraria para descobrir algo, Mateo?

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