Vinte e um

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Assim que Sofía e Marena pisaram na propriedade dos Vega, se surpreenderam com o alvoroço que encontraram. Pedro estava completamente bêbado, incitando uma gritaria entre os convidados de sua festa de cinco de maio.

— Eu vou ser pai! Finalmente vou ser pai! — comemorou ele, enquanto tirava um revólver da cintura e disparava três tiros para o alto.

— Bem... parece que o médico já espalhou as boas novas. — ironizou Marena.

— Onde será que ela está? — perguntou Sofía, ficando na ponta dos pés e procurando por Isabel entre a multidão.

— Eu a deixei no quarto antes de sair para encontrar vocês. — informou Marena, lançando um olhar de desprezo para Pedro, que, naquele momento, promovia um brinde com vários fazendeiros da região.

— Certo. Preciso vê-la. — disse Sofía, olhando para os lados e depositando um beijo rápido na bochecha da morena quando teve certeza que ninguém estava prestando atenção.

— Espero que seja na boca mais tarde. — comentou Marena, sem olhar para ela, enquanto sorria sem mostrar os dentes.

Sofía revirou os olhos, mas estava rindo abertamente. E mesmo enquanto caminhava até o casarão da fazenda para confortar sua melhor amiga, com seu baú de jóias debaixo de um braço e a bolsa de Isabel pendurada em outro, foi difícil desfazer seu melhor sorriso, que sempre surgia quando Marena estava por perto.

-

Isabel estava sentada no meio de sua cama, abraçando as próprias pernas. Chorava com a dor de quem viu o mundo acabar e não pôde fazer nada para evitar — porque, de certa forma, foi o que aconteceu. Sua garganta ardia e o peito subia e descia no ritmo de seus soluços frenéticos.

Os sons da festa lá fora eram um contraponto a seu inferno particular. Nem mesmo os tiros que ouviu foram o suficiente para demovê-la de seu luto pela vida que poderia ter tido, que quase teve. Sempre achou que as descrições sobre perder o chão e o rumo quando não se podia estar perto da pessoa amada fosse um exagero dramático dos romances, uma licença poética da literatura para comover o leitor. No entanto, ali estava ela, de carne e osso, sentindo um buraco negro de vazio e falta de sentido devorá-la sob a pele.

Quando ouviu as duas batidas na porta que já eram a marca registrada de Sofía, quis mandá-la entrar, mas as palavras não tiveram força para escalar sua garganta. Qualquer ação demandava um esforço imenso, que seu corpo cansado e decepcionado com Deus e o universo já não tinha meios para prover.

Por sorte, sua melhor amiga a conhecia bem o suficiente para saber que precisava insistir e invadir o cômodo de qualquer maneira.

Sem dizer uma palavra, Sofía fechou a porta atrás de si. Em passos lentos, caminhou até a cama, onde abandonou a bolsa com os pertences de Isabel e a caixa de jóias coberta de terra, que pretendia dar de presente para a cunhada caso a fuga tivesse se concretizado. Então, sentou-se ao lado dela, beijou seu ombro e acariciou seus cabelos.

— Você já sabe? — perguntou Isabel, com uma voz gélida que Sofía desconhecia até então. Estava se referindo à gravidez.

— Marena nos contou. — explicou a irmã de Pedro, sem maiores detalhes.

Marena nos contou. O plural da frase provocou um calafrio em Isabel. Pensou em Daniela e sentiu o coração se contrair.

— Como ela reagiu? — questionou Isabel. Não era preciso explicar a quem a pergunta se referia.

— Ficou furiosa. — respondeu Sofía, sem hesitar — Não com você, mas com a situação. Primeiro, disse que Marena estava mentindo. Depois, jurou que ia vir te buscar e que mataria todos os fazendeiros que estão na nossa festa se fosse preciso. Por fim, sentou numa pedra e ficou encarando o nada com os olhos cheios de lágrimas.

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