Cinco

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Quase todas as 150 costureiras da Arce levantaram as cabeças e cutucaram umas às outras assim que viram Fernanda entrar na sala como o furacão que era. A presença da chefe não era muito comum por ali. O barulho dos saltos de seu par de Louboutin pretos ecoou por toda a confecção de costura, que ocupava um andar inteiro do prédio da empresa. Ela caminhou apressadamente pelos corredores, sem falar com ninguém, esticando a cabeça para ver além das fileiras intermináveis de máquinas de costura modernas.

Por fim, encontrou quem procurava.

Juliana estava ao lado de uma das grandes janelas do cômodo, compenetrada no pedal de sua máquina e no ponto reto da peça que costurava. A concentração era tanta que ela sequer percebeu quando Fernanda se aproximou e cruzou os braços sobre o peito.

— Não acreditei quando me disseram que você estava aqui embaixo, Valdés. — disse Fernanda, fazendo Juliana dar um pulo na cadeira.

— Bem, por que não? — desafiou Juliana.

Fernanda retorceu os lábios, segurando um sorriso. Não estava acostumada a ser questionada, mas Juliana parecia não ter ideia disso — o que era fascinante.

— Sei que você está acostumada a ser um lobo solitário e sua marca ainda é pequena, mas a Arce é diferente. Aqui — disse Fernanda, gesticulando na direção das dezenas de mulheres que trabalhavam ao redor delas — nós pagamos toda essa equipe para colocar a mão na massa e transformar nossas ideias em realidade. Você não precisa fazer isso.

Juliana deu de ombros.

— Não sou melhor que essas mulheres só porque estou numa função criativa. Não me importo de costurar. Inclusive, "colocar a mão na massa", como você diz, é parte do meu sonho. Sei que a coleção vai ser grande e não vou ter controle sobre tudo que vai ser fabricado, mas é importante para mim produzir as primeiras peças e imprimir nelas tudo em que eu acredito.

Juliana e Fernanda se encararam por alguns segundos. A dona da empresa, então, não conseguiu mais conter o imenso sorriso que estava guardando para si desde o início daquela conversa.

— Você não faz ideia do quanto é especial, Valdés. Dá para entender por que foi escolhida como a estilista revelação do México. — disse Fernanda, fazendo Juliana se desarmar e esboçar um sorriso — Mas vamos ao que interessa: vim aqui porque preciso te mostrar uma coisa.

Fernanda se abaixou até ficar à altura da máquina de costura e sacou o iPad que carregava embaixo do braço.

— Fiquei impressionada com seus croquis inspirados na moda de 1910 a 1920 e resolvi me aprofundar nas pesquisas sobre essa época. — continuou ela, abrindo alguns arquivos na tela do aparelho — Era exatamente o período da Revolução Mexicana. Então, decidi criar alguma coisa inspirada pelas soldaderas. Você já ouviu falar delas, certo?

— Lembro vagamente de ter estudado isso na escola. — confessou Juliana.

— A Revolução Mexicana foi basicamente uma grande guerra civil de uma década. A luta era pela Reforma Agrária e por uma Constituição que oferecesse direitos a toda a população. As soldaderas foram mulheres que abandonaram suas casas e foram para a linha de frente nessa batalha. — explicou Fernanda, sem disfarçar a animação com a história — Algumas foram para acompanhar seus maridos e assumir os serviços domésticos dos acampamentos, outras para atuar como enfermeiras, e outras simplesmente para lutar. Uma boa parte delas pegou em armas e foi ao combate para defender o projeto de país em que acreditava.

Juliana não pôde deixar de sorrir com a empolgação de Fernanda e com a força de todas aquelas mulheres. Uma inspiração repentina e um orgulho inflamado borbulharam dentro dela.

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