A Voz da Escuridão.

Galing kay guiguiroseira

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[Obra registrada na Biblioteca Nacional.] Um garoto de 8 anos é sequestrado e morto na pequena cidade de... Higit pa

A Voz da Escuridão.
Ato 1 (1988).
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Ato 2 (2009 - 2014).
Parte I
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Parte II
SÁBADO
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DOMINGO
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5 (i)
5 (ii)
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SEGUNDA-FEIRA
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AVISO: Comemoração.
TERÇA-FEIRA
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14 (I)
14 (II)
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18 (I)
18 (II)
QUARTA-FEIRA NEGRA (I)
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2 (I)
2 (II)
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PARTE III
Quarta-Feira Negra (II)
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8 (I)
8 (II)
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15 (I)
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PARTE FINAL
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EPÍLOGO
1
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4
FINAL
Nota do Autor.
Comemoração Concurso StoryTeller.
A VIAJANTE. LANÇAMENTO: 12 DE MARÇO.

4

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Galing kay guiguiroseira



Quando o agente especial Yuri Watson entrou em New Shore, sua cabeça ainda se encontrava em Sophia Manning. Ao longo dos anos, ele se acostumara a lembrar dela nos momentos mais estranhos. Ela simplesmente saltava à sua mente sem horário marcado: ele podia estar na academia, lendo um livro, jantando com a esposa, brincando com a filha, no trabalho e, de repente, Sophia surgia em seus pensamentos, fazendo-o se perguntar onde ela estava, se estava bem, se estava viva. Era como uma música favorita, que você escuta até não aguentar mais, esquece que existe e, um dia, sem perceber, se pega cantarolando o refrão e sente uma necessidade incontrolável de colocá-la para tocar de novo.

Yuri estava tão distraído pensando nela, lembrando-se da primeira vez em que colocara uma arma em suas pequenas mãos para ensiná-la a empunhar, mirar e atirar – a garota tinha uma pontaria divina – que passou reto no sinal vermelho, desencadeando uma série de buzinas irritadas e xingamentos à sua mãe. Isso colocou seus pés de volta na realidade e ele apertou com força o volante do Ford Ranger que dirigia.

- Tudo bem? – perguntou Norman Grimmes no banco de passageiro. Eles eram parceiros desde o que acontecera em Fallpound.

- É, tudo – Watson disse. À frente deles, a viatura da polícia de New Shore continuava guiando-os pela cidade, mostrando o caminho até o local do crime. As sirenes gritavam, suas luzes girando e manchando a vista de Watson ora de vermelho e ora de azul, atraindo a atenção de quem andava pelas calçadas.

- Pensando em Sophia?

Watson suspirou fundo. Tinha contado a Grimmes a conversa que tivera com Chapman ao celular.

- Estou – ele disse. – Estava.

No banco de carona, Grimmes assentiu, como se conseguisse ler os pensamentos de Watson, da maneira que Sophia costumava fazer. O garoto mudara desde Fallpound. A vida temperara o aço que sempre existira nele. Seu rosto, que antes podia facilmente estampar capas de revistas de moda, adquirira traços sólidos, as linhas da mandíbula e do queixo se destacando, dando-lhe uma aparência de quem andava sempre de maxilar trincado. Isso não o deixava menos bonito, mas o enchia de uma dureza férrea que, Watson achava, o próprio Grimmes não sabia que tinha. Enquanto reparava nessas coisas, que não estavam em Grimmes cinco anos atrás, Watson fitou a si mesmo no retrovisor, perguntando-se o quanto ele havia mudado sem perceber. O quanto todos eles haviam.

- Sabe o que sempre me vem à mente quando penso nela? – disse Grimmes. – Os olhos. Aqueles olhos de gato que ela tinha.

Watson teve que rir ao pensar nas duas esferas verdes que pareciam ocupar todos os espaços vazios no rosto de Sophia. Deveria ser proibido sair por aí com um par de olhos como aquele. Eram olhos ladrões de corações. Ele sabia muito bem disso: roubaram o dele no momento em que ele os viu.

- Pergunto-me se vamos vê-la de novo – disse Watson.

- Quem sabe – Grimmes deu de ombros.

A viatura que os guiava pegou uma curva e virou à direita, com Watson em seu encalço, entrando em uma rua barulhenta e tão bem iluminada que transformava a noite em dia. Os finais de semana eram agitados em New Shore. A epidemia de drogas que tomou conta da cidade nos anos 80 e início dos 90 tinha ficado há muito para trás, dando lugar a bairros com bares estilosos, clubes noturnos e pubs que ecoavam rock'n'roll e jazz, a trilha sonora perfeita para os estudantes e universitários que andavam pelas calçadas. Jovens com os braços nas cinturas de suas namoradas, garotas que caminhavam como se desfilassem em uma passarela e sendo clicadas por flashes, rodas de amigos às gargalhadas. Grimmes encostou a cabeça no vidro e olhou a vida lá fora: a juventude pulsante e confusa que um dia herdaria o mundo.

- Olhe só para eles – disse Grimmes. – Estamos indo investigar o assassinato de uma família, e toda essa gente aí, sem saber que há corpos batendo à porta.

Watson achou ter notado um pouco de ressentimento na voz dele, o que era compreensível. Grimmes ingressara jovem para o FBI e, depois de Fallpound, ele ascendera rápido entre as fileiras. O que fora bom para sua carreira, mas que também significara a morte da sua juventude. Seus vinte e poucos anos foram gastos perseguindo criminosos pelo país, resolvendo assassinatos e ajudando gente que ele sequer conhecia. Ele abrira mão de tudo aquilo que via nas ruas de New Shore – amigos, namoradas, garotas, festas – para tornar o mundo um lugar melhor. Quando você para e pensa, percebe que o preço de se fazer a coisa certa é bem alto.

- Elas não precisam saber de assassinato nenhum, Norman – disse Watson, observando um casal de jovens entrar em um bar. O cara, que era só músculos e barba, tinha a mão nas nádegas da namorada loira. – É o nosso trabalho cuidar disso, lembra?

- Pois é, eu sei – Grimmes afundou um pouco no banco. – É uma grande merda isso tudo.

Watson não podia argumentar contra isso.

Deixaram os bares e os pubs para trás e entraram em uma rua que era exatamente o oposto da anterior. Nada dos barulhos da vida noturna agitada: ali, as casas vitorianas estavam mergulhadas em silêncio, com apenas uma ou outra janela acessa como quadrados de luz, de onde vinha o barulho de televisões ligadas. Grimmes ajeitou-se no assento e apontou para além da viatura à frente deles, embora não fosse necessário. Watson tinha visto.

Uma casa no fim da rua estava cercada por uma fita amarela da polícia. As palavras "CENA DE CRIME, NÃO ATRAVESSE" podiam ser lidas à distância, piscando vermelhas e azuis conforme eram iluminadas pelas sirenes. Watson contou três viaturas paradas em frente ao lugar, os policiais andando de lá para cá para manter afastados os vizinhos curiosos. A multidão era pequena, mas logo outras pessoas ficariam sabendo que um homicídio ocorrera ali e correriam para dar uma espiada. Nada tem tanto apelo para o ser humano quanto a desgraça.

- Nada ainda de jornalistas – comentou Grimmes.

- Ótimo – disse Watson. – Não estou com ânimo para lidar com aqueles abutres.

Ele parou o carro logo atrás da viatura que os guiara até ali. Desceu para a rua com Grimmes e aguardou enquanto um jovem policial se aproximava e estendia a mão. Watson a apertou.

- Venham, por favor – ele disse, mais sombrio do que parecia ser necessário.

Watson e Grimmes foram atrás dele. O policial fez uma rápida parada para desligar as sirenes de sua viatura e levou-os até o final da rua, onde a pequena multidão de rostos curiosos se encontrava. As pessoas os viram chegar e abriram caminho, olhos esbugalhados e medo estampado na cara, fitando-os como se eles fossem portadores de algum vírus mortal e contagioso, e não agentes da lei. Outro policial, esse mais velho, esperava por eles atrás da faixa amarela. Apertou a mão de Watson e depois a de Grimmes. Suas palmas estavam cobertas de suor.

- Obrigado por virem tão rápido – ele disse. Era um homem alto e largo como um armário, mas que tinha o tamanho diminuído pelo medo pouco disfarçado em seu rosto. Dava para ver a tensão e o assombro dançando no fundo de seus olhos castanhos. – Meu nome é Dell. Dell Cohen. Sou o chefe da polícia de New Shore.

- Muito prazer – disse Watson. – Sou o agente especial Yuri Watson. E ele é meu parceiro, Norman Grimmes – e então ele pronunciou as palavras que sempre dizia em situações assim. Aquela pergunta que abria portas para quartos sombrios e escuros, onde uma pessoa poderia ficar perdida para sempre: – O que você tem para nós?

O rosto do policial Cohen se encolheu, e Watson quase pôde ver a sombra do que quer que esperava por eles dentro da casa passando pela cabeça do homem.

- Boa pergunta – ele disse. Bom, aí estava uma resposta inédita. – Eu não sei o que aconteceu. Nunca vi uma coisa assim, juro por Deus. Foi por isso que chamei vocês. Acho que... Acho que isso é sério. Muito sério.

Em silêncio, Watson e Grimmes trocaram um olhar. Depois de cinco anos trabalhando juntos, eles realmente tinham desenvolvido algo parecido com leitura mental. Seus pensamentos eram intercambiáveis. E, naquele momento, ambos achavam a mesma coisa: aquele papo lembrava Fallpound. Lembrava demais.

- Bom – disse Watson, voltando-se para o chefe de polícia –, vamos dar uma olhada, que tal?

***


A morte usa perfume. Você a fareja chegando. Watson aprendera isso durante os anos de trabalho em casos de homicídio. Ela cheira a álcool, corredores de hospitais, sangue, violência e doença. Cheira a lugares fechados, escuridão e tumores crescendo em silêncio durante a noite. Em Fallpound, Watson sentira o aroma da morte em sua forma mais pura – algo que o fazia pensar na última semana de vida de seu pai, que convalesceu em uma cama enquanto um câncer de pulmão, que decidira dar um passeio pelo resto do corpo, o devorava lentamente até não restar mais nada.

Assim que Watson passou por baixo da faixa amarela da polícia, acompanhando Grimmes e o chefe Cohen para o interior da casa em que os homicídios haviam acontecido, ele foi atingido novamente pelo cheiro da morte. Fedia terrivelmente. Desde Fallpound que Watson não sentia com tanta clareza aquele aroma de coisas velhas e podres no fundo do armário. Era quase palpável, como se ele pudesse erguer a mão e tocar um cobertor de putrefação.

- Vou deixar vocês olharem à vontade – disse o chefe de polícia Cohen, parando na soleira da porta e olhando para o interior da casa como se o diabo esperasse por ele lá dentro, pronto para roubar-lhe a alma. – Só peço que tomem cuidado para não contaminar a cena do crime. A perícia ainda não chegou, e eles ficam putos da vida quando encontram as coisas bagunçadas.

- Você já os chamou? – perguntou Watson. Ele tirou do bolso dois pares de luvas de plástico, passando um para Grimmes.

- Acabei de chamar – Cohen respondeu com uma careta. – Eu sei, deveria ter feito isso antes. Mas é que... – a voz dele morreu. Ele suava.

- Não se preocupe – disse Grimmes, dando um tapinha tranquilizador no braço do homem. – Pode deixar com a gente.

Cohen assentiu e liberou espaço para eles. Watson foi à frente, com Grimmes logo atrás. A porta da entrada se encontrava aberta, a fechadura quebrada, o que queria dizer que o assassino invadira o local. Grimmes observou a maçaneta mole, caída tristonha sem apoio algum.

- Foi planejado – disse Grimmes para Watson. – Ele os marcou. Provavelmente, já os estudava há algum tempo.

Watson assentiu e seguiu em frente. O interior da casa estava mergulhado em escuridão. Retratos cobriam as paredes do corredor de entrada: um homem alto de óculos e gravata, segurando um recém-nascido de cabelos negros; o mesmo bebê nos braços de uma mulher ruiva e dona de um sorriso faminto, tão grande que quase lhe comia os olhos; um desenho feito com canetinha e que mostrava um cachorro correndo por um campo de grama; a família toda reunida.

Esta última fotografia chamou a atenção de Watson, e ele parou para observá-la. Era Natal no tempo da foto. O homem, visivelmente mais velho do que na primeira moldura, porém com os mesmos óculos de armação de tartaruga, tinha um dos braços em torno da cintura da mulher ruiva e bonita. Ela usava uma toca de Papai Noel que combinava com seus cabelos cor de fogo. Entre ambos estava um menino de, no máximo, sete anos. A criança herdara os olhos verdes da mãe. Atrás deles, um pinheiro cheio de pisca-piscas iluminava as paredes com luzes coloridas. A família era toda feita de sorrisos e covinhas. Merda, pareciam tão felizes.

- Filho da puta – murmurou Grimmes, também olhando a fotografia. – Odeio isso, cara. Odeio isso.

Pois é, Watson também odiava. Mas era o trabalho. Ele não podia deixar que aquilo entrasse em sua pele, ou enlouqueceria. Era só que, às vezes, ficava difícil.

Voltaram a andar pela casa escura, seus passos ecoando pelas paredes e pelo teto. O quarto dos pais ficava logo à direita depois da sala de estar. Não havia fitas policiais indicando que um crime ocorrera no cômodo, então Grimmes e Watson pararam no limiar da porta. Olharam a cena por um longo tempo, em silêncio.

O homem e a mulher das fotografias estavam mortos na cama de casal. Ele ainda se encontrava de bruços, a mesma posição na qual, provavelmente, fora dormir. Um buraco de bala despontava em sua nuca, escancarado como uma boca vermelha e sem dentes. Seu rosto repousava em uma poça de sangue no travesseiro, quase como se ele tivesse se afogado ali. Já a mulher havia sido baleada na têmpora direita, o buraco de entrada quase invisível em meio à sua cabeleira vermelha. Era difícil dizer o que era sangue e o que era cabelo. Ela tinha a mão esquerda caída para fora do colchão, a aliança dourada brilhando no dedo anelar. Seus olhos, abertos, encaravam a parede sem nada ver, a luz verde que antes lhes emprestava tanta vida agora apagada para sempre.

- Foram mortos ontem à noite ou durante a madrugada – sussurrou Watson para Grimmes. – Enquanto dormiam. Nem devem ter visto o que aconteceu.

- Sabe se os vizinhos escutaram alguma coisa? – disse Grimmes. Ele não conseguia tirar os olhos da aliança no dedo da mulher.

- Vou perguntar para Cohen, mas acho que não. Ninguém deve ter escutado nada. Cohen me contou ao telefone que descobriram que havia algo errado somente hoje, quando uma vizinha saiu para passear com o cachorro e notou a porta aberta.

- Então o cara deve ter usado um silenciador – Grimmes respirou fundo.

Watson fez que sim, sentindo uma tristeza apoderar-se de si enquanto olhava o casal morto. Era horrível – encontrar um corpo era sempre horrível, como poderia não ser? – mas, ainda assim, não justificava o medo que o chefe de polícia Cohen expressara. Ele dissera que nunca havia visto algo igual ao que encontrara dentro daquela casa. E pessoas mortas a tiros, infelizmente, não era anormal naquele ramo. O que os deixava com apenas uma opção.

- Vamos dar uma olhada no menino – disse Watson.

- O menino – ecoou Grimmes, como se tivesse se esquecido completamente da existência da criança até aquele momento.

O quarto dele ficava no final do corredor. Havia um pôster do O Senhor dos Anéis na porta, que se encontrava apenas encostada, a brecha deixando vazar um halo de luz prateada do luar. Watson empurrou-a com a ponta enluvada do dedo, não querendo contaminar quaisquer pistas que o assassino pudesse ter deixado. Ela abriu-se com um som de dobradiças rangendo, revelando o que havia lá dentro, e então Watson entendeu o medo que vira no rosto do chefe de polícia Cohen. Ele sentiu suas pernas fraquejando e precisou se apoiar no batente para continuar de pé. Uma bola de ferro formou-se na boca de seu estômago. Escutou Grimmes arfar ao seu lado, falando baixinho – ah, porra – e o próprio Watson tentou dizer algo, mas sua voz não saiu. Tudo o que conseguiu fazer foi pensar, e até isso fez de modo meio incoerente.

Meudeusdocéu.

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