62ºCapítulo

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Hoje fazem três dias que estou no hospital, mal vejo a hora de receber minha alta e ir para casa dormir na minha cama e comer algo que não seja sopa de legumes e gelatina de morango. 

Não importa o hospital, a comida sempre vai ser sem tempero. 

-Amor, eu trouxe algumas roupas para você.- Jack diz entrando no quarto com uma mala preta nas mãos. Sorrio em agradecimento e volto a olhar pela janela. 

Desde quando conversamos, ele tem estado sempre aqui, raramente sai e quando isso acontece é para apenas buscar roupas. Ele está até fazendo todas as refeições comigo, é engraçado ver a sua cara de descontentamento a cada garfada. 

Fiquei muito aliviada quando ele passou a noite comigo depois de conversarmos, todo o receio e medo que eu tinha quanto a nós dois se dissipou quase por completo e eu consegui dormir melhor do que eu esperava. 

Apesar dos pesadelos.

Esses nunca vão embora, e são cada vez mais terríveis. O medo de a qualquer momento Terry invadir o quarto e atirar em mim ou em Jack, está cravado em meu peito e não importa o quanto eu tente não consigo afastá-lo. 

Richard, meu psicólogo, me visitou ontem, foi um alívio falar sobre tudo com alguém imparcial. Eu contei tudo, foi mais fácil do que pensei falar sobre os abusos psicológicos e as surras, se ele ficou chocado não demonstrou. 

Quando eu consultava com ele, falava apenas da minha adolescência e meus medos em relação ao meu relacionamento e essa exposição tão grande à mídia, sobre minha bulimia e relação abusiva com calmantes, como era ser uma imigrante negra e latina em um país extremamente racista e xenofóbico. 

Falávamos de tudo, menos sobre o Terry. 

"-Bom, tenho que dizer que isso muda tudo, talvez até ligue alguns pontos que eu não estava conseguindo entender sobre a sua vida.- Ele diz sério sem demonstrar nenhuma emoção. -Agora o que temos que fazer é tratar dos traumas que esse abusos causaram e possam causar, essa vai ser a prioridade do seu tratamento.- Diz, limpo minhas lágrimas e abaixo a cabeça."

Será difícil, mas eu não vou desistir, não posso e não quero me sentir ameaçada a cada aproximação estranha, com medo de dormir e acordar dentro daquele pesadelo, me sentir nauseada apenas de pensar em sair na rua. 

Vou conseguir passar por isso, e como minha mãe mesma disse, eu não estou sozinha. 

A parte mais difícil do tratamento será falar sobre o bebê, quando ele veio eu não consegui mencionar o assunto sem o choro me interromper e eu me sentir completamente sufocada. 

Richard disse que não precisamos nos apressar para ir até o assunto, que primeiro eu tinha que me sentir confortável em falar sobre, forçar eu mesma a isso só regrediria o tratamento. O problema é que eu nunca vou me sentir preparada para lidar com isso. 

Toda vez que pisco é como se sentisse a dor escruciante do tiro que a tirou de mim, vejo a imagem da menina de olhos verdes se dissipar cada vez mais. 

Aperto meus olhos forçando a imagem a ficar, mas não adianta, está indo aos poucos. 

-Ei, o que aconteceu?- Sinto dedos secando minhas lágrimas, nem percebi que estava chorando. -O que houve meu amor?

-Nada, eu só...- Balanço a cabeça e suspiro. Abro os olhos e tento sorrir para tranquilizá-lo, Jack parece entender pois vejo seus olhos se encherem de lágrimas. 

-É, eu também.

******

-Então é isso senhorita Vanralsem, está pronta e liberada para ir embora.- Phil diz enquanto assina minha alta. Sinto-me aliviada e ansiosa para ir para casa onde vou realmente conseguir descansar, pelo menos melhor que aqui. 

A.S.P: True Love (Amor Verdadeiro)Where stories live. Discover now