Capítulo 45

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chorar inconformada com o fim de uma série às 01:48 da madrugada é um bom exercício que eu super recomendo pra vocês.

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Embora problemáticos, tais ataques histéricos não eram frequentes. Revelavam, porém, o quanto Dakota andava incomodada e o quanto poderia se mostrar desagradável caso a provocassem. Enfurecia-se mais com Lauren, afinal Lauren a traíra, e para Lauren sobravam sempre as consequências de suas explosões. Porém, curiosamente, ela tolerava Lauren no dia-a-dia. Em relação aos demais, mostrava-se quase sempre irritada. Poderia explodir com a Robin, por exemplo, se esta fizesse um comentário em sua opinião pretensioso. Ou ficar inexplicavelmente furiosa quando Charlie lhe oferecesse um sorvete; mas nunca provocava Lauren à toa, de modo arbitrário ou trivial. Isso apesar do fato da Lauren não se esforçar para agradá-la, como faziam os outros. Quando Dakota vinha com a ideia da excursão à França - que inclusive, ela tocava bastante no assunto -, Lauren a escutava indiferente, e suas respostas eram automáticas, forçadas. Para mim, a expectativa confiante da Dakota era mais apavorante que qualquer ataque de raiva; como ela poderia se iludir a ponto de achar que fariam a viagem e quanto ao fato de que seria um pesadelo se chegasse a acontecer? Mas Dakota, feliz como uma paciente de hospício, tagarelava horas a fio sobre as delícias da Riviera, ignorando a tensão no rosto da Lauren ou o vazio silencioso, tenebroso, que ocorria quando se cansava de falar e sentava, com a mão no queixo, olhando para o infinito em devaneio.

Em geral, pelo jeito, ela sublimava sua raiva da Lauren maltratando o resto do mundo. Mostrava-se descortês, rude, sempre pronta a começar uma briga com qualquer um que entrasse em contato com ela. Relatos de seu comportamento chegavam a nós por vários canais. Ela quebrou "sem querer" dois instrumentos de corda do grupo de hippies que ficava no campus; ameaçou bater um uma menina apenas porque essa a olhou enquanto estava passando; comeu a comida de todos do seu dormitório que estavam na geladeira comunitária. Ajudou-nos, calculo, o fato de que seu círculo de conhecidos incluía pouca gente com quem mantinha contato frequente. Vanessa via Dakota tanto quanto os outros, mas seu relacionamento não ultrapassava a sala de aula. Mais problemática ainda era a sua amizade com a ex-colega de colégio Ashley Gilbert; e, mais problemático que tudo, o namoro dela com Brian.

Brian, já sabíamos, também notara a mudança de comportamento da Dakota, o que o intrigava e enfurecia. Se visse o modo como agia quando estava conosco, sem dúvida concluiria que o problema não era com ele. Ocorre que ele só via os encontros desmarcados, a má vontade, frieza, mudanças de humor e os ataques de raiva repentinos, aparentemente dirigidos a ele. "Estaria a Dakota saindo com outro cara? Queria romper o namoro?" era isso que ele nos perguntava. Uma amiga no Centro de Estudos Infantis contou a Charlie que certo dia Brian telefonara seis vezes para a Dakota e que na última vez ela havia desligado na cara dele.

- Deus, meu Deus, fazei com que eles terminem logo -, Robin disse, erguendo os olhos para o céu, ao receber a informação.

Ninguém disse mais nada sobre o assunto, mas passamos a observá-los cuidadosamente, torcendo para que isso acontecesse. Se estivesse em seu juízo perfeito, Dakota seguramente manteria a boca fechada. Mas daquele jeito, com o subconsciente caído do poleiro, batendo as asas errático como um morcego pelos corredores vazios do cérebro, ninguém poderia prever seu modo de agir.

Ela não encontrava Ashley com frequência. Dakota e ela pouco tinham em comum, fora a escola que frequentaram juntas, e Ashley - que preservava uma falsa reputação de garota puritana - preocupava-se mais consigo mesma e dificilmente notaria o comportamento da Dakota ou daria qualquer importância a isso. Ashley morava no alojamento vizinho ao meu, uma casa chamada Durbinstall e felizmente para nós, Dakota morava no térreo, na parte da frente. Como mantinha as persianas sempre erguidas e não havia árvores por perto, era possível sentar na varanda da biblioteca, a cerca de vinte metros, e desfrutar da visão clara e desimpedida da Dakota, emoldurado pela janela iluminada, raspando os pêlos da perna em cima da mesa.

A História Secreta - CamrenWhere stories live. Discover now