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(Ministério, Ghomui - Mais de 200 anos atrás)

— Alguém pode me falar por que não chove em Téritis? — Uma voz masculina ecoava pela sala de aula, onde jaziam somente 15 alunos da melhor estirpe.

Os quinze eram jovens ainda, possuíam um corpo muito bem formado, na maioria dos casos pareciam guerreiros fortes e possuíam uma estatura grande. A que se destacava entre eles era Kayara, uma menina magricela, com cabelos curtos como os dos garotos, coberta de curativos e nunca sorria ou falava nas aulas. Aliás... era a única moça na sala.

O regente da aula era Onamis, o professor de História Teritiana e Conduta em Batalha. Era um homem meio idoso, que usava uma espécie de toga e tinha longos cabelos brancos, trançados com fios de prata. Esbanjava conhecimento e sabedoria a cada um de seus passos.

— Ninguém? — Onamis andou de um lado para outro no palanque de onde ministrava. Olhava os jovens sentados, o encarando com a cara pálida, sem saber o que lhe responder — Princesa, algo a declarar sobre a enquete? — Os olhos se voltaram para ela.

Kayara se manteve em silêncio por um tempo e suspirou profundamente, erguendo-se da cadeira sob os olhares de todos os colegas, que nunca haviam ouvido sua voz antes.

— Existem dois motivos... — Começou, olhando para o professor, que deu um breve sorriso e fez um sinal para que continuasse — O primeiro é que IruTéritis foi feita para ser perfeita, perfeita para nós e para os Divinos que antecederam-nos. Em Iru jamais é calor demais nos lugares de nuvem e sempre é muito frio para existir água líquida nos polos e no deserto de Ady. — Os olhos da moça varreram a sala.

— O que mais? — O professor indagou.

— Em Prers é muito quente para existir nuvens ou água... — Ela olhou ao redor da sala uma vez mais — O segundo motivo é que a Balança Aurös não gosta das nuvens escuras que antecedem a chuva, logo, não faz a Deusa Mãe feliz... fazendo da chuva ou tempestade um precedente de algo muito ruim. — Kayara moveu os dedos sobre a carteira, aguardando a ordem para sentar-se.

— Pode se sentar, Princesa. — O professor encarou a turma enquanto Kayara voltava ao seu lugar — Senhores, sigam o exemplo da futura rainha dos Sete Continentes e estudem. — Ergueu um dedo para cima e o voltou para a turma — Conhecer a história do seu mundo é conhecer a si mesmo. Um governo não deve ser feito com base em guerras sem fim e uma ditadura. Lembrem-se disso...

O professor se retirou da sala, pois agora seria a aula de Misturas e Biologia e tinham de apresentar a criação de um Homúnculo. Enquanto Kayara ia até o armário buscar seu projeto, um outro aluno se aproximou dela, a pondo contra a parede com brutalidade. Ele era bem maior e aparentemente muito mais forte. Aquele era Senad, príncipe de Soutoka.

— Hey! Olha só a novata! Acha que tem moral aqui? — Os outros alunos deram risadinhas, menos um, Rain — Não adianta nada fazer os trabalhinhos se mal consegue ficar de pé, com essas varetinhas que você chama de pernas... — Ele bateu contra a bandeja onde estava o projeto, que espatifou no chão, fazendo estardalhaço e muita bagunça.

Infelizmente, Senad não conhecia muito bem a família de Kayara, ou a própria ruiva, que apesar de aparentar ser frágil, tinha uma força gigantesca. Sendo assim, Senad levou um chute entre as pernas e um soco no nariz. Ele caiu como um saco de batatas, gemendo de dor e com as mãos nas partes baixas. Kayara cuspiu no rosto de Senad e deu um pisão em seu peito, o deixando sem ar. Os colegas, sem entenderem o que passou, ficaram parados. Menos Rain, que buscou afastar a menina de Senad antes que ela o matasse.

— Você tem que aprender a calar a boca, Senad! — Rain falava enquanto segurava a ruiva. Ele a virou para si e viu se estava bem — Como você está, princesa?

Kayara ficou encarando aqueles dois olhos verdes. Soltou um suspiro e empurrou o rapaz que lhe ajudou, indo recolher os pedaços do Homúnculo. Rain foi ajudar, mas recebeu olhares reprovadores dos colegas e decidiu se afastar antes que outro deles decidisse apanhar.

No fim das aulas daquele dia, incluindo o treinamento no campo leste, quando os alunos estavam liberados para voltarem aos quartos, Rain foi atrás de Kayara e a parou no corredor.

— Ei, espera aí... — Ele segurava um livro grande e pesado — Qual seu nome? — Ofegante, Rain se curvou brevemente.

— Me chamo Kayara... — Ela o olhou, percebendo que estava cansado, então pegou o livro que ele carregava sem grandes esforços, pondo o mesmo sobre o seu.

— Eu sou Rain — Se ergueu novamente, estendendo a mão para ela, contudo não foi correspondido —, príncipe da cidade de Jade, em Rorimir. — O príncipe recolheu a mão e coçou o topo da cabeça, sorrindo.

— Eu não quero saber... — Kayara devolveu o livro dele após notar que ele já estava melhor e voltou a andar.

— Eu te acompanho... — Sem desistir, Rain começou a andar junto com ela, bem ao seu lado.

— Não pedi companhia. — Olhou-o de cima abaixo com uma expressa falta de interesse para com o rapaz que lhe seguia.

— Mas também não disse que quer ficar sozinha. — Rain abriu um sorriso simpático e ela continuou andando sem falar absolutamente nada enquanto o rapaz tagarelava abertamente, soltando risadas.

Kayara nunca admitiu, mas ela sempre ria das piadas, mesmo que só interna e silenciosamente.

Kayara - Livro 1 [COMPLETA]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora