À noite, Croune trabalhou a ideia de contar a Vanguelb o que tinha ouvido na Loja Bergarus.
Foi no horário da janta, enquanto ele e Vanguelb estavam sentados à mesa, à luz dos candeeiros, que ele teve a coragem de resumir a conversa que teve com Bergarus naquele dia, incluindo tudo sobre a descoberta do passado de Vanguelb.
O velho escutou atentamente, sem interromper. Às vezes abanava a cabeça, quase imperceptivelmente, dando a impressão de não concordar completamente com uma parte ou outra da história.
– Se soubesse que o amigo que iria visitar era Bergarus, teria lhe proibido de sair deste quarto – reclamou Vanguelb. – Pensei que fosse visitar algum colega do Sinogo.
– Pelo menos ele responde às minhas perguntas – indignou-se Croune, olhando para o último pedaço de carne cozida em seu prato. – Coisa que você evita fazer.
– As palavras devem ser usadas com cuidado, por isso não conto tudo que as pessoas querem ouvir.
– Não peço que me conte nada além do que eu preciso saber!
Croune arrastou a cadeira para trás e se levantou.
– Estou apenas preocupado com meu pai. Quer que eu confie em você, mas não confia em mim. Nem tenho certeza se realmente me ajudará a achar meu pai. Agora sei que só está preocupado em se vingar de Shenack!
O quarto foi envolvido por uma quietude nada agradável.
Através da janela, Croune contemplava a noite. Lux ficou às suas costas, sentado, inutilmente balançando a cauda no chão e implorando sua atenção. Vanguelb olhou de esguelha para a janela enquanto mastigava a última porção de comida. Pôs-se de pé lentamente, passou a mão na barba e ajeitou o cinto frouxo.
– Vamos dar uma volta – disse ele. - Pode trazer seu cão junto, se quiser.
A sensação térmica diminuiu consideravelmente ao saírem pela porta da Hospedaria Aurora. A Lua cheia resplandecia no céu estrelado, derramando uma luz prateada sobre os telhados. As avenidas estavam quase desertas, e boa parte do comércio havia cessado a labuta diária.
Caminharam por longo tempo, sem trocarem palavras. Vanguelb, com as mãos presas às costas, seguia ao lado de Croune, a passos lentos. Lux sentiu-se livre para vagar a esmo pela rua, indo de um lado a outro, farejando o chão e levantando a perna traseira para marcar território em alguns postes de iluminação.
– O que é esse broche em seu peito? – perguntou Vanguelb.
– É o broche que eles dão para os participantes do Torneio Mirim – explicou Croune, dando uma ligeira olhada para o objeto preso à camisa.
– Não disse que participaria de um torneio.
– Pensei que não se importaria.
– Não é aconselhável ficar se expondo em público.
Croune encarou Vanguelb, rosto fechado.
– Não vou cancelar minha inscrição – ele falou. – Você mesmo disse que Édrei é um lugar seguro.
– É seguro se você não ficar chamando a atenção. Agora, se pintar o corpo de vermelho, subir em um poste e começar a gritar "Olhem pra mim! Sou o Croune! O Receptáculo está comigo!" é obvio que chamará a atenção... Shenack já está ciente de meu envolvimento e sabe que Édrei seria o primeiro local para onde eu fugiria. Ouvi comentários de que ontem dois mercenários tentaram entrar pelo portão oeste, mas foram barrados pelos soldados. Porém não sou seu pai. Faça o que quiser. Apenas fique sabendo que não hesitarei em pegar o Receptáculo e desaparecer por aí, caso lhe aconteça alguma coisa.
YOU ARE READING
O Receptáculo de Téldrin
FantasySINOPSE: Croune Wilan é um garoto pobre, de 11 anos, que mora em um pequeno e excluído vilarejo chamado Quiriate. Sua vida é simples e se divide em brincar com os amigos e ajudar seu pai na Untuárica Wilan. Mas quando Guilbor Spartex, o gentil homem...