O Receptáculo de Téldrin

17 - Um Diálogo Agradável

O silêncio inundou a sala das poltronas.

Finalmente, Croune voltou a piscar. Trabalhou em sua mente os detalhes da história recém-ouvida, recapitulando cada passo, do início ao fim. Muitas informações chegaram a ele, e algumas gostaria de não ter tido a oportunidade de ouvir. Estava surpreso e até certo ponto amedrontado com o que ouvira a respeito de seu salvador, e não conseguia agora decidir se Vanguelb era uma boa companhia, e se ele havia falado a verdade quando dissera que lhe ajudaria a resgatar seu pai.

– Não existem provas, porém o que as pessoas comentaram posteriormente é que Téldrin teria levado o Receptáculo para algum lugar deserto ou o atirado no mar – Bergarus disse. – Mas agora percebo que não passavam de boatos.

– Pensei que Shenack quisesse usar o que está dentro do Receptáculo – disse Croune.

– Se tudo que ouvi for verdade, o que realmente ele quer é certificar-se de sua destruição. Não ousaria desobedecer às ordens daquele que elevou seu nome. Se Baalamur quer o Receptáculo e o que ele guarda destruídos, é isto que Shenack deve fazer. E temo dizer, pequeno soldado, que você não está completamente seguro andando com esse objeto por aí. Tome cuidado. Muito cuidado.

Croune sentiu um calafrio deslizar pela espinha. Nunca vira o Sr. Bergarus preocupado. O bom homem sempre lhe tranquilizava, pois tentava tirar de todas as situações aquilo que era bom. Agora havia falado de tal forma que não passara nenhuma certeza de segurança ao pequeno menino.

– E Vanguelb, o senhor acha que ele...

– Como lhe disse, Croune, Vanguelb não assassinou o irmão. A única maldade que habita nele é a vingança. Há anos que o conheço. É um bom homem. Rude, muitas vezes, mas um homem sábio e de princípios. Não gosto muito da ideia de você estar envolvido nesta trama; no entanto, tenho, mesmo com receio, de dizer que ele é o único que pode lhe ajudar no momento.

A conversa foi interrompida por uma batida à porta da Loja Bergarus. O comerciante pediu licença, levantou e foi à loja. Croune ouviu um barulho de porta se abrindo, o som dos tubinhos metálicos avisando a chegada de um cliente, e uma voz masculina e arrastada cumprimentar o Sr Bergarus. Sucedeu um momento de silêncio. Depois vieram os sons não identificáveis de alguma coisa sólida escorregando pelo tampo do balcão, palavras de agradecimento, sons de metais novamente e a porta sendo fechada.

– Era Lord Correl, meu fiel cliente – explicou Sr. Bergarus sentando na poltrona. – Tenho alguns clientes especiais. A estes o aviso de "Fechado" não impede o atendimento. – Esfregou freneticamente o dedo polegar no indicador. – Ele é um dos homens mais ricos de Édrei. E sabe o que ele vem buscar duas vezes por mês em minha loja? Produtos da Untuárica Wilan. Ele sofre de problemas renais. O nome de seu pai é um bocado famoso por aqui.

Croune abriu um sorriso de felicidade com o elogio feito ao trabalho de seu pai, e Bergarus aproveitou a oportunidade para levar a conversa a assuntos mais agradáveis. Quis saber o que Croune havia aprendido no Sinogo até o momento, quanto tempo dedicaria para treinar antes do torneio, e se Édrei era como ele tinha imaginado.

O Sinogo era legal, segundo Croune, mas aprender a ler, calcular e ouvir histórias chatas sobre outras culturas não era tão legal como imaginara. Em sua opinião, era extremamente cansativo ficar horas sentado em uma carteira ouvindo um adulto falar. Elogiou a maneira dos mestres ensinarem, mas não negou que lá no fundo nascia uma vontade rebelde de permanecer analfabeto para o resto da vida.

Édrei era muito maior do que pensara e muito mais movimentada do que jamais ousaria pensar. Elogiou as refeições da Hospedaria Aurora, e riu ao contar que Lux tinha deixado a cama de Vanguelb com um cheiro ruim.

- O senhor vai estar no torneio, não vai?

– Não perderia por nada. Sou o patrocinador do ano. O bom nome de minha loja estará à mostra. E agora que fiquei sabendo de sua participação, terei um compromisso ainda maior.