1 - O Cliente do Cavalo Branco

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A Floresta Velha tinha o ar insalubre e úmido, repleto de minúsculas partículas de mofo. O sol que resplandecia sobre as copas das árvores altaneiras encontrava dificuldades para lançar frágeis fios de luz sobre as raízes mais salientes e aquecer os galhos mais baixos dos pinheiros. O solo era fofo, coberto por folhas e galhos secos, e as pedras, nos pontos menos visitados pelo sol, eram cobertas de musgo.

Mesmo que a natureza, em sua sabedoria, decidisse enviar um canário caridoso para sobrevoar aquela floresta, trazendo em seu bico uma semente qualquer, e, por um breve momento de descuido, o grão resvalasse e descesse quicando pelos galhos ocos de alguma árvore, ele não encontraria ali um local receptivo, pois a vegetação rasteira não tinha espaço naquele perímetro. E o vento não perdia seu tempo zanzando entre as árvores acinzentadas; preferia fazer sua viagem por cima, acariciando a parte mais verde da flora.

A pobre floresta era um lugar excluído, repleto de lendas falsas. Um ambiente inapropriado aos pulmões sensíveis. Um lugar onde poucas pessoas enfiariam seus pés, pois nada de interessante habitava ali.

Mas havia na orla desta floresta um amontoado de madeiras, no formato de casas, divididas por uma única rua de terra batida. As casas, embora velhas e desajeitadas, não eram exatamente uma barafunda arquitetônica – eram apenas simples.

Os telhados de palha eram manchados por fezes de pombas que voavam de casa em casa à procura do melhor lugar para construírem seus ninhos. A rua era suja e malcuidada, e barris velhos e rançosos (antigos recipientes de vinho) apodreciam nos cantos excluídos pelo sol, servindo de residência para baratas, ratos e outros bichos que habitam esses ambientes com cheiro desagradável. Cachorros sarnentos perseguiam gatos magricelas de um lado a outro, cruzando portas, pulando janelas, sem que fossem enxotados pelas travessuras.

No geral, era um local tranquilo, pobre, e totalmente sem graça. E poucas pessoas no mundo, tirando algumas dezenas de indivíduos que habitavam ali, tinham ouvido falar naquele vilarejo chumbrega chamado Quiriate.

Mesmo esquecido no recanto mais isolado das vastas terras do Sul, corria o comentário de que Quiriate fazia parte das terras de Édrei. Mesmo que fosse verdade, isto pouco importava, pois o poderoso rei Salum nunca enfiaria as rodas de suas ricas e belas carruagens naquele lugarzinho sujo.

A monotonia englobava os moradores dia a dia, e a mesma rotina cansativa renascia todas as manhãs: os mesmos indivíduos, as mesmas conversas, as mesmas crianças molambentas e desarrumadas agitando-se de um lado para outro à procura de algum divertimento naquele fim de mundo.

Para que acontecesse uma tênue mudança no convívio social, era preciso que algum desorientado cruzasse por ali para encher a cara na Taberna Moruski – de longe, o recinto mais visitado –, trazendo em seus lábios alguma notícia (ou fofoca) do mundo lá fora – o que era raro de acontecer.

O sortido comércio abria suas portas ao nascer do sol, na vã expectativa de receber novos clientes. As pequenas lojas só não entravam em completa falência porque moradores compravam de moradores, e às vezes também surgia um vendedor ambulante vendendo ou comprando algumas quinquilharias.

Entretanto, apesar de ser um vilarejo um tanto desagradável e sem muito a oferecer, Quiriate gozava de uma vantagem inalienável. Esta prerrogativa ficava no final da rua, ao lado da última casa do vilarejo. Era um galpão velho, com paredes escurecidas pelo tempo e frestas da largura de um dedo. A chaminé escurecida pendia para um dos lados, olhando amuada na direção de dois tijolos que um dia fizeram parte de sua estrutura, mas que agora adormeciam sobre o telhado sujo. Uma placa desnivelada posicionava-se acima da porta carunchada. As letras garrafais, entalhadas na madeira, diziam: "UNTUÁRICA WILAN SEJA BEM-VINDO".

O Receptáculo de TéldrinUnde poveștirile trăiesc. Descoperă acum