Eu tomei aquele copo.

Depois outro. E outro.

E, antes que eu me desse por conta, a música batia mais alta, minhas bochechas queimavam como fogo e tudo se parecia mais com um borrão.

JÃO

Eu não tinha ideia de que horas eram.

Muito menos de onde estava Cecília.

A casa de Malu nem era tão grande assim.

Como eu podia ter perdido minha namorada ali no meio?

Quando eu estava prestes a sentar no sofá e tirar um cochilo no lugar de continuar procurando, me senti sendo abraçado por trás.

— João! Meu amor — era ela que falava gritando alterada — Onde você tava?

— Eu...

— A Malu me apresentou um monte de amigos

Ela começou a rir sem parar. Um riso frouxo de
gente embriagada.

— Pai amado, quanto você bebeu, Cici?

— Um pouquinho assim — falou fazendo um sinal de pouco com a mão voltando a rir, quase caindo em meus braços — O mais legal foi lá no quarto da Malu... Tava tedo colorido, se mexendo

— Puta que pariu, não foi só bebida. Vou matar
a Maria Luísa

— Não, não — ela disse me puxando pelo braço, mesmo que eu não tivesse mexido um dedo — Eu tô me divertindo. Eu nunca tinha feito nada disso. É como... ser adolescente de novo

Algo dentro de mim me fez ficar estático lembrando de tudo que eu havia vivido naqueles anos de faculdade.

...

São Paulo, 10 de dezembro de 2013

Um ano depois de ter entrado na USP, aqui estava eu, na minha primeira festa na faculdade.

Ana tinha me chamado no fim das aulas. Era uma comemoração pelas férias.

Pensei que ia me sentir perdido ali no meio, mas bastou que eu entrasse por aquela porta para que me oferecessem bebida.

Tudo é diferente da minha cidade natal. A música é mais alta, o cheiro de bebida mais forte. Tudo é mais intenso.

Aceitei o primeiro drink e fui para o canto da sala.

Do outro lado daquele cômodo, Pedro, um menino que eu tinha conhecido fazia pouco tempo, me encarava disfarçadamente.

Eu fiquei envergonhado.

Quando eu me dei por conta, ele já estava do meu lado.

— João! — ele falou quando se aproximou e me abraçou com dois copos de bebida na mão — Bebe mais um pouco

Eu peguei um dos copos e começamos a conversar.

Instantes depois, porém, alguém me abraçou e ficou entre meus braços.

— É bom te ver de novo — a menina que tinha me abraçado, a qual eu acreditava ser de meu curso, falou

Eu me senti culpado, porque, não sei se por causa da bebida ou da memória fraca, eu não tinha ideia do nome dela, apesar de ela parecer ter tanta intimidade comigo.

— Eu tava indo lá em cima acender um — ela disse despreocupada — Vocês querem?

Eu não sei o que passou na minha cabeça naquele momento. Eu só aceitei.

Eu sou jovem, no fim, e é isso que jovens fazem, não?

Eu não sei bem o que aconteceu depois. Ficou tudo em flashes.

Me lembro de subir escadas. De muita fumaça e olhos vermelhos. De risadas altas.

Tudo acabou com uma ressaca enorme no dia seguinte. E mais uma musiquinha em meu caderno de músicas que o mundo nunca conheceria.

...

Eu meio que entendia, então, tudo o que Cecí estava sentindo.

Ela nunca foi a garota que fez as coisas erradas. Acho que finalmente estava tendo sua adolescência ali.

Cecília nunca foi problema para a mãe, porque se sentia culpada por Dalva ter tido que criar seus dois filhos sem a ajuda de ninguém. Ela se esforçava mais do que qualquer outra pessoa que eu conhecia para ser a menininha perfeita.

O máximo que eu já vi minha namorada beber foi numa balada há uns dois anos, da "primeira" vez que a gente ficou. E ela devia ter tomado no máximo umas três doses ali.

Hoje o número de bebida consumida deve ter extrapolado qualquer outro.

Eu decidi deixá-la viver o momento, só estando ali por ela.

Eu abracei-a e comecei a dançar à sua companhia.

— Me fala quando quiser ir embora, gatinha — eu falei em seu ouvido e ela assentiu.

Ficamos ali na pista de dança improvisada na casa de Malu.

Cecí não quis mais beber nada, o que foi um alívio para mim, porque eu não queria discutir sobre isso. Afinal, eu que não deixaria ela colocar mais álcool em seu corpo — eu morria de medo de algo acontecer.

Depois de uma hora e longos minutos ali, ela começou a ficar com sono e eu achei melhor levá-la para casa.

Ajudei-a a tomar banho e a vestir uma blusa minha, e, no fim, me deitei ao seu lado.

Seria um dia de bastante dor de cabeça para ela amanhã.

Mas eu estaria aqui.

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