(35) - Tudo O Que É Tocável

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            "A veia pulsa o sangue conforme lhe é dito. O ar equilibra seu interior como lhe é conduzido. As cicatrizes se fecham de acordo como se é almejado. A pele recostura-se; os olhos dilatam-se; o cabelo aflora-se; os ossos reconstroem-se; os tendões religam-se. Aos cuidados de um awbhem com domínio de sua própria forma, a carne é ilimitadamente renovável, e o envelhecimento, uma ilusão.

(...)

Na literatura e nas artes escritas impregna-se a imaginária associação de eternidade com imortalidade. Compreensível, porém, errôneo. Os awbhem com controle corpóreo não são imunes às catástrofes e às enfermidades mais profundas. Mesmo as divindades não gozam de imortalidade plena. Suas estruturas físicas são vulneráveis, diferente de seus espíritos sagrados que perduram no Vazio ou entre planos.

Acredito a única imortalidade real seja a espiritual."


- Arquimago Idásios, Segundo Prelado dos Enakâns



QUANDO A herdeira chegou ao porto de Lohal, as vigias de Ákera nada mais eram que suas oficiais da armada, rondando a cidade por espiões ou informantes de Bálshiba ou Aylentar. No momento que Quinta Lua se aproximou do porto, a almirante pôde rastreá-la pela aura, assim, a encontrando enquanto o grupo discutia.

Após o encontro, Wanäe, Yuzhal e Yîarien entraram a bordo da nau capitânia onde Ákera era a capitã direta e de onde comandava o resto da armada. Tal barca lendária era a Lança Lunar. Ákera explicara que o barco fora um presente de Níshma, Rimanesh e seus engenheiros à armada da União, sendo uma obra prima da marinha. "O maior, mais ágil e potente navio já construído pelos awbhem" foi o que Rimanesh afirmou para a Matriarca ao entregar o magnífico presente, uma grande adição ao poderio crescente da Antiga União na época. A Lança Lunar já havia enfrentado dezenas de batalhas como a ponta de lança da armada — afinal, o nome viera de tal função —, sendo o primeiro barco a engajar a frota inimiga com o poderosíssimo aríete na dianteira do casco. A fama da nau já era reconhecida entre os militares antes mesmo de Ákera assumir o posto de capitã.

A Lança Lunar era realmente incrível. Com uma tripulação bem treinada, ela podia manobrar tal uma canoa em um lago manso, e seus mastros principais possuíam ramificações que se abrem como ramos para as laterais caso a necessidade demandasse maior velocidade ou mobilidade; o que não raramente acontecia. Somente os mastros principais desfraldados já faziam com que a nau capitânia se igualasse em celeridade às demais embarcações da armada.

Entretanto, o que mais impressionava era a capitã, feita para comandar aquele barco.

A lunno recordava-se do encontro de Kathamûl no instante que a mestra Adúry recitara as palavras da conjuração e atraíra os espíritos dos Arautos mortos de qualquer plano que estivessem. Havia o risco de ser ignorada ou que eles se voltassem contra ela, pois tudo dependia do teor da conjuração; se a consciência vagante dos Arautos a julgassem digna de canalizar a energia de seus espíritos para aquela situação. Espíritos estes que acumulam e renovam energias conforme são cultuados pelos povos tradicionais do deserto, e oferendas a eles são feitas — ao Eremita, neste caso —, desde orações até sacrifícios de animais. Como o histórico dos eventos confirmara, estes entes míddicos se demonstraram favoráveis à jornada de Quinta Lua. Em Kathamûl, conforme os ventos sopraram mais furiosos erguendo a tempestade de areia, a aura de Cibe se inflou. Cada vez mais. Até um ponto em que a mestra poderia ser considerada uma divindade pela sua presença poderosa. Mas aquilo, como Yîarien constatou, foram os Arautos usando o corpo de Adúry como catalisador do poder e não ela propriamente. Adúry se oferecera como avatar, pois os espíritos por si só não possuem capacidade de interferir em Ýku'ráv com tanta intensidade. Quando a conjuração terminou, as emanações da mestra sh'hila voltaram ao normal.

Quinta Lua (Livro Completo)Where stories live. Discover now