DESPEDIDA E TESTAMENTO

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adenocarcinoma subst.masc. (Oncol.) tumor maligno de um epitélio glandular ou cuja forma se assemelha à de uma glândula. Termos semelhantes: adenocancro. (Oxford Languages)

"A maioria dos tumores gástricos são adenocarcinomas, uma das neoplasias mais fatais do mundo. Comumente, os pacientes postergam a procura por ajuda para quando os sintomas estão mais evidentes - sendo esse um dos principais motivos da alta taxa de mortalidade[...].

Nos estágios mais precoces, o câncer não costuma se manifestar clinicamente ou apresenta apenas sintomas inespecíficos. Quando mais avançado, os sintomas começam a surgir, sendo esse, o momento de diagnóstico da maioria dos casos. Perda de peso, anorexia, disfagia, dor epigástrica, melena e saciedade precoce são os principais. O sangramento crônico pode estar presente e pode se apresentar como anemia ferropriva, fadiga e mal-estar. Massas palpáveis em região epigástrica, vômitos recorrentes e caquexia são outros possíveis sintomas.

Achados importantes durante o exame físico que sugerem fortemente a presença desse adenocarcinoma são o linfonodo de Virchow (adenomegalia supraclavicular esquerda) e o sinal da irmã Maria José [nódulo palpável na região umbilical].

Também podem ser percebidos sintomas associados aos principais locais de metástase, como fígado (dor em quadrante superior direito do abdome, icterícia e ascite) e pulmões (hemoptise e tosse)".

(In:<https://www.sanarmed.com/resumos-adenocarcinoma-gastrico-fatores-de-risco-sintomas-diagnostico-e-tratamento>)


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São Paulo, 20 de dezembro de 2022.

Jeff, meu velho...

Há quanto tempo não nos vemos.

Reconheço que grande parte da culpa por isso é minha. Espero que um dia possa me perdoar pelas minhas omissões, pelas coisas que não disse e que não revelei, tanto quanto por aquelas que falei e não deveria ter falado.

Estou muito feliz e orgulhoso de cada passo da sua caminhada. Cada vitória sua é como se fosse um abraço muito especial em meu coração, um alento nesse pouco tempo que ainda tenho aqui na Terra. Fiquei sabendo que você está atravessando um momento difícil em sua vida pessoal, e sinto muito não poder estar aí para nos abraçarmos como fazíamos antes, para tentar ao menos consolá-lo em meio a esse turbilhão. Mas eu te garanto, isso vai passar e os dias bons voltarão.

Você já deve ter percebido que a minha carta tem um tom diferente, primeiro por ser uma carta (quem manda cartas hoje em dia?), e segundo pelos assuntos que trago aqui e que dizem respeito diretamente aos documentos que envio anexos.

Vou ser direto, meu caro Jeff: estou nas últimas. Tenho um adenocarcinoma gástrico dentro de mim, e é tão pavoroso quanto o nome dele sugere. Estou internado recebendo tratamentos paliativos, mas fiz um pedido especial ao médico: que não me ministrasse morfina, só por hoje. Mesmo porque, ela já não adianta mais, e só me deixa mais pirado do que costumo ser. E preciso estar lúcido para escrever o que escrevo agora.

Ao longo de todos esses anos, vinha misturando meu cansaço e minha sobrecarga de trabalho aos sintomas, e quando eles se agravaram e os pude perceber, já era demasiado tarde.

E agora estou aqui, na cama de um hospital, conectado a tubos que pretendem tirar a minha dor, sem tirá-la; e ouvindo bipes de marcadores que vão oscilando e enfraquecendo a cada hora. Não sou nem sombra do homem que fui. E não quero, de forma alguma, que essa seja a última visão que tem de mim. Mas pretendo pelo menos colocar pingos em alguns "is" que ficaram faltando.

MISS MADEMOISELLEOpowieści tętniące życiem. Odkryj je teraz