Foi preciso muita lábia para que Christian conseguisse convencer Dulce a comer e enquanto ela empurrava com certa dificuldade a comida para dentro, seu melhor amigo a distraía com fofocas sobre as pessoas que eles conheciam.
— E eu estou falando, logo a Mai se casa, não aguento mais ela falando do Mane.
— Pelo menos ele é legal.
— Mas é muita melação. — Dulce revirou seus olhos. — Entretanto ela parece feliz, isso que importa.
— Sim. Ao contrário do Christopher e da Annie, quer dizer, acho os dois li dos, beijaria os dois, — Dulce fez uma careta e Christian riu. — Mas não acho que eles combinem.
— Prefiro não opinar.
— Você também não aprova o relacionamento deles, dá ora ver as costadas que você sempre dá, as vezes parece que tem ciúmes.
— Eu? Até parece, não tenho nada a ver com a decisão dos dois, só não me interessa nada do Pudim de Calabresa.
— Por favor me conta por que Pudim de Calabresa.
— Não. Segredo de estado, além do mais se eu disser vai perder a graça.
— Eu só consigo ver maldade nisso, espero que antes que esteja no meu leito de morde eu descubra o significado.
— Pois então demore a morrer.
— Por que você chutou o Ucker?
— Porque ele mereceu. Primeiro me levou a força lá pra baixo depois ficou no meu caminho.
— Você me assusta, sabia?
— Vai defender ele?
— Não estou do lado de ninguém, vocês que são parentes que se entendam.
— Ele não é nada meu, sai.
— Priminho Ucker.
— Teu cú, não tenho primos e por pouco não teria uma irmã.
— Falar em irmã, e a Lunna? Faz tempo que não a vejo pessoalmente, só nas redes sociais. Aquela senhora continua pegando nos pés dela?
Incomodada, Dulce voltou sua atenção à comida e um silêncio constrangedor pairou pelos ares. Christian conhecia toda a história, sabia quanto o assunto a machucava e ela evitava falar ao máximo sobre isso.
— Tá tudo bem?
— Vai ficar.
— Você não foi lá de novo né?
Dulce sacudiu seus ombros, fingindo não se importar, mas um nó se prendeu em sua garganta. Christian soltou um suspiro e puxou Dulce para um abraço confortável.
— Gatinha, precisa parar de correr atrás dessa mulher, sempre se machuca.
— Eu sei, sou uma idiota, mas é errado desejar que a mulher que te colocou no mundo tenha no mínimo respeito por você? Eu só queria que ela me amasse.
— Quem perde é ela. Você é um ser incrível e tenho certeza que qualquer outra mulher amaria ter tido você como filha.
— A única que pôde não quis e eu me sinto um lixo por isso. Não sabe como dói saber que ela nunca esteve presente porque não quis, isso dói sabe? Quando era mais nova, todos na escola tinham os pais lá, mas eu não tinha minha mãe e sempre perguntavam, ela sempre estava ocupada demais pra mim.
Dulce enxugou o rosto que agora se molhava com suas lágrimas, mas fora completamente em vão.
— Ela é um monstro e sei que cedo ou tarde ela vai pagar pela ausência dela e pelas atrocidades que sempre te diz. E quer saber? Você tem a gente, eu não sou sua mãe, mas sou seu melhor amigo e sempre estarei aqui pra você.
— Ai, obrigada! Estava mesmo precisando ouvir isso de mais pessoas.
— E para de chorar, ela não merece uma lágrima sua sequer e você já derramou demais para o meu gosto.
— Eu vou tentar.
Dulce se afastou dele e ele enxugou seu rosto. — Amo você minha maluquinha. Posso te fazer uma pergunta?
— Todas, agora se vai ter resposta é outra coisa.
— O Candy.com é seu, não é?
— Por que acha isso?
— Primeiro que sei falar inglês e segundo que aquilo lá é a sua cara.
— Por que eu faria uma fofoca falando de mim? Viu a última postagem?
— Uma postagem para se safar?
— Jurou.
Dulce desviou o olhar. Era um segredo entre ela e a irmã e não seria ela a pessoa que iria deixar vazar.
— Eu não aguento comer mais, se forçar eu vou vomitar.
— Pelo menos comeu um pouco, vamos lá embaixo? A gente toma um ar fresco no pátio ajuda na ressaca.
— Pode ser, mas já vou logo avisando que não estou com paciência para aquele imbecil, estou no limite com ele hoje.
— Essa briga de vocês dois ainda vai dar o que falar.
— Cala a boca, vai. Calado é um poeta.
— Você nunca pensou em beijá-lo?
— Não, Christian, eca! Ele namora a Annie, lembra?
— Ah, sei lá, é muito tiro trocado de vocês dois.
— Vamos mudar de assunto? Não quero ter indigestão.
Dulce saltou para fora de sua cama e pegou seu prato com o que sobrara de sua comida e já foi logo seguindo, enquanto Christian cantarolava uma música a seguindo até o andar de baixo.
Para o desgosto dela, Christopher estava na cozinha quando ambos chegaram lá, paradk de frente para a geladeira de pensativo.
— Sentiu o ar pesado por aqui, Christian?
— Às vezes parece que ela tem doze anos de idade.
Christopher fechou a geladeira e se virou sério para ela, que continuou seu percurso até a pia, deixando seu prato lá dentro.
— Ela comeu?
— Um pouco, melhor que nada.
— Pelo menos não terei que levar ninguém para o hospital, menos um trabalho que essa maluca vai me dar.
— Vai se foder e para de falar de mim como se eu não estivesse presente.
— Vai você, vou lavar sua boca com sabão, Porteiro de Gaiola.
Dulce soltou um suspiro, qual era a necessidade de ele provocá-la o tempo todo? Tudo bem que ela não era a mais quieta da história, mas ela só desejava que por um momento ele a deixasse em paz.
— Christopher, cala sua boca, eu não suporto ouvir sua voz, que coisa chata, me deixa em paz! Sério, eu não tenho um minuto de paz dentro da minha própria casa, você nem deveria estar aqui.
— Tenho tanto direito de estar aqui quanto você, primeiro porque sou afilhado do seu pai e ele me deu livre acesso à casa e segundo porque ele me paga e muito bem para poder cuidar da filha mimada e insuportável que ele trouxe ao mundo.
— Eu não preciso de um guarda-costas, está perdendo seu tempo.
— Se não precisasse eu estaria tranquilo na minha cidade com os meus amigos, minha família e não tendo que me submeter a uma pessoa que não pensa duas vezes antes de dopar alguma pessoa.
— Ela fez o quê?
— Não dê ouvidos a ele. — Dulce tentou fugir do assunto, era certo que se isso vazasse o pai dele iria querer matá-la.
— A sorte dela é que não preciso correr para o pai dela e contar essa barbaridade. Sabia que dopar pessoas é crime?
— Melhor ser presa que viver com você, por mim que tivesse morrido.
— Dulce! Não exagera.
— Eu bem que poderia continuar a trabalhar como antes, estava bem na delegacia. Os bandidos davam menos trabalho que essa menina idiota.
Havia um tom na voz de Christopher que dizia que ele já estava no limite. Por muito tempo levou na brincadeira, mas ele sabia que a briga estava ficando muito mais séria que o normal.