ᴇᴜ ᴘᴇᴅɪʀɪᴀ ᴅᴇsᴄᴜʟᴘᴀs, sᴇ ᴇᴜ ᴀᴄʜᴀssᴇ ϙᴜᴇ ɪssᴏ ғᴀʀɪᴀ ᴠᴏᴄᴇ̂ ᴍᴜᴅᴀʀ ᴅᴇ ɪᴅᴇɪᴀ.
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Kenny Anderson
O carro estava quebrado.
Andávamos a quase 4 horas sem rumo, às vezes precisávamos parar por conta do meu ferimento, ou apenas para beber água. Acho que nossa sorte foi minha mãe ter pego suprimentos mínimos antes de fugir do abrigo.
Havíamos trombado com alguns daqueles mortos, mas Aliss os finalizou facilmente.
Riggs estava inquieto, ainda era visível a marca das lágrimas em seu rosto junto de seus olhos avermelhados, e seu nariz rosado. Ele olhava para o chão enquanto carregava a minha mochila e a dele. Não estava sendo fácil para nenhum de nós, mas eu sequer consigo imaginar a dor que ele estava sentindo.
Eliot me ajudava a andar, e eu não conseguia levantar meu rosto para ver como ele estava, mas apenas pelo pesar de seu respirar, eu imagino que a situação não seja muito boa também.
Joe, estava morta. Morta e voltando nesse momento como uma daquelas… coisas. E eu nem pude cumprir minha promessa de deixá-la ser a madrinha dos meus filhos. Por mais que eu nunca quisesse ter filhos.
Ouvimos uma sirene distante de carro, minha mãe se atenta e ordena por ficarmos por perto, e assim fazemos. Vamos nos aproximando lentamente até que vemos um homem por baixo da roda do carro, gritando, enquanto o carro insistia em buzinar.
Minha mãe se aproxima, não do homem em si, mas se aproxima ao volante, desligando a busina.
— Vocês! Por favor! Me ajudem! — ele grita esperançoso.
— Quem é você?
— Eu me chamo Doug! Este carro aí é o meu… — ele diz cabisbaixo — Vocês podem me ajudar né?
— Você tem comida? — a loira pergunta ignorando a pergunta do homem.
— S-sim! No porta malas!
— Hm — ela vem até nós — Entrem naquele carro e coloquem o cinto.
— O que você vai fazer? — pergunto.
— Só faz o que eu mandei.
- O que? Não, você não tá pensando em roubar ele, né? - Riggs pergunta em sussurro.
- Roubar? Não - a loira revira os olhos - Esse cara já tá morrendo, e nós precisamos dessa comida.
- Mas ainda é roubo! Roubar é errado.
- Riggs, olha pra ele - eu aponto para o estado deplorável do homem - Ele não vai viver.
- Você realmente concorda com isso? - Riggs me olha incrédulo.
- Não importa as opiniões de vocês, precisamos desses recursos, e ponto final.
Sem outra opção, fazemos o que ela manda e entramos no carro.
— O que você vai fazer moça?! — o homem por debaixo das rodas pergunta e ela apenas sorri para ele.
— Fique tranquilo — entra no banco do motorista, em seguida vendo a chave no lugar, gira duas vezes, ligando o carro — Vamos tirar você daí — diz começando a dar ré.
A medida que o carro ia para trás, era possível ouvir os ossos daquele homem sendo destroçados. Me forço a olhar pela janela e vejo o rastro de sangue e parte de seu pé separado de seu corpo. O que quase me faz vomitar, desviando o olhar instantaneamente. E ele gritava, gritava muito.
— Como iremos ajudar ele nesse estado? — pergunta Eliot.
— Nós não vamos — diz desviando do homem e seguindo em frente à estrada. Tudo que ouço é o homem gritar por ajuda e perguntar por que haviamos feito aquilo com ele.
— Por que você fez isso?! — Riggs pergunta, furioso.
— Ele só é um peso morto, não sobreviveria nem dois dias, ainda mais sem aquela perna.
— Mas você enganou ele!
- Riggs, se acalma... - tento puxar ele pra perto.
— O mundo é dos espertos, Riggs. Aprendam uma coisa, se vocês continuarem ingênuos assim, vocês serão deixados pra trás.
៚
Passamos a noite toda, e grande parte da madrugada na estrada. Não há muito sobre o que relatar, já que na maior parte do tempo eu estava caindo no sono, ou qualquer coisa do gênero. As vezes, o curativo -improvisado com ataduras velhas e algodão- não eram suficiente e o sangramento constantemente voltada. Pelo menos não doía, Riggs acreditava que era a adrenalina ainda presente no meu corpo.
Falando em Riggs, ele não estava pra lá de muito bem. A perda de Joe era recente, e por mais forte que ele tentasse ser, perder a própria mãe e não ter tempo nem de lidar com o luto consegue afetar qualquer um. Até mesmo o Riggs.
Estávamos cada vez mais por nos aproximar da cidade, até víamos sua silhueta no horizonte. Não parecia ser um centro de refugiados. Muito menos existir qualquer vestígio de auxílio ou até mesmo helicópteros sobrevoando por perto. Mas afinal, por que estávamos acreditando no governo, sendo que o mesmo estava tentando nos matar até ontem? Era burrice!
Quanto mais nos aproximávamos, mais carros e vestígios mortais ou de ex acampamentos eram vistos, dissipando mais e mais nosso pequeno -quase inexistente agora- vestígio de esperança.
— Merda! — reclama Aliss, socando o volante — Essa cidade já foi pro lixo.
— E agora? — pergunta Riggs.
— O jeito é... — ela para de falar ao ver um menino de boné correndo — Que merda, um canibal! Se abaixem! - ela faz um sinal com a mão para que nos abaixassemos, e assim fazemos.
— Quem é ele? — pergunto.
— Como eu vou saber? — diz diminuindo a velocidade do carro - Ele tá correndo, aqueles canibais não correram antes.
- Será que é alguém? Tipo, alguém vivo? - Elliot pergunta.
Observando através da janela, era possível ver o menino que corria mais e mais, e não parecia ter reparado nossa presença até então. Com o carro parado, estávamos imperceptíveis em meio aos outros veículos fantasmas. Bom, isso, antes do Riggs abrir a janela sem querer.
- Porra! - chamo sua atenção, e ele tapa a própria boca, tentando fechar o vidro, mas sem sucesso.
- Fecha isso aí! - Elliot me cutuca, e eu cutuco Riggs em seguida.
— Ei! — o não-canibal do lado de fora parece perceber nossa presença, e grita em nossa direção — EI! — grita mais alto.
— Não podemos deixar ele aí! — o loiro exclama.
- Mãe, a gente vai ajudar ele? - pergunto, olhando o rapaz se aproximar através da janela.
— Não posso salvar qualquer coitado que vejo na rua. É perigoso.
- Você já deixou um homem morrendo pra trás, mas esse aí tá bem vivo e saudável! Temos que ajudar ele, Aliss! - Riggs exclama, insistente.
- Eu não posso!
— Você não pode ou não quer? — digo fazendo-a se virar para mim. Tentando analisar exatamente o que eu tinha falado — Aquele homem, Doug — digo — Ele podia até não ter salvação, mas você poderia ter tirado o sofrimento dele.
— Isso seria um desperdício de munição.
— Quem liga pra munição? Você tem um monte! E não pode gastar 1 bala? Além de insensível, você deixou de ser um ser humano agora também?
Ela aperta o volante.
— Como é que é?
— O que? Não ouviu? — ironizo — Se você não tem coração, tudo bem, mas eu vou ter pelo menos uma vez — aproveito a oportunidade de ela ter parado o carro e abro a porta ao meu lado rapidamente, saindo do carro.
— Kenny! — Elliot, que estava ao meu lado tenta me puxar, mas sem sucesso.
- Agora não, Elliot.
Ao pisar no chão, acabo tropeçando no chão e sinto uma dor enorme vindo do meu pé. Olho para o menino de boné que agora corria e em seguida olho para trás dele. E o que vejo não é agradável. Um monte de mortos.
Tento ir até ele mas nesse momento eu mancava e uma de minhas mãos estava no ferimento. Ouço Eliot gritar algo inaudível mas ignoro, e continuo indo até ele, que chegava cada vez mais perto.
— Aqui! — grito mas sinto meu pulso ser agarrado. Era Aliss.
— Entra no carro, agora!
— Não!
A horda se aproximava mais e mais. E o menino também.
— Vocês são pessoas maravilhosas! — ele diz ao se aproximar o bastante e eu faço uma careta, já minha mãe, franziu o cenho — Muito obrigada! Estou devendo uma pra vocês! — ele sorri — Mas precisamos correr!
— Considere sua divida sendo paga carregando.. — ela olha para mim com desdém — isso até o carro enquanto eu distraio esses merdas.
— An? O que quer dizer? — pergunto. Mas ainda sim sem resposta, sinto minha cintura sendo puxada e eu ser erguida do chão. E então entendo que aquele garoto estava me carregando ate o carro — Ei! — grito em protesto.
— Ela é sua mãe? Se for, ela deve saber o que faz, já viu aquela armona dela? — ele diz sorridente. Finalmente consigo ver seu rosto. Era um menino asiático de cabelos pretos e um boné vermelho muito fofo.
Ouço os tiros ecoarem alto a medida que nos aproximávamos do carro, mais alto o som daqueles monstros ficava. O que gerava um frio na espinha indescritível.
— Mais rápido! — ela grita para o menino, ainda atirando – Merda — não haviam mais balas no gatilho — Novo plano! Você corre e dirige, e eu alcanço vocês!
— Você que manda!
Ele corre comigo nos braços e finalmente alcança o carro, me colocando rapido -e delicadamente- no banco da frente -o carona- enquanto começava a ligar o carro no banco do motorista.
Aliss corria mais e mais, e era encorajada por Eliot que a gritava para correr mais rapido.
Rapidamente ela alcança o carro entrando bruscamente na parte de trás, e batendo fortemente a porta.
— Vai, vai, vai! — grita ao garoto.
Ele dá uma ré forte, fazendo os pneus urrarem com o atrito com o asfalto. Faz uma girada bem doida que acaba por me deixar um pouco tonta, e muda a direção do carro, indo em frente muito rapido.
- Você é um canibal? - Elliot pergunta.
- Canibal? Não, eu sou um humano! - ele responde simpático.
— E pra onde vamos agora? — pergunta Riggs.
— Eu conheço um lugar!
Eles continuaram conversando sobre esse tal lugar e sobre a real credibilidade dele, entretanto, não ouço muito, pois novamente, o escuro toma conta da minha visão.
៚
Acordo em um sofá estofado, parecia ser o do carro mas quando olho ao redor, as paredes eram altas e compactas. Um trailer? Eu não sei.
Tento me levantar e sinto mais uma da maldita pontada na barriga, mas dessa vez acompanhada de uma dor no pé. Seguro o grito de dor e me apoio a mesa em minha frente para me levantar.
Ao olhar para o resto do recinto, identifico como um trailer. Parecia ser até aquele da vila de trailers que tinha no filme Bolt. Ando um pouco me apoiando nas paredes até ver um banheiro, e entro no mesmo. Aonde avisto um espelho.
Meu rosto estava pálido e com alguns arranhões, meus olhos ainda estavam avermelhados e abaixo deles, marcas roxas, vindas certamente das constantes lágrimas as quais eu havia derramado nas últimas horas. Jma observação interessante dessa vez, era que eu estava acompanhada de um boné vermelho, que me era familiar.
Logo me lembro do menino de mais cedo que eu praticamente obriguei minha mãe a resgatar. E consigo finalmente ligar os pontos. Eu provavelmente estava no "lugar seguro" que ele havia mencionado. Saio do banheiro e sigo mais em frente, finalmente vendo a porta. Eu ia abri-la, mas na mesma hora em que empurro a maçaneta -para o meu azar- alguém a abria no mesmo momento.
Sem preparo, acabo caindo em cima daquele que abria a porta. O que amorteceu minha queda, mas não me impediu de gemer de dor devido ao, continuo, ferimento em minha barriga.
— Ai, que merda — apoio minha mão no peito de quem quer seja que eu tinha caido em cima, e uso de base para me levantar. Tendo a visão de um menino se cabelos castanhos e olhos azuis.
— Você... — ele é interrompido por alguém que gritou meu nome de longe.
— Kenny! — percebo a voz de Riggs. Que corre até mim, me tirando de cima do abdômen daquele menino e me abraçando.
— Ai! — reclamo devido ao aperto forte, que inconscientemente também apertava minha barriga.
— Desculpa — ele se afasta segurando meus ombros e sorrindo — Você dormiu muito! - uma lágrima involuntária escorre de seu rosto.
— Se fosse loira seria a Bela Adormecida — Elliot diz, me separando de Riggs, e me abraçando.
— Eu durmo um pouquinho e vocês já morrem de saudade? — rio da cara deles, e então vejo que o menino da porta ainda me olhava no chão — Oi — abro um sorriso, estendendo a minha mão para ele, que retribui se apoiando a ela para sair do chão.
— Oi — responde envergonhado – Desculpa por... — e é interrompido dessa vez pelo menino que havia me carregado.
— Oie! — ele põe a mão no meu ombro e se agaixa do meu tamanho — Você ta melhor?
— Como tá a barriga dela? — vejo um velhinho perguntar.
— Minha barriga? — finalmente percebo um novo, e decente, curativo — Oh, está tudo bem!
— Que bom — ele sorri e volta a fazer suas atividades.
— Quem liga? Vem ver isso, Kenny! — diz Riggs me puxando pela mão.
— Vai com calma! Quem carrega ela nas costas depois sou eu! — aponta Eliot nos fazendo gargalhar. Em exceção ao menino que nos olhava confuso.
— Tanto faz, vamos logo!