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Um resumo de meu retorno: não existem heróis unânimes.

Encontrei o Breno, a Tais e o Flávio do lado de fora do Campo Safira — ainda que bem perto dele; uns quinhentos metros a frente, aproximadamente—, com seus semblantes fechados e olhares atentos a qualquer movimentação na relva. Quando surgi pela direita, com a cadela já pesando no colo, os três se apressaram em minha direção como se eu fosse uma presença ilustre há muito aguardada — mesmo que não houvesse um tapete vermelho propriamente dito (nem cordão de isolamento, canapés, seguranças ou câmeras, diga-se de passagem).

Apesar disso, vê-los me foi de um alívio indescritível.

— Nossa, Daniel, você está bem? — me perguntou de forma gentil e rápida a enfermeira, tocando de leve em meu ombro.

— Na medida do possível — admiti, feliz por estar de volta.

— Pelo menos encontrou a Pipoca — o Flávio comemorou sem muito ânimo.

Por sua vez, o Breno fez questão de pegar a mascote dos meus braços, envolvendo os dedos com cuidado por debaixo da barriga suja da cadela e passando a equilibrar a maltês sobre o punho esquerdo.

— Você já carregou ela por muito tempo, deixa comigo — acrescentou.

Agradeci com um leve aceno de cabeça.

— Ela estava muito longe? — o Flávio quis saber.

— Você não faz ideia. Minhas pernas estão me matando.

— Dá pra imaginar. Seu rosto tem sinais claros de insolação — disse a Tais, agora tocando meu queixo e passando a vista apressada pelos cortes em meus braços e pernas.

A leve tensão em sua testa parecia dizer que poderia ser pior.

Bem pior.

— Você levou algo para beber ou comer no caminho? — prosseguiu, abrindo meus olhos com movimentos delicados do indicador e do polegar. — A Lívia achava que não, mas não conseguia lembrar com certeza...

— Ela estava bastante desorientada quando acordamos de manhã, mas vai ficar bem alegre em rever essa cadelinha linda — o Breno fez carinho no alto da cabeça do animal, que, alegre, latiu de volta.

Para ele, claro, nunca para mim — observei com certo rancor.

— Não levei. Não imaginei que iria tão longe e saí com pressa.

— E não encontrou nada pelo caminho também?

— Não — neguei, sem graça. — Jamais saberia distinguir entre o que me faria bem e o que poderia me matar, então...

— Rapaz inteligente — ela gracejou.

— Alguém aqui faltou às aulas de escotismo...

— Achei que todos no campo azul tinham faltado, Flávio — o Breno brincou, bem humorado.

Meu abdômen, bem como minha cabeça e todas as outras partes do meu corpo, doíam; não consegui me divertir.

— Mas venha comigo, então, Dani — a Tais retomou a palavra, começando a caminhar em direção à praia do acampamento. — Você precisa se hidratar urgentemente. Do contrário, sua situação e os sintomas podem piorar.

Piorar? Eu duvidava.

— Combinado. E como a Lívia está? — fiz a pergunta que há muito queria fazer.

— Preocupada com vocês dois — ela me olhou de lado, abrindo um sorriso —, mas já não há motivo pra isso agora, certo? Você e a Pipoca estão aqui.

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