09: Centro das atenções

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Alexia não conseguiu evitar fazer careta durante todo o processo de limpeza dos seus joelhos e de se encolher de vez em quando, quando a ardência do antisséptico era maior que o seu orgulho em não parecer uma criança na frente do Carlos Eduardo e da Judy.

Cadu parecia estar achando tudo muitíssimo engraçado, agora que os nervos haviam se tranquilizado após o quase acidente.

"Pronto, querida", a enfermeira do colégio, que era a paciência em pessoa, falou após concluir a bandagem e sorriu amistosamente para Alexia. "Eu te daria um pirulito agora, mas eles são reservados para as crianças do fundamental".

Enquanto Alexia sorriu sem graça ao ouvir isso, seus amigos não pouparam as risadas até a porta de vidro do lugar ser praticamente escancarada não apenas por Jorge, mas por Antônio também, que rapidamente correram até ela e a reviraram em busca de ferimentos mais graves.

"Eu estou bem, pai", ela fez questão de dizer ao perceber o quanto ambos pareciam nervosos, mas, principalmente, Tony.

"Você foi atropelada, Alexia! Atropelada!", ele se exaltou.

"Quase atropelada", a garota corrigiu. "A Judy me salvou a tempo e eu só machuquei os meus joelhos, nada mais".

"Ainda assim!", de repente foi Jorge quem mostrou sua indignação. "Como espera que fiquemos tranquilos de trazê-la para a escola novamente depois de quase ter sido atropelada aqui dentro, Alexia?".

Sobre isso, a garota não podia contestar. Ainda assim, ela reforçou:

"Eu estou bem, pai. Sério".

"Está sim, e ainda bem que está", Antônio enfim cedeu e a abraçou forte, enfim se permitindo sossegar um pouco. No breve contato, Alexia percebeu o quanto o coração dele batia assustado.

Quando ele se afastou, foi a vez de Jorge abraçá-la.

"Tem certeza de que só machucou os joelhos, filhota?", ele questionou.

Alexia assentiu.

Jamais diria isso em voz alta, mas era um pouco desconcertante receber tanto afeto na frente dos amigos e da enfermeira do colégio.

"De qualquer forma, precisamos falar com a diretora sobre o que aconteceu para que ela puna o responsável", Antônio sentenciou quando Jorge soltou Alexia do abraço.

"Ele não era aluno da escola, seu Tony", Melanie informou.

"O Gabriel já foi expulso daqui", Cadu acrescentou.

"Gabriel?", questionou Jorge.

"Ele se envolveu com umas coisas pesadas no ano passado e acabou sendo expulso", Judith esclareceu. "A gente acha que ele veio falar com a namorada antes de resolver acrescentar mais uma coisa a sua lista criminal".

"De qualquer forma, o Educandário não deveria permitir a presença dele de nenhum modo", disse Antônio. "Ainda mais depois do que aconteceu hoje".

"Vamos falar com a diretora", Jorge o tranquilizou, voltando-se para Alexia em seguida. "Você nos espera aqui um pouco, Lex?".

"É claro".

"Os seus primos já devem estar chegando para te fazer um pouco de companhia. Algumas pessoas viram o que aconteceu e a Melissa ficou bem assustada quando soube do seu envolvimento e foi por causa dela que eu acabei descobrindo", Antônio informou, para completo desespero de Alexia, que sabia bem o quanto a prima podia ser dramática.

"Obrigado por ficarem com ela, crianças", Jorge se voltou para Cadu, Judy e Melanie, que dispensaram o agradecimento com um aceno.

"Não é nada demais, seu Jorge", Melanie respondeu.

Quando os dois saíram para falar com a diretora, a enfermeira também deixou os quatro sozinhos por um instante. Alexia sentada na maca e observando os curativos nos joelhos, Judy de braços cruzados perto da janela, Cadu fingindo limpar as lentes dos óculos e Melanie mantendo os lábios em uma linha fina, ainda preocupada.

"Acho que isso significa que vamos ter de adiar os nossos planos sobre sairmos juntos, não é?", Mel questionou, acabando por sentar ao lado de Alexia na maca.

"Conhecendo o meu pai Antônio como conheço, acho que sim", a garota deu de ombros, impotente, apesar de, no fundo, não estar mais com vontade de sair depois de quase ter morrido.

"É melhor eu ir andando", Judy falou, enfim saindo do seu lugar próximo da janela.

"Obrigada por tudo novamente", Alexia tinha a impressão de que, não importava quantas vezes repetisse, jamais seria suficiente.

Judy revirou os olhos.

"Não há de quê".

Enquanto a garota atravessava a enfermaria rumo à saída, Alexia percebeu que Cadu e Melanie trocaram um olhar, o que a deixou inevitavelmente curiosa.

"De que turma a Judy é?", ela questionou.

"Terceiro ano B, como eu", Carlos Eduardo respondeu, sentando-se do seu outro lado na maca.

"Eu acho que nunca a havia visto antes de hoje...".

"A Judith não gosta muito de sair da sala de aula no intervalo. Deve ser por isso", o rapaz deu de ombros.

Alexia assentiu.

"Ela parece ser legal".

Uma nova troca de olhares entre Melanie e Cadu pareceu dizer que eles não concordavam muito.

"Há controvérsias", Mel respondeu. "A Judith é um pouco grossa e agressiva de vez em quando. Só porque ela te ajudou isso não significa que é a melhor pessoa do mundo. Qualquer um teria feito o mesmo em seu lugar".

Alexia tinha as suas ressalvas, mas optou pelo silêncio.

Até porque Melissa surgiu na enfermaria de repente, ofegante e com o rosto levemente vermelho por ter corrido até ali.

"Vim assim que o tio Tony falou que você estava aqui!", explicou-se a garota, ignorando aos demais. "Como você tá, Alê? Se machucou muito?", Melissa a observou com clara preocupação, mantendo os lábios em uma linha fina ao olhá-la milimetricamente como o seu pai anteriormente fizera.

"Eu estou bem, Lissa. Sério. Não fui atropelada de verdade. Eu só caí".

"Não é o que toda a escola anda comentando", retrucou a menina. "De repente, todo mundo esqueceu as fofocas sobre a pichação do muro e substituiu por essa. Mesmo com a maioria dos alunos já tendo ido embora quando aconteceu, os que ainda estavam aqui fizeram questão de espalhar tudo".

Saber disso foi ainda mais assustador para Alexia que a quase morte de mais cedo. Era sério que ela havia virado notícia outra vez quando tudo o que mais queria era se manter no anonimato no meio escolar? Já não bastava toda a humilhação do ônibus? Ela não conseguira passar nem por uma semana tranquila antes de se tornar o centro das atenções de novo!

A garota respirou fundo.

"Ei, vai ficar tudo bem", Melanie tentou reconforta-la ao perceber o quanto aquilo parecia terrível para Alexia. "Logo, logo uma coisa nova acontece e eles esquecem disso".

Alexia só esperava que a coisa nova também não a envolvesse. Pelo visto, todo o tédio que ela havia acusado Horizonte do Norte de ser havia escapulido para provar que não era bem assim. Que aquela cidade podia lhe resolver coisas muito mais complicadas e inusitadas que uma mera mudança de ares.

Tipo um quaseatropelamento.

Tipo um quaseatropelamento

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(NÃO) FOI POR ACASO [COMPLETO]Where stories live. Discover now