01: Os últimos dias de sua primeira vida

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Horizonte do Norte, 2016.

Havia um relógio com desenho de um rosto sorridente na parede e Alexia sentiu como se ele a provocasse com o repetitivo tic-tac dos ponteiros, girando e avançando os minutos que ela passava ali.

Mesmo chegando muito mais cedo do que todos os outros alunos por saber que gastaria um tempo na secretaria antes da primeira aula, ela dera o azar de ter que lidar com o atraso da funcionária responsável por lhe entregar o horário, as apostilas e todas as outras coordenadas de sobrevivência para fazer parte dos discentes do Educandário Fernão Moreira a partir dali.

Na parede, o relógio provocativo informava que ela já estava na espera há quase uma hora e que restavam apenas dez minutos antes de Alexia ser notada por ser uma aluna nova e por estar atrasada.

Se soubesse que as coisas seriam desse jeito, jamais teria apressado tanto o seu pai para sair mais cedo de casa e lhe dar uma carona.

Felizmente, foi só bufar pela milionésima vez em impaciência que a porta de vidro da sala de espera foi empurrada e uma mulher adentrou pedindo desculpas pelo atraso.

"Siga-me, por favor", ela mal dirigiu um olhar para Alexia antes de entrar na sala da secretaria de maneira afobada.

Querendo acabar com aquilo o mais rápido possível, a garota foi atrás dela e tentou não deixar tão evidente o quanto estava frustrada ao ter que encará-la.

"Seja bem-vinda ao Educandário Fernão Moreira", a secretária mal lhe deu tempo de se aproximar antes de entregar uma pilha de livros com um papel no topo.

De acordo com as informações descritas no papel, Alexia era aluna da turma C do terceiro ano e sua primeira aula era de física, o que só podia ser algum tipo de castigo divino por um crime cometido em outra vida.

Ela sentiu que aquele seria um longo e exaustivo primeiro dia quando ergueu o olhar para a secretária afobada e murmurou um agradecimento contrariado. De alguma forma, a garota esperava que aquele momento fosse muito mais extenso e importante do que realmente foi. Alexia se sentiu muito mais como um Tributo dos Jogos Vorazes recebendo os seus mantimentos antes de ser lançada para a morte na arena do que como uma aluna nova em sua recepção.

Tentando equilibrar a pesada pilha de livros nos braços e abrir a porta da secretaria ao mesmo tempo, não foi surpresa quando a coisa toda escapou para uma queda audível assim que ela retornou à sala de espera.

"Só pode ser brincadeira", Alexia se recusava a acreditar que estivesse tendo um desempenho tão mal.

É claro que ela não esperava que o primeiro dia ali viesse a ser um mar de rosas, mas também não precisava ser um episódio extra de uma série ruim.

Tentando apenas não surtar de raiva a qualquer instante, ela se abaixou para recolher os livros e mal registrou quando alguém se juntou a ela e juntou alguns deles numa pilha.

"Obrigada", Alexia mal teve tempo de agradecer, porque a pessoa lhe deu as costas antes mesmo que pudesse ver o seu rosto. Ela apenas foi agraciada com costas largas, cabelo preso e uma altura considerável. Fosse quem fosse, devia ser bonito.

E também havia deixado cair algo.

Abaixando-se uma última vez para recolher a pesada pilha do chão, Alexia também pegou o que parecia ser um corpo sem cabeça de um brinquedo e olhou por cima do ombro na direção da saída que o rapaz havia cruzado. É claro que ela podia apenas se apressar e ainda tentar alcança-lo, mas se o garoto realmente quisesse papo, não teria lhe feito falar com as paredes quando foi simplesmente agradecer.

(NÃO) FOI POR ACASO [COMPLETO]Where stories live. Discover now