Capítulo 13 - Dia 135

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No dia seguinte à discussão, ela iniciou todo um processo de treinamento para poder cair na estrada.  Acordava de manhã bem cedo, subia as escadas até a cobertura do prédio e realizava uma série de exercícios. Começava devagar, alongando os braços, as pernas e o pescoço, aquecendo sem pressa o corpo inteiro. Uma vez alongada, corria em volta do perímetro designado pelos altos muros que impediam suicidas de se lançarem ao asfalto. Corria até sentir os músculos reclamarem, os calcanhares queimando pelo esforço.  Então parava durante cinco minutos e começava a fazer abdominais, sem conta-las, apenas deixando o corpo ditar o ritmo e tentando ultrapassar os próprios limites. O comportamento dela se tornou quase obsessivo.

Construiu balas de borracha para treinar tiros com a pistola do pai seguindo o direcionamento de vídeos que havia baixado da internet antes que a conexão se encerrasse completamente. Atirava pela janela, cantando em voz alta o alvo selecionado.

Começou com alvos fixos, como placas de rua e janelas de prédios, passando então para alvos móveis, utilizando as criaturas que vagavam pelas ruas ao seu redor. As balas de borracha não as matavam, mas as deixavam atordoadas por algum tempo, sem entender de onde viera o impacto. Ele imaginava que os tiros de treinamento dela quebraram algumas costelas podres com base nos sons que chegavam aos seus ouvidos e arrepiavam seus pelos avermelhados, começando pelos pulsos e alcançando seu couro cabeludo antes de deixa-lo definitivamente.

Durante   as   tardes,   ela   utilizava   seus conhecimentos  da  região  para  traçar  rotas  até farmácias, supermercados e lojas de artigos esportivos com o objetivo de montar um estoque de remédios, suplementos vitamínicos, água, comida e armas. Utilizando a moto como transporte, passaram a se aventuras a destinos cada vez mais distantes. Ela dividiu o bairro em quadrantes com quatro quarteirões cada um e, a cada dia, vasculhavam um único quadrante.

As farmácias estavam quase inteiramente saqueadas.   Conseguiram poucos antibióticos e anti-inflamatórios. Equipamento de primeiros socorros também estavam bastante escassos, mas ela conseguiu juntar uma quantidade aceitável de gaze, antisséptico, algodão e faixas. Ela ficou muito surpresa com a vasta quantidade de suplementos vitamínicos, pois não esperava que as pessoas fossem ignorar a importância deles em um momento cuja alimentação se tornara tão deficiente. Ainda relutante com a decisão dela de deixar para trás todos os recursos que o hotel oferecia, ele a acompanhava apenas por desencargo de consciência. Dirigia a moto, montava a guarda munida de seu pé de cabra, carregava mochilas cheias de coisas que ela selecionava e garantia que ela retornasse à salvo quando a noite começava a cair.

Os supermercados também haviam sido saqueados. Provavelmente foram os primeiros a terem seus recursos esgotados. As prateleiras que um dia carregavam vastos suprimentos de enlatados estavam completamente vazias e o cheiro dos alimentos que um dia foram frescos exalava um fedor quase insuportável. Mas as carnes eram a pior parte. Bifes cuidadosamente fatiados e fechados com papel filme em bandejas de isopor preto exibiam toda uma gama de culturas de espalhando pela carne esverdeada e fétida, sangrando líquidos negros viscosos.  Era o perfume da morte, aquele cheiro que se sentia no vento, mas hermeticamente selados em salões abandonados. Ele sentiu o estômago embrulhar e não conseguiu segurar o reflexo de seus próprios órgãos. A cada novo supermercado que visitavam, ele deixava no chão a sua bile amarelada. O ato de vomitar se tornara corriqueiro para ele.

Conseguiram juntar algumas garrafas de água e grãos que, embora murchos, ainda eram nutritivos e comestíveis e poderiam acabar salvando a vida deles na estrada em alguma situação mais extrema. Conseguiram também alguns pacotes de salgadinho, que ela afirmou serem altamente carregados em sódio e poderiam ser úteis em caso de queda de pressão, principalmente com o inverno chegando rapidamente. As visitas às lojas de equipamento esportivo foram uma ótima fonte de armas para confronto direto, reuniram tacos de baseball de alumínio, leves e firmes, mais flechas para o arco que ela recebera do pai, facas de acampamento, canivetes multifuncionais, barracas de acampamento com pequenos fogões a gás, sacos de dormir e muitas roupas grossas para o inverno e dry fit para os dias quentes, além de botas de escalada para manter os pés firmes e secos.  Ela separou também incontáveis meias mais grossas.

Dia Zero (Saga Zero #1)Where stories live. Discover now