| PARTE IV |

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- Estão vendo essa deusa do ébano aqui? – ele diz, inflando o peito e enchendo-se de si. Alheio a qualquer outra coisa e sem nenhuma inibição. – Eu venho sendo um completo babaca com ela! E confesso que dei umas duas ou três bolas fora hoje, desde que aquele maldito trem parou no meio do nada...

A Naomi suspira, tão intensamente que poderia deixar todos nós sem ar. Suas bochechas, completamente coradas, evidenciam o quanto a cena é incrivelmente linda e vergonhosa, como naqueles clichês de filme de sessão da tarde.

- Eu gostaria de dizer que sim, ela é uma garota trans. – prossegue, ninguém se atreve a interrompê-lo. – Aliás, corrigindo: ela é uma MULHER incrível! E qualquer um que se proponha a conhecê-la de verdade verá isso!

- É ISSO AI! MANDA VER CARA! – o atendente atrás do balcão vibra, o encorajando, e por um instante todas, as atenções se voltam para ele, que retorna a postura de antes com um riso amarelo estampado na cara:

- Não foi muito fácil para mim no começo, estava sempre levando em conta o que meu pai achava sobre pessoas como ela, e nesse processo de preconceito gratuito acabei esquecendo de uma coisa: e quanto a mim? O que que eu, isento de qualquer influência externa, achava disso tudo? Só quando me fiz essa pergunta (alguns dias após saber a verdade dos seus lábios) foi que finalmente percebi a verdade: eu já estava apaixonado por ela, e foi aí que eu errei, quando decidi deixar de lado o amor e olhar para a genitália e todo o resto.

Ele se volta para a Denise, irredutível.

- Você deve estar se perguntando como essas coisas estão saindo da boca do seu ex-namorado, o "garoto transgressor de futuro incerto" como seus próprios pais fizeram questão de dizer (pois é, eu ouvi!). Não é mérito meu, a Naomi, sim, ela pacientemente me ensinou tudo isso, graças a ela eu não sou mais aquele brutamontes ignorante de antes.

De onde está, a Denise não diz uma palavra sequer, esse ainda é um momento só do Tony, todos seguem boquiabertos:

- E sabe o que é engraçado? Embora você tenha banido ela das líderes e insista em fazer com que as outras meninas sequer troquem uma palavra com ela, a Naomi ainda consegue ser a garota que atraí atenção para si naturalmente (eu piro completamente no movimento que você faz para pôr o cabelo atrás da orelha, eu perco os sentidos gata). Isso por que ela não é só linda, mas também inteligente. Ela me fez ler um livro inteiro pela primeira vez na vida e agora eu amo o desgraçado do João verde!

Ele falou do John Green? Não sei, só sei que alguns de nós rimos disso:

- Eu não estou lhe dizendo essas coisas para lhe envergonhar diante de todos, pelo contrário, realmente acho que os seus pais são os responsáveis por todas essas partes ruins, mas é você quem deveria estar no controle. Então, só comande sua vida e suas ações com a mesma fibra com que comanda as líderes, as coisas vão começar a fluir naturalmente, você vai ver.

Surpreendentemente, a garota preconceituosa e arrogante de antes agora assente a tudo o que acabou de ouvir, acatando com todas as afirmações do Tony, cujos joelhos agora se dobram diante da Naomi.

Ele lhe toma pelas mãos:

- Meu papo agora é com você, princesa, depois de tudo o que eu acabei de dizer, acho que já deu pra perceber o que eu quero com você. Eu quero te namorar, quero a resposta que vim buscar quando decidi sair de casa nessa véspera de Natal. Eu quero andar com você pelos corredores ciente de que fiz a escolha certa, e de que ninguém, nunca mais, vai te machucar ou dizer algo que possa te ferir. Eu quero você e todos os defeitos que vierem junto, assim como espero que tenha toda a paciência do mundo com os meus. E aí, o que me diz?

Uma certa tensão paira no ar, misturando-se com a expectativa pela resposta da Naomi. É o carinha do balcão que rompe o silêncio e acaba quebrando o clima novamente:

- TÁ ESPERANDO O QUÊ?! ACEITA! – Dispara.

É Denise quem o censura, levando o indicador a boca.

Naomi suspira, organizando as palavras mentalmente antes de falar

- Isso vai bagunçar um pouco as coisas. – diz.

Ele sorri, dando de ombros:

- Teremos todo o tempo do mundo para pôr tudo no lugar. – Assegura.

Ela assente, radiante:

- Bom, então não me resta escolha senão aceitar! – diz por fim, sendo surpreendida quando o Tony a toma pelos braços e lhe estampa um beijo cinematográfico (se certificando de lhe rodopiar no ar). Quando a põe novamente no chão, tenho absoluta certeza de que são o casal interracial mais fofo que eu já conheci (ainda que o Samuca seja negro e eu uma folha de papel ambulante) e de que essa história que se iniciou aqui ainda terá muitos capítulos...

Tony puxa uma cadeira e se junta a nós, sob os aplausos das duas meninas que também acabaram de selar compromisso, e agora se abraçam afetuosamente no outro canto.

- Foi a coisa mais insana que eu já fiz! – confessa, rindo feito um bobo, em seguida estende as mãos e me cumprimenta. – Sou Antônio, Tony, Tonhão, como preferir.

- Kevin! – respondo.

- DE VOLTA AOS TRABALHOS! – o atendente exclama, e todos já parecem ter se habituado ao seu humor. – ainda temos café! – completa.

- Espera! – O ouço, sei que é a sua voz, embora tenha ouvido poucas vezes essa noite.

Dessa vez eu me viro em sua direção, os olhares do Samuca estão voltados em mim:

– Já que todo mundo resolveu cair nesse fim de mundo e sair do armário coletivamente, é isso que vou fazer. Essa é Samanta, minha ex-namorada, aquele é o Kevin, meu futuro namorado.

 Essa é Samanta, minha ex-namorada, aquele é o Kevin, meu futuro namorado

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As Quatro Badaladas do Sino de Natal (Romance LGBTQIA+)Where stories live. Discover now