| PARTE II |

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No fim das contas foi um trabalho em equipe, e como o meu pai sempre teve grande manejo com a serra elétrica, a coisa toda não levou mais que alguns minutos, com o pinheiro já cortado, tentamos convencê-lo a levá-lo até a sua casa (se é que existi...

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No fim das contas foi um trabalho em equipe, e como o meu pai sempre teve grande manejo com a serra elétrica, a coisa toda não levou mais que alguns minutos, com o pinheiro já cortado, tentamos convencê-lo a levá-lo até a sua casa (se é que existia uma), porém, ele se opôs, dizendo que já havíamos feito o essencial, ficamos meio confusos com o modo como ele falou, e enquanto meu pai se dirigia de volta até a picape, ele me tomou pelo pulso e disse:

- No natal tudo é mais leve, as pessoas parecem inclinadas a fazer o bem, mas isso parece ir se perdendo ao passar do ano, sendo assim, por que não fingir que é Natal todos os dias?

Me vi surpreso, meio espantado e com certeza muito confuso, mas no fim consegui entender parte do que ele quis dizer, e o velho tinha lá sua razão, mesmo para mim, que nunca tive o hábito de andar na linha e fazer sempre o certo, parecia estranho que tantas coisas boas fossem feitas no natal e nos outros dias não, era quase como se fazer o bem nessa época os livrasse da obrigação de fazer isso no restante do ano, e não precisava ser nenhum gênio para perceber que tinha algo errado aí, eu podia ver, todos podem ver.

Apertei sua mão e me despedi, dizendo para que se cuidasse, eu não sabia se iria voltar a vê-lo, mas, fosse o caso, desejava que num estado melhor, o curioso nessa história toda é que, só quando voltei ao carro pude perceber duas coisas; a primeira é que eu não havia perguntado o seu nome, e a segunda é que enquanto estávamos lá, acabei esquecendo por completo meu encontro com a Naomi, mas já voltava a sentir o mesmo entusiasmo nervoso de antes...

Nosso primeiro encontro foi na lanchonete do BOB (onde curiosamente meu pai e eu passávamos a maioria das vésperas de natal), em minha carteira só tinha grana o suficiente para dois hambúrgueres simples e uma latinha de refri barato, foi exatamente o que eu pedi, e enquanto o nosso pedido não chegava, tratei de puxar assunto, mas, por mais engraçado ou paquerador que eu tentava ser, ela sempre parecia manter certa distância, talvez fosse o medo de se envolver com o carinha errado do colégio, ou vai ver fosse levar certo tempo até sua timidez sumir por completo, o fato é que quanto mais difícil a coisa toda parecia, mais eu ficava atordoado e louco para conquistá-la, e pela primeira vez em muito tempo eu sentia vontade de assumir algo sério com alguém, algo que não se resumisse a uma pegação rápida embaixo da arquibancada ou no corredor de armários.

Quando o nosso lanche chegou, pedi que trouxesse dois canudos para dividirmos o refri, ela bebeu um gole, mas não gostou, pois mastigou o hambúrguer por cima, eu sorri - merda de refri barato -, então bebi tudo num gole, eu senti um arroto forte chegando, mas não botei pra fora...

Alinhamos o nosso pinheiro na sala e deixei que ele fizesse o restante, ornamentando a árvore a tarde inteira, no fim acabou ficando mais bonita que a do ano passado, e ele levou bem mais tempo empenhado nisso, pois quando acabou faltava pouco menos de duas horas até o encontro, e como eu não queria me atrasar, saltei até o quarto e passei um bom tempo dando um tapa no visual, em outras ocasiões só um banho rápido bastava, mas não hoje...

No dia seguinte ao primeiro encontro, eu lembro de ter chegado ao colégio saltitante, meu riso parecia tocar cada orelha de ponta a ponta e sem que eu falasse nada meus parceiros já podiam saber o motivo; a coisa com a Naomi tinha se encaminhado.

Não havia sido nada além de um beijo rápido de despedida, e eu tive que resistir em deslizar as mãos da sua cintura até o bumbum, mas ainda que fosse só um beijo, já era alguma coisa, e levando em conta que ela não procurou o caminho até o meu pau, percebi que a coisa com ela era diferente, e por mais que eu me sentisse como um lobo e sua presa, teria que resistir aos meus 'impulsos de homem' e controlar minhas vontades, sem forçação de barra...

Mas ela logo passou a me evitar, fosse nos corredores ou na porta do seu armário, ela simplesmente não me respondia, e foi quando eu senti na pele o que era ser um fantasma, pois ela nem mesmo ria quando eu contava mais uma das minhas piadas aparentemente sem graça, e a cada dia sem resposta, mais eu ficava louco, pela primeira vez a coisa era diferente, eu quem havia sido dispensado, e por algum motivo eu não estava disposto a aceitar aquilo, porque de algum modo estranho, não parecia ser também o que ela queria, então eu novamente me aproximei num dia qualquer antes o jogo, sem piadinhas ou qualquer coisa do tipo, fui firme e direto, marcando outro encontro, que fosse o último, mas que eu tivesse todas as respostas..

Não havia sido nada além de um beijo rápido de despedida, e eu tive que resistir em deslizar as mãos da sua cintura até o bumbum, mas ainda que fosse só um beijo, já era alguma coisa, e levando em conta que ela não procurou o caminho ...

Ao sair do campo não pensava em mais nada, meu cérebro só queria focar no encontro e até tenho certeza de que esse tenha sido o motivo pelo qual perdemos a partida, corri para longe dos jogadores, atrás da segunda arquibancada, ela já estava lá, à minha espera, e enquanto eu tirava o suor da testa, tentei não me lembrar que nesse mesmo lugar já havia ficado com tantas outras garotas que era incapaz de contar, ela permaneceu calada, olhando para os meus olhos ou talvez os meus músculos, foi aí que perguntei o porquê de ela ter me evitado nos últimos dias, e dentre todas as respostas possíveis, aquela que eu menos podia esperar era a que foi dita com certa dificuldade por ela, quase engolindo as palavras ao invés de dizer:

- E-eu s-sou uma garota trans.

- E-eu s-sou uma garota trans

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As Quatro Badaladas do Sino de Natal (Romance LGBTQIA+)Where stories live. Discover now