Capítulo 10

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Os dias corriam sem outro incidente como aquele, os exames não apresentavam anormalidades e era gratificante seguirem a mesma rotina de antes, agora podendo dormir na mesma cama e sentar no mesmo sofá. E apesar de toda a melhora, as vezes eles quase não se tocavam, acostumados demais a apenas apreciar a presença um do outro.
Os dias continuariam assim, sem muitas brigas, apenas as rotineiras bobas, que mais serviam para demonstrar suas infantilidades mesmo com a idade adulta, do que para ser realmente uma briga. Entretanto, Eijiro estava muito pensativo o dia inteiro, se distraindo facilmente e encarando Katsuki como se quisesse falar algo. Obviamente o loiro já estava irritado com aquilo e quando notou que o marido não o ouvia, parou de comer, respirou fundo e soltou uma explosão forte com direção ao teto. Resultando em um Eijiro assustado dando um leve pulo na cadeira já que estava distraído.
- Droga, não se assusta alguém assim amor.
- Não me escutava, ao menos isso escutou - A voz ríspida demonstrava a irritação - O que tu tá pensando tanto que não deixa tu ouvir?
- Eu… amor vamos terminar de comer.
- Não!
- …Precisaríamos conversar sobre isso mesmo… - Kirishima deslizou os dedos pela mesa sentindo nervosismo. Do outro lado da mesa, Katsuki começou a sentir o mesmo nervosismo vendo o ruivo desviar o olhar pro chão repetidas vezes.
- Kiri - O apelido demonstrou seu medo para o parceiro já que Katsuki geralmente o usava, só quando nervoso ou muito, muito calmo - O que quer conversar?
- Não se preocupe, não é nada ruim… Só vai te irritar, mas é só algo que eu quero.
- Não é outra crocs, é?
- Não, podia ser - Sorriu - Mas não.
- Então? O que é?
- Bakugou - O corpo do loiro automaticamente tensionou por ser chamado pelo sobrenome - Somos homens casados, já passamos por muita coisa, sua fobia, vilões querendo destruir heróis, quando assumimos nosso namoro tivemos que lidar com todo o preconceito, procurar uma agência que não dos desrespeitasse pelo o que somos, até viramos símbolos quando apenas pensávamos em poder ficarmos juntos sem que parecesse errado.
- Onde quer chegar?
- Que nossa vida é complicada, fora de casa e dentro dela, não somos o casal perfeito, não gostamos de tudo um no outro, eu não gosto que se irrite fácil e tu não gosta da minha crocs - Sorriu vendo o loiro se acalmar um pouco e sorrir fraco.
- Não tenho culpa de ser estressado, nem delas serem horríveis.
- Ok ok, esse não é o importante, o importante é que sabemos lidar com nossas diferenças não importa o quão complicadas elas sejam, já lutamos muito, entramos na classificação dos melhores e estamos juntos a oito anos, por causa da sua fobia eu adiei esse pedido mas agora que ela melhor- - A fala foi cortada pelo loiro que fez uma careta.
- Eu não vou fazer nenhuma fantasia vinda dessa sua cabeça louca - Katsuki ficou confuso com o riso que o ruivo soltou - Não é isso, não é?
- Não, mas sei que não vai querer o que vou pedir, então vou começar dizendo os prós disso… - Respirando fundo, esperou que Katsuki se pronunciasse, todavia o loiro apenas ficou calado observando - Você já é acostumado com meus toques, bem, não totalmente mas já é, mas amor, precisa se acostumar com outros toques, assim até pode ser um herói melhor, talvez se supere na classificação - Novamente ele esperou que Katsuki dissesse algo, todavia o loiro permaneceu quieto, com o corpo tensionado sem que desviasse o olhar do seu, e pela primeira vez em oito anos não soube o que o parceiro estava pensando - Amor, vamos adotar uma criança? … Katsuki? ... Amor?…
- Contras, crianças dão trabalho e eu com certeza não posso cuidar de uma, ela vai querer contato e eu posso facilmente entrar em crise caso outra pessoa além de ti me toque.
- Eu posso lidar com a maior parte enquanto tu se acostuma a ela.
- Não, isso é loucura.
- Amor, por favor.
- Kirishima não
- Por que não? É só não deixar que ela te toque.
- Eu não posso parar em um hospital de novo! - Gritou as palavras com raiva, sentindo a agonia se espalhando por dentro de si. Não estava sendo tocado, tinha a mesa inteira separando ele do marido, todavia, mesmo assim suas mãos tremeram de medo ao relembrar a sensação de fraqueza, do corpo perdendo a consciência  e do medo quando soube que poderia morrer - Eu não posso, desculpa.
- … Amor, eu não quero que passe do seu limite, sei que isso assustou tanto a você quanto a mim, mas já se passou muito tempo e você está bem, além disso, ter uma criança pode ajudar você.
- Se queria um filho era melhor que tivesse escolhido uma mulher, ou no mínimo, um homem que pudesse adotar sem correr risco de morrer!
- Tu não vai morrer, amor me escuta, isso pode dar certo.
- Por que merda tu quer um filho?
- Salvamos pessoas todos os dias, algumas crianças que infelizmente não tem ou perderam seus pais, não seria incrível se nós, que tanto sofremos preconceito e fomos menos favorecidos, pudéssemos fazer feliz ao menos uma dessas crianças menos favorecidas?
- … Kiri, por favor não me force a aceitar isso, eu te amo, confio em ti, te entrego tudo o que sou e confiaria a você minha vida, mas somente a ti, então por favor não me force a tocar outra pessoa…
- Não vou forçar, só quero fazer um trato, vamos a um orfanato e você se senta e observa as crianças, conversa com elas, e se não gostar de nenhuma nós vamos embora e nunca mais falamos disso, tudo bem? Nem precisamos procurar em mais de um.
- … Você e seus tratos de merda… Se alguma criança tocar em mim vai ser explodida e depois te explodo.
- Trato feito então - Sorriu animado, todavia logo ficou sério vendo que o loiro tinha as mãos trêmulas e os olhos vermelhos mais opacos que o normal, um sinal de medo - Katsuki, vai ficar tudo bem, eu juro que te tiro de lá caso se sinta mal, confia em mim.
- Já disse que confio, só não confio em mim mesmo, ao menos não quando tem haver com isso… - Estava tão frustrado por tremer por uma lembrança, tanto que fechou as mãos com força. Suspirou logo que viu Eijiro se levantar e ir até ele.
Com cuidado, Eijiro acariciou primeiro as mãos fechadas, depois deslizou os dedos pelos braços, pescoço e por fim o rosto, o segurando entre suas mãos e deixando para trás um caminho quente.
- É exatamente por isso que é bom que tenha contato com desconhecidos, não pra confiar neles, mas pra conseguir confiar em ti mesmo.
Então as mãos do loiro pararam de tremer e ele abraçou o marido. Ponderava as palavras do ruivo, juntando prós e contras, pensando sobre o passado, presente e futuro, tentando se convencer de que aquela não era uma ideia tão ruim como aparentava ser e agradecendo que Eijiro tenha o dado a opção de negar, afinal sabia bem que se o ruivo insistisse naquilo, ele iria ceder como fez com as músicas altas pela manhã e a crocs que ele usava. Por outro lado, o ruivo também sabia que se insistisse conseguiria a filha que tanto quis desde adolescente, mas que quando notou está apaixonado por Bakugou desistiu do sonho. Todavia, não gostava de impor suas vontades as do marido, sempre trabalharam para que ambos fossem ouvidos no mesmo tom e não era por um desejo que esqueceria o loiro.
- Final de semana nós vamos visitar um, certo?
- Tudo bem, que seja… Eijiro, tu não ia fazer a ronda noturna hoje? Já está atrasado.
Praguejando, o ruivo correu atrás do seu uniforme enquanto era observado por Katsuki. Não fariam dupla aquela noite, Kirishima tinha sido mandado a um local onde estava com risco de queda então o poder do loiro não seria de muita utilidade, por isso ele apenas se divertia vendo a pressa do companheiro. Já estavam bem daquele modo, se a criança não fosse melhorar, não acreditava que ela conseguisse piorar, então se acalmou imaginando que talvez, apenas talvez, não fosse tão ruim como achava que seria.
- Ittekimasu - O ruivo beijou o marido antes de ir em direção a saída.
- Itterasshai - Gritou antes da porta bater.
Quando ouviu o som da tranca, imediatamente ligou o celular para caso fosse necessário Eijiro pudesse o chamar. Depois voltou a pensar, mas dessa vez a única coisa que conseguia pensar era que seria uma merda não poder xingar quando bem entendesse com uma criança por perto, logo notou, o pior problema talvez não fosse sua fobia e sim a própria convivência dos dois que atualmente era harmoniosa apesar de conflitante, contudo, uma criança mudaria as coisas.

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