Ainda aninhado abaixo do oceano verde, recordei-me das vezes que colocava “Loving Someone” de The 1975 para tocar no último volume quando finalmente ficava, durante as longas horas em que papai e Taehyung saiam, sozinho. Então fantasiava amar alguém intensamente como Mr. Darcy e Elizabeth Bennet em um dos melhores e mais envolventes romances de Jane Austen. Jimin, para mim, era um personagem bem desenvolvido de um livro cujo gênero era um romance de época com uma pitada sensualista. Ou talvez um anjo caído, porque sequer conseguia crer que aquela beleza pudesse ser real.

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O clima estava agradável naquela manhã: o frio oscilava com os fiapos ensolarados e sorridentes que desbravaram as nuvens incômodas. Duas crianças passaram por mim, correndo uma atrás da outra, uma garotinha gritou “está com você” quando tocou o braço do menino que a olhou incrédulo pela velocidade acelerada da ruivinha, causando-me um gargalhar sincero.
   Caminhei por entre os lírios brancos que se mesclavam aos azuis, colocados ordenadamente pelo canteiro extenso na principal. Certa vez, enquanto assistia à aula de Botânica, o único assunto que me chamava a atenção em Biologia, o Sr. Kenny atentou-nos sobre os possíveis significados daquelas flores de aroma tão leve que poderia ser completamente entregue para a brisa mais serena. Os tons que consumiam as pétalas simbolizavam sentimentos positivos, como a proteção, inocência e pureza. Em algumas lendas, o perfume do Lírio possuía o poder de reaproximar pessoas que um dia já foram apaixonadas.
    Sorri, ao lembrar-me do delinear risonho de papai trazendo aquelas flores de tons alaranjados, que significavam atração e fascínio, quando discordava da mamãe em alguma discussão boba.

— Agora você inspira fundo e mira. — Jonghyun ajeitou-se atrás de meu irmão, colocando a mão sobre as dele, quando me materializei ao lado, após subir as escadas da guarita silenciosamente. — Solta o ar devagar. — O garoto sorriu ao notar minha presença. — Atire. — O ecoar surgiu.
  O projétil quase acertou o crânio de um dos mortos-vivos: um jovem de vinte e poucos anos, cambaleando a uns vinte metros.

Admirava a paciência de Jonghyun para ensinar Taehyung a atirar com tamanha precisão, meu irmão jamais interessou-se no assunto nas vezes em que tentei, mesmo que eu tenha insistido. Ele sempre usava a desculpa de que era apenas um nerd focado no seu sonho de tornar-se um engenheiro voltado para a área de comunicação.

— Essa foi quase — disse e Taehyung se assustou, afastando do corpo do companheiro.

— Foi o melhor, levando em consideração as outras tentativas. — Gargalhou e meu irmão encheu de indignação no olhar de reprovação instantâneo.

— Eu sou incrível. — Deu língua para nós dois, como uma criança birrenta. — Apenas não quero humilhá-los.

— Desculpe, senhor dos projéteis certeiros — ironizei, bagunçando os fios rosados de Taehyung antes que o menino desse um tapa leve para cessar meus dedos.

   Meu irmão, apesar de olhar-me tão pesadamente, estava radiante. Mal recordava-me quando fora a última vez que o vira daquela forma.

— Sabem onde estão os outros? — indaguei, prestes a descer as escadas.

— Na cafeteria.

Os paralelepípedos foram tingidos com cores vivas e alegres. Cada ruela com um tingir distinto. Esbelto, talvez essa fosse a palavra correta para descrever aquele mar de emoções nas pinceladas infantis. Girassóis espalhavam-se por vasos colocados em cada esquina e brincos-de-princesa recheavam majestosamente um jardim suspenso feito nos muros, com latas e garrafas de plásticos que não tinham mais utilidades.
   A senhora Amélie limpava os vidros quando atravessei a porta. Embora tivesse sua idade avançada, a mulher era sorridentemente ágil e amigável.

Alvorecer Mortal  »  JK + JMWhere stories live. Discover now