— Estou a falar sério — avisei.

— Então vai. Não tem ninguém te segurando — deu de ombros, enquanto abria tampa da garrafa com os dentes. E quando ele conseguiu, tomou longos goles. Notei Liane ao meu lado o encarar como se estivesse a ver a definição da perfeição a sua frente, mas ela disfarçava muito bem.

— Não sei onde estou — defendi-me.

Sim. Sabia que estava a comportar-me como uma ingrata, mas estava preocupada demais com oque aconteceria-me no momento em que eu chegasse no orfanato. Louise não me pouparia dos castigos.

— Que pena — ele fingiu pertinência e isso irritou-me.

— Se você não me levar de volta para lá agora serei uma garota morta.

— Os seus pais são maus? — Liane finalmente se manifestou. Não fiquei incomodada com a sua pergunta. Ela não sabia e não tinha culpa.

— Ela não…

— Sim. E eles são horríveis o suficiente para me fazer desejar nunca ter nascido — interrompi Haden bruscamente, numa tentava de o fazer entender bem as minhas indiretas.

Ele encarou-me impassível.

— Que chato. Sinto muito — ela tocou no meu ombro, a tentar passar-me algum conforto.

— É, também sinto.

— Tudo bem. Vamos embora — ele deixou a garrafa de cerveja inacabada na bancada da cozinha e em seguida fez o seu caminho até a sala de estar. Virei-me para Liane com um sorriso.

— Foi muito bom conhecer você… — comecei a minha frase de despedida e ela levantou-se para puxar-me para um abraço que retribui na mesma hora.

— Espero voltar a reve-lá, algum dia.

— Também — concordei.

— Se demorar irá a pé e sozinha! — Haden gritou em plenos pulmões. Revirei os olhos enquanto me desenvencilhava da loira. Andamos juntas, cozinha afora e eu continuei o meu caminho em direção a Luke que estava esparramado no sofá. Ele franziu as sobrancelhas quando me aproximei dele, segurei no seu rosto com as duas mãos para dar-lhe um beijo na bochecha seguido de um abraço.

— Adeus — o despedi assim que me afastei. Ele concordou com a cabeça a parecer incapaz de falar.

Olhei para Liane pela última vez antes de sorrir e seguir o homem mal-amado em direção a saída da sua casa.

— O que foi aquilo com o meu irmão? — Haden perguntou assim que saímos porta afora.

— O quê? Apenas me despedi dele.

— Com um beijo na bochecha?

O encarei confusa e com as sobrancelhas unidas.

— Ficou com ciúmes? — provoquei. — Quer que eu o de um beijo também? — fiz menção de aproximar-me um pouco dele, apenas para o deixar constrangido.

Ele parou de andar e se virou para mim.

— Sim.

A sua resposta surpreendeu-me. Congelei no mesmo lugar com os olhos arregalados e por um momento esqueci-me de como respirar. Ele não parecia estar a brincar quando se aproximou mais de mim. Os meus pés haviam ficado presos no chão e eu não conseguia fazer mais nada para além de o encarar se aproximar de mim.

Desviei o olhar das suas íris acinzentadas para a sua boca completamente atónica e sem palavras. A sua respiração calma se misturou com a minha quando o seu rosto ficou muito próximo do meu. Queria o afastar e mandar nunca mais se aproximar de mim, mas nada saia. A minha mente estava em branco. Mesmo quando, o espaço entre nós estava a ficar cada vez mais preenchido continuei imóvel. Apenas respirando.

NeutroWhere stories live. Discover now