oito.

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Encarei a Sra. Rebeca com o cenho franzido enquanto ela ignorava o meu olhar e fitava
a calçada de tijolo a medida que caminhávamos lado a lado em silêncio até a saída do orfanato.

Depois do que ela disse ontem a noite eu não consegui ficar calma e muito menos dormir. Estava sempre a roer as minhas unhas e andar de um lado para o outro pensando aonde ela queria levar-me.

Keanu, como o melhor amigo que é, disse que ela provavelmente quer me levar para um lugar isolado e matar-me. Eu sabia que ele estava a brincar, mas isso era uma possibilidade. Essa mulher não tem coração.

— Para onde estamos a ir tão cedo? — quebrei o silêncio. A minha curiosidade era maior que qualquer outra emoção neste momento.

— Já disse que é surpresa — respondeu impaciente e quando começamos a andar no relvado verde e bem cuidado do orfanato senti um frio intenso balançar os meus cabelos.

O céu estava nublado e as nuvens um pouco carregadas deixando claro que uma chuva estava a caminho. E eu odeio chuva. Porque tínhamos de sair hoje?

Abracei o meu próprio corpo e amaldiçoei-me mentalmente por ter desconsiderado o aviso de Maxine quando ela me disse para levar uma camisola. Eu ignorei a sua sugestão porque não sabia que iríamos sair desse lugar. Pensei que ela contaria-me a tal surpresa aqui.

Quando nos aproximamos dos portões de ferro já gastos tinha um táxi nos esperando do lado de fora. Eu sentei-me no banco de trás do automóvel e ela no de frente.

O caminho inteiro seria preenchido por um silêncio tenso se não fosse pelo taxista chamado Sr. Staples e as suas piadas sem graça. Ele aparentava estar na casa dos cinquenta por conta de alguns fios de cabelo grisalhos e perceptíveis rugas no seu rosto.

Sra. Rebeca tinha o rosto torcido em desgosto por ser obrigada a escutar as piadas e os meus risos abafados. Ela tinha o rosto sério e o olhar preso na estrada a sua frente.

As vezes pergunto-me se um dia ela já foi feliz porque a sua vida parece ser baseada apenas em sorrisos cínicos e intenções cobertas de maldade. Julgo que a sua vida pessoal não exista. Ela deve se dedicar ao máximo no seu suposto trabalho que se esquece da vida que deveria ter fora dele.

— Para o táxi — a voz da Sra. Rebeca reverbera áspera fazendo-me sair do transe.

O taxista encara-a com as sobrancelhas franzidas enquanto estaciona em frente a uma loja de livros.

— Mas ainda não chegamos…

— Quanto é? — pergunta, interrompendo-o.

— Pensei que quisesse ir até a igre… — ele tenta falar, mas é interrompido outra vez.

— Se não me disser o preço eu irei embora sem pagar — o corta, deixando claro que ela preferia andar até o seu destino do que continuar no táxi com ele.

Senti pena dele. Ele só queria criar um clima alegre até o nosso destino e tentar fazer-nos rir um pouco.

Depois dele dizer o preço e ela pagar por nós duas descemos do carro, mas não sem antes eu dizer ao Sr. Staples que amei escutar as suas piadas. Ele sorriu na minha direção antes de arrancar e Sra. Rebeca começar a andar. Para ela ter mandado ele embora o nosso destino não devia ser tão longe.

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