O frio estava cada vez mais intenso e eu abracei o meu próprio corpo enquanto andava ao lado da mulher com cara amuada e desviava de algumas pessoas que apareciam no meu caminho. Alguns esbarravam no meu ombro e continuavam com o seu caminho e outros sussurravam um pedido de desculpa. Nunca imaginei que as ruas de Ohio fossem tão movimentadas.

— Chegamos — ela parou de andar e eu prestei atenção onde havíamos parado. Do outro lado da rua tinha uma igreja com o estilo de missão espanhola pintada de branco. Apesar de alguns anos já terem passado ela continuava intacta.

Senti o ar faltar nos meus pulmões e o meu olhos começarem a ficar marejados. O frio parecia ter desaparecido porque desfiz o abraço que tinha feito em volta do meu corpo para apertar os punhos com força ao lado do corpo.

A imagem de uma garota de sete anos, sentada nas escadas da entrada da igreja com um ursinho na mão e chorando enquanto esperava por alguém que nunca mais iria voltar, começaram a invadir a minha mente.

Virei-me para a ela e a encarei de perfil com raiva enquanto as palavras que eu tanto queria cuspir na sua cara estavam presas na minha garganta.

— Louise viu você e o seu amigo fugindo sábado a noite — começou, com as íris castanhas presas no meu rosto. — E o que mais a incomodou foi a roupa que a senhorita tinha vestida — abriu um sorriso cínico. — Um vestido curto demais para uma garota de sua idade. Um vestido que só mulheres corrompidas usam. E o melhor lugar para se arrepender e pedir perdão a Deus pelo seu erro é na igreja.

Não consegui conter o riso sarcástico que escapou da minha garganta.

— Isso só pode ser brincadeira — falei, ainda com a feição dominada pela raiva. — E você julga que irei acreditar nisso?

— Do que está a falar? — o seu fingimento fez-me sentir vontade de arrancar os seus cabelos.

— Isso foi baixo — balancei a cabeça em negação. — Trazer-me para aqui foi a coisa mais horrível que já me fez. Se a sua intenção era deixar-me destruída a senhora conseguiu. Parabéns.

Pude perceber um pequeno e quase impercetível sorriso no seu rosto.

Quando eu dizia que os castigos dela não eram fáceis de suportar eu não estava a brincar.

Ela provavelmente pensou, que me manter naquela sala trancada não seria o suficiente. Na sua cabeça sádica, o que me faria ficar na linha era voltar para o lugar onde todo o meu pesadelo começou. A igreja. Onde para alguns, era o lugar onde se fortaleciam, oravam juntos para ter resultados mais positivos e buscavam paz.

Coisa que nunca senti.

Eu não culpava a igreja pelo meu futuro ter sido arruinado. Eu sei que ela não tem culpa, mas não consigo olhar para a mesma e sentir alguma empatia. Talvez algum dia o ressentimento que sinto desapareça, até lá, continuarei com o mesmo pensamento.

— Eu não me vesti como uma prostituta — redargui, quase raspando os dentes uns nos outros. — Louise é uma maníaca que não sabe o que fala.

A expressão no seu rosto foi tomada por raiva e surpresa súbita quando elevei o meu tom de voz.

— Louise Smith é uma mulher educada e honesta. Ela não seria capaz de mentir sobre isso. Não tente, difama-lá.

Rolei os olhos, descrente.

Era claro que ela pensava isso. Louise se comportava como uma verdadeira santa na frente dela e sempre tinha um sorriso doce — e falso — no rosto.  Estranho seria se elas não se dessem bem sendo que as duas são desiquilibradas emocionalmente.

— Vocês duas são doentes. Que pensam que fazendo sofrer a pessoa irão corrigir-lá.  — gritei, com todo o ar nos meus pulmões. — Mas não é assim, que a educação funciona.

— Não fale assim comigo — a sua ameaça saiu forte e fria. — Isso não chega nem aos pés do que eu posso fazer com você — ela aponta para igreja do outro lado da rua. —Portanto, poupe-me das suas lições e ande logo. Vamos acabar com isso.

Ignorei todos os avisos que estavam me dizendo para obedece-lá e fazer o que ela queria. Hoje eu não seria a sua marioneta. Ela não me usaria para satisfazer os seus desejos inclementes. Eu não me rebaixaria como sempre fazia quando ela levantava a voz e ameaçava-me. Hoje eu não seria o seu brinquedo.

— Não — a minha voz saiu como um sopro. Baixa e quase inaudível. Eu estava com medo do que viria a seguir. Era covarde demais para colocar os meus pensamentos em práticas.

Sra. Rebeca ignorou as pessoas que passavam por nós — desinteressadas no que quer que estivéssemos a discutir — e se aproximou de mim.

— Não escutei — redarguiu. — Repita — falou pausadamente, a testar a minha coragem.

Apertei ainda mais os meus punhos e dei um passo para trás.

A minha garganta estava seca e as palavras aglomeradas na minha garganta. Os meus olhos ardiam e a única coisa que eu queria fazer era chorar.

Mas o olhar de poder que ela estava me direcionando irritava-me. O facto de ela agir como se soubesse que eu não seria capaz fez-me criar a coragem que eu não sabia que tinha e enfrenta-lá.

— Não deixarei você fazer isso comigo.

Antes que ela pudesse responder a dei as costas ignorando todos os insultos que ela me direcionava até que eles ficassem cada vez mais distantes.

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