A ÚLTIMA LÁGRIMA.

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      Derramarei algumas lágrimas no início dessa crônica, não muitas, porém, sentidas, dolorosas, sofridas e cheias de angustias, lágrimas do meu desatinado coração. A noite se derrama lentamente revelando a face tímida de um luar desconfiado, algumas estrelas percorrem o céu de um lado a outro, andarilhas, solitárias, cintilando na altura do firmamento.
         E a madrugada segue o seu curso triste, em um silêncio profundo, como névoa fina que se espalha sorrateiramente, enquanto eu,  derramo as minhas lágrimas, nem tão sentidas agora, nem tão doloridas também, no entanto, elas se enchem de conflitos, de incertezas. Dentro desta alma de poeta existe alguém desesperado querendo a todo o custo a liberdade deste cárcere de ossos secos, louco sofredor que me tornei, a chorar por amor.
           Eu que pensei que conhecia aquele coração, eu que pensei que conhecia o meu próprio coração, eu que pensei... Mas talvez quem sabe seja apenas ilusão minha, talvez quem sabe seja coisa de momento, mas a minha alma ainda chora, eu sei, e em cada lágrima sentida não há nada que eu possa fazer, não há nada mesmo, acreditem...
      Eu que pensei que era um poeta, e todos aqueles versos de amor, e todos aqueles versos que tanto amei, versos que me fizeram esperança, versos que me fizeram criança, versos que talvez eu nem poetizei. Hoje eu procuro cegamente pelas palavras, eu as procuro em algum canto escuro em mim, em uma madrugada fria onde nada mais faz sentido, onde os meus sentidos, todos os meus sentimentos, estão completamente confusos. Onde está aqueles olhos que outrora amei?
        Guardo no silêncio dos meus olhos, um amor platônico que sinto por ela. Sinto esse amor queimar meu peito em brasas ardentes. Guardo no silêncio da minha alma, todas as palavras que um dia eu gostaria, mas que jamais direi. Como seria bom declarar esse amor, e diante da face do luar dizer o que sinto em versos apaixonados.
         Guardo no silêncio dos meus lábios o desejo de um beijo, bastaria um beijo, um beijo apenas, e o meu coração se derreteria perante ela como a neve em dia quente. Guardo no silêncio oculto do próprio silêncio, toda a ternura e todo o encanto desse imensurável amor que ainda sinto tão forte, versos dos meus sonhos, ledo anjo. Guardo a tanto tempo que não estou suportando mais o peso na alma, meu desejo é gritar para o mundo todo ouvir, quero que todos saibam, mas infelizmente, nada posso dizer, aqueles que conseguirem decifrar meus códigos, saberá os segredos da minha alma.
        Guardo nos meus versos a sua lívida face oculta, a magnânima poesia do meu amor em versos escondidos entre as cintilantes estrelas.
      Mas o que são os meus versos diante de uma madrugada tão fria, tão silenciosa, tão cheia de lembranças tristes, pensamentos imperfeitos, olha  no que eu me tornei afinal, já nem sei mais quem eu sou, ou no que eu me tornei, essa não é a primeira vez que digo tais coisas. Lágrimas são pérolas da alma, diamantes que o coração cristalizou pelo muito sofrer; eu conto as estrelas de forma aleatória, na vil imaginação de que os belos olhos dela também estão a fita-las; talvez você, ledo anjo, esteja assim como eu, mendigando palavras em uma noite escura como essa, procurando compreeder o incompreensível e explicar o que não pode ser explicado. A madrugada se declina, e logo mais dará passagem a um novo dia.
        Desenho com palavras tristes a caricatura  da minha alma, rascunho nesta crônica este particular pensamento, esta faceta pouco vista deste que vos escreve. Mas as horas são inimigas, o luar declina no horizonte escuro, as estrelas ainda silenciosas me confidência os segredos dos homens, de todos os homens, de suas almas sofredoras, talvez seja esse o motivo que passo horas e horas admirando a noite, e conversando com todas essas estrelas.
        Talvez seja essa a sina de nos escritores amalucados, desejamos contar os segredos dos homens, de todos eles, mas não conseguimos descobrir os segredos de nossos próprios corações, não conseguimos desvendar a nos mesmos. Então, no horizonte de estrelas solitárias, derramo a última lágrima, a última e solitária lágrima, e nela, escondo todos os meus segredos, que nem as palavras de um poeta podem decifrar, que nem mesmo o anjo ledo saberá.

RETALHOS DA MEMÓRIA. Where stories live. Discover now